Inglaterra

Ausência da rainha Elizabeth II na missa de ação de graças causa preocupação

Britânicos celebram o jubileu de platina da rainha Elizabeth II, a mais longeva monarca da história. Ausência em missa de ação de graças, hoje, causa preocupação. Especialistas em família real avaliam simbolismo da data e veem lenta transição

Rodrigo Craveiro
postado em 03/06/2022 06:00
 (crédito:  AFP)
(crédito: AFP)

O primeiro dos quatro dias de festejos do jubileu de platina de Elizabeth II — o qual marca as sete décadas de reinado — teve toda a pompa e o rígido cerimonial da realeza britânica, mas também despertou preocupações em relação à saúde da monarca de 96 anos. Vestida com casaco e chapéu azuis, e apoiada em uma bengala, a rainha assistiu ao tradicional "Desfile do Estandarte" a partir da sacada do Palácio de Buckingham, em Londres. Mais de 1,5 mil soldados, bandas musicais e centenas de cavalos marcharam durante a parada.

Horas depois, Elizabeth II fez outras duas aparições. Ao lado do filho e o primeiro na linha sucessória ao trono, príncipe Charles; da nora Camilla Parker; do neto William e sua esposa, Kate Middleton; e dos três bisnetos, ela mostrou-se sorridente durante a exibição da Força Aérea Real. À noite, diante do Castelo de Windsor, comandou a cerimônia de acendimento de 3 mil sinais luminosos e de uma enorme escultura imitando uma árvore de 21m de altura.

O Palácio de Buckingham informou que Elizabeth II não participaria da Missa de Ação de Graças por seu reinado, na Catedral de St. Paul, a partir das 9h15 de hoje (5h15 em Brasília). "A rainha gostou muito do desfile de aniversário e da exibição aérea, mas experimentou algum desconforto. Levando em conta a jornada e a atividade exigidas para participar da Missa de Ação de Graças, Sua Majestade, com grande relutância, decidiu não participar", afirma a nota.

  • Britain's Queen Elizabeth II (R) stands with Britain's Prince Charles, Prince of Wales to watch a special flypast from Buckingham Palace balcony following the Queen's Birthday Parade, the Trooping the Colour, as part of Queen Elizabeth II's platinum jubilee celebrations, in London on June 2, 2022. Huge crowds converged on central London in bright sunshine on Thursday for the start of four days of public events to mark Queen Elizabeth II's historic Platinum Jubilee, in what could be the last major public event of her long reign. (Photo by Daniel LEAL / AFP) AFP
  • TOPSHOT - Britain's Prince Louis of Cambridge (R) holds his ears as he stands next to Britain's Queen Elizabeth II to watch a special flypast from Buckingham Palace balcony following the Queen's Birthday Parade, the Trooping the Colour, as part of Queen Elizabeth II's platinum jubilee celebrations, in London on June 2, 2022. Huge crowds converged on central London in bright sunshine on Thursday for the start of four days of public events to mark Queen Elizabeth II's historic Platinum Jubilee, in what could be the last major public event of her long reign. (Photo by Daniel LEAL / AFP) AFP
  • Confira as principais informações sobre o primeiro dia de comemoração do Jubileu de Platina AFP
  • Confira as principais informações sobre o primeiro dia de comemoração do Jubileu de Platina AFP
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Problemas de mobilidade também levaram Elizabeth II a ceder o lugar para Charles, 73 anos, na tradicional saudação das tropas a cavalo. O herdeiro passou em revista os soldados, em nome da rainha. Ele estava acompanhado pelo filho, o príncipe William, 39, e a irmã Anne, 71. Todos vestiam uniforme de gala, e os dois imediatos na linha de sucessão usavam o icônico chapéu da Guarda Real.

Camilla, Kate e outros membros da família real chegaram em carruagens para acompanhar o desfile e acenaram para a multidão, que lotou a famosa avenida The Mall e ostentou bandeiras. Quase 70 caças da Força Aérea Real sobrevoaram Buckingham. Da sacada do palácio, Louis, 4 anos, caçula de William e Kate, roubou a cena, ao fazer caretas por causa do barulho dos aviões.

Elizabeth II se confunde com o próprio Reino Unido e acumula números impressionantes. Com 70 anos e quase 4 meses de reinado, é a mais longeva monarca da história britânica, superando a tataravó, rainha Victoria, com 63 anos, 7 meses e dois dias. Nessas sete décadas, viajou para mais de 100 países e realizou 150 visitas a nações da Commonwealth — o equivalente a 42 voltas na Terra.

Participou de 21 mil atos oficiais, aprovou por "consentimento real" cerca de 4 mil projetos de lei e recebeu inúmeros dignitários em 112 visitas de Estado. Elizabeth II conheceu 14 premiês, de Winston Churchill (1952-1955) ao atual Boris Johnson, com os quais manteve audiências semanais.

Professor emérito da Universidade de Buckingham, Anthony Glees disse ao Correio que a Missa de Ação de Graças, da qual Elizabeth se ausentará, é o evento mais importante do jubileu. "Os temores sobre a saúde da rainha e sobre a sucessão são, agora, ainda mais críticos", admitiu ao Correio. Segundo Glees, a ideia por trás do jubileu envolve celebrar a figura da rainha, os seus 96 anos (completados em 21 de abril passado) e as sete décadas de reinado. "Enquanto Elizabeth II permanecer no trono, muitos britânicos contrastarão a decência, a dignidade e a contenção da rainha com a extravagância, os excessos e as mentiras do premiê, Boris Johnon. Eles veem nela uma monarca constitucional em quem podem se espelhar."

"Muito poucas pessoas no Reino Unido se lembram de outro chefe de Estado britânico que não seja a rainha. Elizabeth II tem se mostrado onipresente. Ela raramente cometeu erros e está em uma posição única, como símbolo de unidade. Isso lhe permite dizer coisas que um político não poderia", explicou ao Correio Sean O'Grady, especialista em família real britânica e jornalista do The Independent.

Ele lembra que a monarquia é uma instituição democrática, no sentido de inexistir sem apoio popular. "Elizabeth II declarou que ficará no posto enquanto ao povo assim o desejar. Mesmo aqueles que prefeririam uma república reconhecem que ela devotou sua longa vida ao serviço público, desde sua coroação, aos 25 anos de idade", disse O'Grady.

História

"Este é o quarto jubileu de Elizabeth II — 25 anos (prata), 50 (ouro), 60 (diamante) e 70 (platina). É a história diante de nossos olhos. Nenhum monarca britânico reinou por 70 anos. Por tudo isso, a rainha tem sido diligente, trabalhadora e consistente. Elizabeth II desempenha as funções com dignidade, profissionalismo e, ocasionalmente, bom humor", afirmou à reportagem Ian Lloyd, autor de The Queen — 70 chapters in the life of Elizabeth II (A Rainha — 70 capítulos na vida de Elizabeth II).

Lloyd entende que a soberana utiliza a última etapa de sua vida para preparar os súditos a um novo reino, que demandará forte adaptação dos britânicos. "Elizabeth II sabe que Charles carece de confiança e não tem tantos admiradores. Por isso, faz o seu melhor para promovê-lo como o próximo rei. A monarca deixou claro que Charles deverá chefiar a Commonwealth, e que a esposa dele, Camilla Parker, será a rainha. Elizabeth II está ajudando o filho a seguir em direção ao seu destino", afirmou, por e-mail.

Eu acho...

“A rainha devotou toda a sua vida ao serviço público. Elizabeth II trabalhou de maneira extraordinariamente dura por todos os anos de seu reinado. Esse é o legado que ela deixará: o senso de dever e de devoção ao serviço público. Elizabeth tem sido uma monarca constitucional exemplar. Por sua vez, a monarquia britânica representa estabilidade e continuísmo em um mundo de mudanças rápidas. As pessoas respeitam a rainha por sua dedicação e celebrarão os 70 anos de reinado, a mais longeva monarca em atividade na história do Reino Unido.”

Robert Hazell, professor de governo e Constituição da University College London

“Os britânicos falam das Eras Georgiana (século 18) e Vitoriana (século 19). Agora, podem falar da Segunda Era Elizabetana (a primeira foi com Elizabeth I, de 1558 a 1603). A reputação de Elizabeth II é inatacável. Sua façanha e seu legado são o papel contínuo para um estranho sistema hereditário como parte da governança do Reino Unido. Elizabeth II deu exemplo de neutralidade política, como força unificadora para uma sociedade multicultural e multirracial.”

Sean O’Grady, especialista em família real britânica e jornalista do The Independent

“O legado de Elizabeth II está no fato de que, embora outras instituições, como a Igreja Anglicana e o governo, tenham perdido prestígio, a monarquia segue forte, relevante e bem respeitada. A rainha adaptou a monarquia à mudança e a conduziu por mares muito turbulentos nas últimas sete décadas.”

Ian Lloyd, especialista em família real britânica e autor de The Queen — 70 chapters in the life of Elizabeth II (A Rainha — 70 capítulos na vida de Elizabeth II)

“A rainha está preparando o Reino Unido para a sua morte e para a transição da coroa para Charles. A sucessão é de vital importância. Trata-se do futuro da instituição da monarquia, não da pessoa que ocupa o trono. Mas, a verdade é que o príncipe Charles não tem o mesmo carisma da mãe, nem seu charme, nem a popularidade da matriarca. Na verdade, ele é menos popular do que o filho, o príncipe William.”

Anthony Glees, professor emérito da Universidade de Buckingham

Comemorações em grande estilo 

Hoje

9h15 (5h15 em Brasília)
Missão em Ação de Graças, na Catedral St Paul. O maior sino do Reino Unido soará em homenagem à rainha, que se ausentará do evento principal.
amanhã

16h30 (12h30 em Brasília)
O Derby de Epsom Downs, uma das maiores corridas de cavalo da Inglaterra. Espera-se que Elizabeth II marque presença, ao lado de membros da família real.


19h30 (15h30 em Brasília)
Festa da Platina no Palácio de Buckhingam. Grande show com Queen e Adam Lambert, Elton John, Rod Stewart, Andrea Bocelli, Duran Duran, Alicia Keys e Diana Ross, entre outros artistas.
Domingo

Almoço do Jubileu para 20 mil pessoas, seguido pelo Cortejo do Jubileu de Platina, com 10 mil participantes e a presença de uma carruagem de ouro. A rainha não deverá estar presente.

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