Após mais de um mês de "trégua", Kiev voltou ontem a ser atacada pelos russos, que vinham concentrando as ofensivas na região do Donbass. Um dos alvos foi uma infraestrutura ferroviária localizada 10km a sudeste do centro da capital da Ucrânia. O Kremlin anunciou ter destruído blindados entregues ao país por governos do Leste Europeu. De Moscou, o presidente Vladimir Putin alertou, horas depois, que Moscou atacará novas áreas se a Ucrânia receber mísseis de longo alcance do Ocidente.
De acordo com as informações oficiais, não houve mortes. Uma pessoa ferida foi levada ao hospital, segundo anunciou o prefeito de Kiev, Vitali Klitschko, no Telegram. Pouco depois, recebeu alta. Um edifício de 10 andares teve todas as janelas quebradas.
Segundo a empresa ferroviária, cerca de 700 funcionários trabalham em tempo normal nas instalações, que tem diversos hectares. "Ouvi seis explosões às 5h57 da manhã", contou Natalia, 72 anos, ex-funcionária da instalação bombardeada, que não quis informar o sobrenome.
Moscou destacou ter atingido armamento doado aos ucranianos. "Mísseis de alta precisão e longo alcance disparados pelas forças aeroespaciais russas sobre o subúrbio de Kiev destruíram tanques T-72 entregues por países do Leste Europeu e outros blindados que estavam em hangares", disse o porta-voz do ministério da Defesa russo, Igor Konashenkov.
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Artifício
Chefe adjunto do conselho de supervisão da companhia ferroviária ucraniana, Serhiy Leshchenko rebateu a informação e negou que houvesse armamento no local. "Esse é outro exemplo de falsificação por parte da Rússia para justificar essa guerra brutal", declarou à agência de notícias France-Presse. "Não há nada militar lá, eles bombardeiam qualquer coisa", afirmou Leonid, 63 anos, que trabalhou por 45 no local.
A ofensiva destruiu diversos galpões. Uma enorme cratera se abriu na instalação, causada por um projétil. A capital havia sofrido o último bombardeio em 28 de abril, dia da visita do secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres. Com a "trégua", quase dois terços dos 3,5 milhões de habitantes de Kiev retornaram à capital. As embaixadas dos países ocidentais também voltaram a funcionar.
O prefeito ressaltou que não há como dar garantias de segurança. As tropas russas levantaram o cerco à capital ucraniana e ao norte do país no final de março, para concentrar seus esforços no Donbass, no leste, que os separatistas pró-russos controlam parcialmente desde 2014. Autoridades ucranianas reconhecem que a Rússia não abandonou sua ambição de tomar Kiev.
Putin advertiu que usará todo seu poder de fogo se o Ocidente mantiver a disposição de ajudar os ucranianos com mísseis de longo alcance. "Então, tiraremos as conclusões apropriadas e usaremos nossas armas (...) para atacar alvos que não atingimos até agora", disse o líder russo, sem especificar a que locais estava se referindo, segundo trechos de uma entrevista transmitida ontem à noite pelo canal Rossiya-1. Na semana passada, os Estados Unidos anunciaram que fornecerão à Ucrânia um sistema avançado de mísseis.
Cidade dividida
Enquanto isso, combates de rua ocorreram no centro de Severodonetsk, uma cidade estratégica para russos e ucranianos na região do Donbass. Os combatentes de Putin perderam terreno, segundo Serhiy Haiday, governador da região de Luhansk, parcialmente controlada por separatistas pró-Rússia desde 2014, e da qual Severodonetsk é a capital administrativa ucraniana.
"Os russos controlavam cerca de 70% da cidade, mas nos últimos dois dias foram repelidos. Nossas forças armadas limparam a metade da cidade", afirmou, em uma entrevista publicada em seus perfis nas redes sociais. "Metade da cidade está realmente controlada por nossas forças", insistiu.
De acordo com Gaidai, o general russo Alexander Dvornikov estabeleceu a meta de até o dia 10 "tomar Severodonetsk completamente ou controlar a rota Lyssytchansk-Bajmut", que abrirá o caminho para Kramatorsk, a capital ucraniana de Donetsk, a outra maior região do Donbass. "Todas as forças (russas) estão concentradas nessas duas tarefas", disse ele.
A guerra continua em outras frentes. "A Rússia continua se esforçando para ocupar todo o nosso Estado", assinalou o ministro da Defesa ucraniano, Oleksi Reznikov. Segundo ele, o Kremlin sonha em "reunir as terras" que considera "suas", incluindo "Polônia, países bálticos, Eslováquia e outros".
Desde o início da invasão, a Rússia triplicou a área ucraniana sob seu controle, para cerca de 125.000km², ou 20% do país, segundo o presidente Volodymyr Zelensky.
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