guerra no leste europeu

Rússia e Ucrânia trocam acusações sobre bombardeio na prisão em Donetsk

Bombardeio destrói centro de detenção em Donetsk, no leste do território ucraniano. Ao menos 53 prisioneiros, entre eles combatentes do Batalhão de Azov, morrem. Moscou denuncia uso de sistema de artilharia entregue pelos EUA no massacre

Rodrigo Craveiro
postado em 30/07/2022 06:00
 (crédito: Comitê de Investigação Russo/AFP)
(crédito: Comitê de Investigação Russo/AFP)

Um bombardeio a um centro de detenção de Olenivka — cidade localizada em Donetsk, região controlada por separatistas no leste da Ucrânia — matou 53 prisioneiros de guerra ucranianos e feriu pelo menos 75. Moscou e Kiev se acusam mutuamente pelo ataque ao prédio que abrigava 193 prisioneiros de guerra ucranianos, inclusive combatentes do Batalhão de Azov que estavam entrincheirados na siderúrgica de Azovstal, em Mariupol (sudeste). A televisão estatal russa exibiu imagens de celas destruídas e de corpos carbonizados. 

Porta-voz do Ministério da Defesa russa, o tenente-general Igor Konmashenkov afirmou que a prisão foi destruída por um sistema de artilharia norte-americano Himars, entregue pelos Estados Unidos à Ucrânia, culpou as próprias forças ucranianas e classificou o incidente como "provocação sangrenta" para desencorajar a rendição de militares. Eduardo Basurin, vice-chefe da milícia da República Popular de Donetsk, denunciou um "crime de guerra". "As autoridades ucranianas mataram seu próprio povo, assim como todos os prisioneiros de guerra que são cidadãos ucranianos", disse à emissora de TV Rossiya-1. 

Do outro lado, Dmytro Kuleba, ministro das Relações Exteriores da Ucrânia, acusou a Rússia de cometer "outro crime de guerra petrificante ao bombardear uma instalação correcional na Olenivka ocupada, onde mantinha prisioneiros de guerra ucranianos". "Eu apelo a todos os parceiros para que condenem fortemente essa violação brutal do direito humanitário internacional e reconheçam a Rússia como um Estado terrorista", afirmou. O chanceler exortou a ONU, que facilitou a retirada de combatentes da siderúrgica de Azvostal, a também condenar Moscou e a visitar a prisão, a fim de levantar "todos os fatos desse crime hediondo". Kukeba também pediu ao Comitê Internacional da Cruz Vermelha que verifique a situação dos prisioneiros de guerra ucranianos. 

"Assassinato"

Anatoliy Tkach, encarregado de negócios da Embaixada da Ucrânia em Brasília, afirmou ao Correio que o ataque ocorrido na noite de ontem foi "um assassinato de prisioneiros de guerra ucrnaianos". "De acordo com as informações da parte russa, nem um único funcionário da prisão, combatente da autoproclamada República Popular de Donetsk ou militar russo que guardava as instalações ficou ferido como resultado da explosão", explicou. "Esse ataque da Rússia planejado foi realizado para disseminar a desinformação. Antes de tudo, é um assassinato em massa deliberado de soldados ucranianos presos."

Para Peter Zalmayev, diretor da organização não-governamental Eurasia Democracy Initiative (em Kiev), não parece que os ucranianos tenham sido os responsáveis pelo bombardeio. "Com o ataque a Olenivka, os russos tentaram esconder casos de tortura contra prisioneiros. Soldados de Moscou foram acusados de castrar alguns dos soldados ucranianos capturados. A denúncia se espalhou por meio do Telegram. O bombardeio à prisão parece uma manobra diversionista, para desviar o foco", contou à reportagem. Ele acredita que, ao envolverem um míssil HIMARS no incidente, os russos querem forçar os norte-americanos a interromperem o fornecimento desse tipo de armamento a Kiev.

Ainda segundo Zalmayev, o ataque pode ter ligação com a contraofensiva da Rússia para a retomada da cidade de Kherson (sul). "Ao matarem os prisioneiros, eles estariam interessados em desencorajar a rendição dos próprios soldados", disse, ao citar uma das teorias propagadas na Ucrânia. Por sua vez, Mykola Volkivskyi, ex-assessor do presidente do Parlamento ucraniano, lembrou que a Ucrânia e a Rússia — incluindo combatentes pró-Moscou de Donetsk — firmaram um acordo pelo qual soldados que estavam cercados em Mariupol se renderam e receberam o status de prisioneiros de guerra. "O presidente Zelensky alertou que o assassinato de qualquer um desses combatentes significaria o fim de qualquer negociação de paz. Foi um ato deliberado cometido pelos russos", aposta. 

Volkivskyi justifica a acusação com base no fato de que a Rússia não pode executar abertamente soldados. "Por isso, encena um ataque e culpa a outra parte. Parece-me que os russos almejam criar terreno para a perpetração de sua própria propaganda de guerra. Além disso, na sociedade russa, há uma demanda para atrocidades contra militares ucranianos — oficiais e comandantes toleram violações do direito internacional", comentou. 

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Eu acho...

 (crédito: Arquivo pessoal )
crédito: Arquivo pessoal

"As Forças Armadas da Ucrânia atacam exclusivamente as instalações militares russas: armazéns com combustível, armas e munições, postos de comando e instalações de infraestrutura militar. A Ucrânia não realizou ataques com foguetes e artilharia em Olenivka.
A natureza planejada deste crime e sua realização pela Rússia são indicadas por muitas evidências documentadas: em particular, a transferência deliberada de defensores ucranianos para um novo local pouco antes da explosão; análise da natureza dos danos e do movimento da onda de explosão; interceptações de conversas telefônicas dos militantes; ausência de bombardeios no local especificado, entre outros."

Anatoliy Tkach, encarregado de negócios da Embaixada da Ucrânia em Brasília

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