Apesar de seu governo acumular taxas recordes de desmatamento da Amazônia, o que atraiu atenção e crítica internacional, o presidente brasileiro Jair Bolsonaro afirmou em discurso nesta sexta, dia 10/6, em discurso na 9ª Cúpula das Américas, em Los Angeles, que o Brasil é uma "potência agrícola sustentável" e que o país não precisa desmatar "na região amazônica para expandir o nosso agronegócio".
A afirmação contraria o discurso feito por Bolsonaro de que não seria possível seguir demarcando terras indígenas e reservas ambientais sob o risco de inviabilizar economicamente o país, cuja balança comercial depende da produção de alimentos como soja, gado, café e açúcar. Diante de líderes de 22 países das Américas, Bolsonaro afirmou que o país "alimenta 1 bilhão de pessoas no mundo" graças à sua produção agropecuária, que ocupa apenas 27% do território nacional, nas palavras do presidente.
Desde o início do governo, em 2019, as taxas de devastação da Amazônia medidas pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) estão acima dos 10 mil km2. O assunto gerou críticas da União Europeia, engrossadas pelos EUA depois que Biden chegou à Casa Branca, em janeiro de 2021.
E embora desde a COP-26, no ano passado, os americanos tenham moderado suas críticas públicas à política ambiental do governo e tenham feito elogios às metas firmadas pelo Brasil no evento, como o compromisso de zerar o desmatamento ilegal até 2028, autoridades do governo Biden afirmam ter visto pouco ou nenhum avanço concreto da parte do Brasil para atingir esses objetivos.
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Nesta quinta, 9/6, os ministros da Justiça, Anderson Torres, e do Meio Ambiente, Joaquim Leite, tiveram uma reunião com o enviado climático de Biden, John Kerry, para explicar que tipo de ações o Brasil tem feito para coibir a destruição criminosa da floresta e explicar porquê tais ações ainda não geraram resultados práticos.
Os americanos atrelam à redução dos números o avanço para um acordo de financiamento da preservação da Amazônia que inclua recursos do contribuinte dos EUA. Durante o encontro bilateral com Bolsonaro, nesta quinta, no entanto, Biden voltou a citar o interesse em lançar um esforço internacional de financiamento da conservação do bioma.
"Vocês têm feito grandes sacrifícios como país na tentativa de proteger a Amazônia, o grande sumidouro de carbono do mundo. Acho que o resto do mundo deveria participar ajudando vocês a financiar isso para que vocês possam preservar o máximo que puderem. Todos nós nos beneficiamos disso", disse Biden, que não apontou mais concretamente como tal financiamento poderia acontecer.
Em seu discurso, Bolsonaro entrou em detalhes de suas políticas como o programa Guardiões do Bioma, lançado em março e que pretende instalar até 12 bases de monitoramento e combate ao desmatamento ilegal na área, com investimento de R$170 milhões. E citou ainda a legislação ambiental brasileira, que chamou de "rígida" e de "exemplo para o mundo".
E voltou a dizer que o Brasil conserva "84% da floresta Amazônica intacta."
Caso Dom e Bruno
Bolsonaro afirmou ainda que seu governo empreende uma "busca incansável" pelo jornalista britânico Dom Phillips e o indigenista Bruno Pereira, desaparecidos no Vale do Javari desde o último domingo. Ambos trabalhavam documentando e denunciando atividades de exploração ilegal de uma das maiores terras indígenas do Brasil.
O episódio voltou a jogar luz sobre aspectos da política ambiental do Brasil, que nos últimos anos cortou o orçamento de órgão de fiscalização e controle ambiental, como o Ibama.
O desaparecimento fez aumentar a pressão sobre o presidente em relação à sua política ambiental e gerou novas rodadas de apelos e críticas de congressistas da base de Biden. A qualidade e velocidade do socorro também foi criticado por entidades indígenas e de direitos humanos.
Na reunião desta quinta com Torres e Leite, Kerry também quis saber detalhes da varredura pelo resgate a Phillips e Pereira. Segundo Torres, o governo Bolsonaro já gastou mais de meio milhão de reais em recursos na operação, que emprega atualmente 300 homens.
Nesta sexta, em resposta a um pedido feito pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luís Roberto Barroso determinou que o governo apresente, em cinco dias, um relatório de todas as providências tomadas e informações levantadas a respeito do caso.
Maravilhado
Bolsonaro fez ainda questão de elogiar o presidente americano Joe Biden, com quem teve sua primeira bilateral nesta quinta, 9/6, depois de um ano e meio de espera.
"Ficamos por 30 minutos sentados em uma distância inferior de um metro e senti de Biden muita sinceridade e muita vontade em resolver os problemas que fogem da total responsabilidade de cada um de nós. A experiência de ontem com Biden foi simplesmente fantástica. Estou realmente maravilhado e acreditando em suas palavras e naquilo que foi tratado reservadamente", afirmou o presidente, diante da plenária da Cúpula das Américas.
Bolsonaro voltou a defender temas caros à sua base, como a liberdade religiosa e, sem citar nominalmente o STF, disse que "atualmente vivemos no Brasil e em parte do mundo um ataque claro às liberdades individuais por opinar de forma diferente". A declaração é uma referência aos inquéritos contra fake news que tramitam na Justiça brasileira e culminaram na derrubada de contas de bolsonaristas das redes sociais.
A Cúpula das Américas termina hoje e Bolsonaro afirmou que o Brasil se engajou nas negociações e deve assinar as declarações conjuntas sobre migração, democracia, mudanças climáticas e desmatamento e recuperação econômica pós-pandemia.
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