Convocados pela poderosa Confederação de Nacionalidades Indígenas (Conaie), os protestos contra o alto preço dos combustíveis no Equador invadiram, ontem, a capital, Quito, com violentos confrontos entre manifestantes e policiais. Centenas de indígenas bloquearam uma importante estrada que contorna a cidade e foram dispersos pelas forças de segurança com gás lacrimogêneo, no nono dia de mobilização. Com a escalada de tensão, o governo de Guillermo Lasso alertou para o "sério risco" à democracia.
O grupo de cerca de 500 indígenas, que entrou em confronto com a polícia, deixou a Universidade Salesiana, onde está hospedado, e pretendia chegar à Casa da Cultura Equatoriana (CCE), que foi tomada pela polícia. Para impedir o avanço da marcha, a tropa de choque disparou bombas de gás lacrimogêneo contra os manifestantes, que se dispersaram e pouco depois se reagruparam.
"A democracia do Equador está em sério risco diante da ação coordenada de pessoas exaltadas que impedem a livre circulação da maioria dos equatorianos", afirmou o ministro da Defesa, Luis Lara, ao lado dos comandantes do Exército, da Marinha e da Aeronáutica. "As Forças Armadas não permitirão tentativas de romper a ordem constitucional ou qualquer ação contra a democracia e as leis da República", acrescentou.
Saiba Mais
"Golpe"
Diante do agravamento da crise, com protestos espalhados por vários pontos do país, Lasso decidiu ampliar o estado de exceção de seis das 24 províncias, incluindo Pichincha, cuja capital é Quito. O presidente, que assumiu o cargo em maio de 2021, denunciou que o movimento indígena quer tirá-lo do cargo. "Estendemos a mão, chamamos para o diálogo, mas eles não querem paz, eles buscam o caos, querem derrubar o presidente", afirmou, em vídeo divulgado em sua conta no Twitter.
A Conaie participou de revoltas que derrubaram três presidentes entre 1997 e 2005.
Em 2019, protagonizou protestos violentos que deixaram 11 mortos, mais de mil feridos e obrigaram o então presidente Lenín Moreno a recuar no corte de subsídios aos combustíveis.
"Abaixem suas armas, somos povos de paz", exclamavam os mais de 5 mil indígenas que chegaram a Quito, na segunda-feira, em uma caravana. Vários levavam escudos feitos de placas de trânsito e latas de lixo e pirotecnias artesanais.
Em quase um ano, o diesel subiu 90% (a US$ 1,90) e a gasolina, 46% (a US$ 2,55). Desde outubro do ano passado, os preços estão congelados pela pressão social. Liderada por Leonidas Iza, a Conaie exige que os preços sejam reduzidos para US$ 1,50 e US$ 2,10, respectivamente.
Com os protestos, o Equador, cuja economia dolarizada tenta se recuperar do golpe da pandemia, tem um prejuízo diário de aproximadamente US$ 50 milhões. Isso sem levar em conta o setor petrolífero, principal produto de exportação, segundo dados oficiais. A estatal Petroecuador registra uma expressiva perda da produção total — 189 mil barris acumulados de petróleo foram parados, dos quais 168.788 da EP Petroecuador e 20.212 de operadores privados. Mais de 230 poços estão "desligados" devido às manifestações na região da Amazônia.
Os indígenas pedem também o controle de preços dos produtos agrícolas para melhorar suas economias familiares. Outra exigência é uma moratória de um ano para o pagamento de créditos ao banco.
"Para nós, pequenos agricultores, as coisas (insumos e fertilizantes) aumentaram bastante e nossos produtos não aumentaram nada", disse Tito Zamora, indígena da aldeia de Sigchos, em Cotopaxi, à agência de notícias France Presse. Ele destacou que enquanto um litro de leite é vendido por até um dólar no Equador, os pequenos produtores recebem 35 centavos pela mesma quantidade.