San Francisco, Estados Unidos - Um vazamento que compila arquivos confidenciais da Uber mostra táticas eticamente questionáveis e potencialmente ilegais que a empresa usou para impulsionar sua frenética expansão global há quase uma década, revelou neste domingo (10) uma investigação jornalística conjunta.
Apelidada de "Arquivos da Uber", a investigação feita por dezenas de veículos aponta que representantes da empresa aproveitaram a reação às vezes violenta do setor de táxi contra seus motoristas para obter apoio e evadir as autoridades reguladoras, enquanto buscava conquistar novos mercados.
No total, são 124 mil documentos de 2013 a 2017, obtidos inicialmente pelo jornal britânico The Guardian e posteriormente compartilhados com o Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos (ICIJ).
As revelações são outro duro golpe para uma empresa que sempre esteve envolvida em controvérsias em sua busca por se tornar uma força disruptiva do transporte local em todo o mundo.
Os documentos incluem trocas de mensagens de texto e e-mail entre executivos, incluindo o cofundador e ex-presidente Travis Kalanick, que foi forçado a renunciar em 2017 devido a acusações de práticas brutais de gestão e vários episódios de assédio sexual e psicológico dentro da companhia.
"A violência garante o sucesso", escreveu Kalanick a outro dos líderes da empresa enquanto promovia um contra-protesto em meio às manifestações de 2016 em Paris contra a chegada da Uber.
A rápida expansão da Uber foi sustentada por subsídios aos motoristas e descontos em tarifas que afetaram o mercado dos taxistas e "muitas vezes sem buscar licenças para operar como táxi ou serviço de limusine", segundo The Washington Post.
Motoristas do Uber em toda a Europa enfrentaram violentas represálias de taxistas que os viam como uma ameaça aos seus meios de subsistência. A investigação descobriu que "em alguns casos, quando os motoristas eram atacados, os executivos da Uber reagiam rapidamente para capitalizar" na busca de apoio regulatório e público, informou o Post.
De acordo com The Guardian, a Uber adotou táticas similares em países como Bélgica, Holanda, Espanha e Itália, mobilizando motoristas e os incentivando a denunciar à polícia quando era vítimas de violência, visando usar a cobertura midiática a seu favor.
Uma porta-voz de Kalanick negou veementemente as descobertas, alegando que ele "nunca sugeriu que a Uber se aproveitasse da violência às custas da segurança de seus motoristas". A empresa, no entanto, transferiu a culpa no domingo à liderança de Kalanick, cujos "erros" já vieram à público.
"Passamos de uma era de confronto para uma de colaboração, demonstrando vontade de vir à mesa e encontrar pontos de acordo com antigos opositores, incluindo sindicatos e companhias de táxi", disse a Uber, lembrando que seu substituto, Dara Khosrowshahi, "foi encarregado de transformar todos os aspectos de como a Uber opera."
- “Botão de emergência” -
A investigação também indica que a Uber trabalhou para evitar investigações regulatórias, aproveitando uma vantagem tecnológica, escreveu o Post.
O jornal descreveu o momento em que Kalanick implementou um "botão de emergência" para remover remotamente o acesso aos sistemas internos da Uber em dispositivos de um de seus escritórios em Amsterdã durante uma inspeção das autoridades.
"Por favor, aperte o botão de emergência imediatamente", escreveu o executivo a um funcionário por e-mail. "O acesso deve ser desligado em AMS (Amsterdam)."
A porta-voz de Kalanick, Devon Spurgeon, afirmou que o executivo "nunca autorizou nenhuma ação ou programa que obstruiria a justiça em nenhum país". Kalanick "nunca foi acusado em nenhuma jurisdição por obstrução da justiça ou qualquer outro crime relacionado", acrescentou.
No entanto, a investigação observa que as ações da Uber são ilegais e que seus executivos sabiam disso, citando um deles ao brincar com o fato de que teriam se tornado "piratas".
Os relatórios dizem que os arquivos revelam que a Uber também fazia lobby com governos para ajudar sua expansão, encontrando em Emmanuel Macron, ministro da Economia entre 2014 e 2016, um aliado na França.
A empresa acreditava que o atual presidente francês encorajaria os reguladores "a serem 'menos conservadores' em sua interpretação das regras que limitam a operação da empresa", disse o Post.
Macron era abertamente defensor da Uber e da ideia de transformar a França em uma "nação de empreendimentos" em geral, mas documentos vazados sugerem que o endosso do então ministro estava em desacordo com as políticas de esquerda do governo.
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