Robert E. "Bobby" Crimo III planejou por semanas o tiroteio em massa contra a parada cívica do Dia da Independência, em Highland Park (Illinois), a 43km de Chicago. Vídeos publicados em suas redes sociais e o depoimento de um vizinho ao Correio indicam uma mente doentia, um jovem de 22 anos arredio, entusiasta da violência e dono de frases perturbadoras. Sob o nome de "Awake the Rapper" ("Desperte o Rapper"), Crimo é cantor de rap e reúne 16 mil ouvintes mensais na plataforma de streaming Spotify. "Eu preciso partir agora. Eu preciso fazer isso. É meu destino", afirma ele em vídeo no qual exalta a violência armada. Em um videoclipe caseiro para a sua música Out of this world ("Fora desse mundo"), um atirador traz uma câmera GoPro presa ao capacete e aparece cercado de corpos. "Tudo me levou a isso. Nada pode me parar, nem eu mesmo", afirma em um terceiro vídeo, no qual usa um capacete negro dentro de uma sala de aula.
De acordo com a polícia, Crimo vestia roupas femininas, quando, do telhado de um prédio, disparou mais de 70 vezes contra a multidão que assistia ao desfile de 4 de julho. Pelo menos sete pessoas morreram — seis na segunda-feira e uma ontem — e 39 ficaram feridas. "Nós acreditamos que Crimo planejou o ataque por várias semanas. Ele trouxe um rifle de alta potência para o desfile", declarou o porta-voz da polícia, Chris Covelli, a repórteres. "Ele acessou o telhado de uma empresa por meio de uma escada de incêndio e começou a abrir fogo."
Para Covelli, Crimo se disfarçou de mulher para ocultar as tatuagens no rosto — quatro listras cruzadas por outra listra na bochecha e letras cursivas acima da sobrancelha esquerda — e no pescoço, coberto de rosas vermelhas e folhas verdes. Os investigadores confirmaram que Crimo comprou, legalmente, dois rifles de alta potência e três outras armas. Na noite de ontem, ele foi formalmente acusado de sete homicídios de primeiro grau.
Um dos vizinhos de Crimo em Highwood — subúrbio de Highland Park —, o empresário Gio Montenegro, 37 anos, contou ao Correio que viu o criminoso pela última vez na sexta-feira passada, três dias antes da tragédia. "Ele dirigia sua scooter ouvindo hard rock o tempo todo em frente à minha casa. Também costumava ficar sentado, sozinho, em um mata aqui ao lado. Nós o víamos quando íamos passear com o nosso cachorro. Meus filhos acenavam para ele, mas não respondia", lembra. "É um garoto quieto e antissocial. Não me parecia bem. Vivia sozinho o tempo todo. Alguma coisa estava sempre fora do lugar. Acho que o garoto mudou de comportamento, quando ficou mais velho. Eu me recordo de que fazia escotismo e praticava futebol."
Desde 2018, Gio mora a apenas quatro casas de Crimo. Ele se disse surpreso com o fato de o atirador ostentar tatuagens. "Ele sempre estava coberto. Usava chapéu, capacete, camisa com gola e óculos. Há três anos, quando era mais jovem, não tinha essas tatuagens", disse Gio. A também empresária Andrea Castellanos (leia Depoimento), 31, somente soube ontem que o atirador vivia a apenas uma quadra de sua casa. "Provavelmente, nunca prestei atenção nele. Quando a foto de Crimo apareceu em todos os jornais, percebi que não me lembro de tê-lo visto", disse à reportagem a vizinha que estava na parada cívica e viveu momentos de horror, acompanhada da família. Nos últimos três anos, a polícia esteve na casa de Crimo em duas ocasiões. Em uma delas, o rapaz tentou suicídio. Na outra, ameaçou matar toda a família. Em 2019, os agentes retiraram da residência e confiscaram 16 facas, uma espada e uma adaga.
Paul Crimo, tio de "Bobby", confidenciou à emissora CNN: "Eu realmente não gostava de me relacionar com ele". Segundo Paul, o sobrinho parecia uma pessoa "tranquila e solitária". "Não via sinais que indicavam que ele faria algo assim", desabafou. Paul e "Bobby" dividiam a casa de dois andares de Highwood. Ele relatou que, às 17h de domingo (19h em Brasília), viu o sobrinho pela última vez. O rapaz estava deitado na poltrona reclinável, na parte principal da casa, e mexia no celular.
Vítimas
As autoridades identificaram seis dos sete mortos no ataque de segunda-feira: Katherine Goldestein, 64 anos; Irina McCarthy, 35; Kevin McCarthy, 37; Jacquelyn Sundheim, uma professora prmária de 63 anos; Steogen Straus, 88; e o mexicano Nicolas Toledo, 78, que usava uma cadeira de rodas. O médico David Baum, que ajudou no resgate aos feridos, não escondeu o horror pelo que viu. "A visão terrível de alguns cadáveres é insuportável para uma pessoa normal", disse. Ele contou que as vítimas foram "destripadas" ou tinham os corpos crivados de balas.