Estados Unidos

Familiares das vítimas do massacre acusam polícia de demorar a invadir escola

Familiares de crianças mortas por atirador na Escola Primária Robb e moradores de Uvalde, no Texas, acusam as forças de segurança de demora na invasão ao prédio. Testemunha gravou vídeos que mostram a revolta de pais e mães com agentes

"O que vocês estão fazendo? Entrem no prédio!", gritou uma mulher em direção aos policiais. "Protejam nossos filhos!", suplicou outra mãe. Uma pessoa está deitada no chão, enquanto é imobilizada por um agente. "Que p... você está fazendo com ela? Solte-a!", clamou um homem. Do lado de fora da Escola Primária Robb, em Uvalde, no oeste do Texas, pais choravam, desesperadamente, enquanto oficiais pediam que se afastassem do local. Dentro do prédio, Salvador Ramos, 18 anos, teve pelo menos 45 minutos para executar 19 crianças e duas professoras, antes que a polícia invadisse a sala de aula do 4º ano e o matasse. "Vocês continuem lutando conosco, vão combater aquele filho da p...!", bradou um morador. Uma mãe desabafou: "Vocês estão com medo de levar um tiro? Eu irei sem colete a prova de balas, eu vou!"

Ontem, vídeos da tragédia de terça-feira, divulgados nas redes sociais, mostravam a indignação e a revolta dos pais de alunos ante a suposta omissão das forças de segurança. Victor Escalon, agente do Departamento de Segurança Pública do Texas, disse que os policiais não foram capazes de entrar na escola, "por causa do tiroteio que recebiam". Eles pediram reforços, enquanto ocorria a retirada de crianças e professores. "Aproximadamente uma hora depois, as equipes táticas da Patrulha Fronteiriça chegaram. Eles invadiram, atiraram e mataram o suspeito."

Escalon desmentiu que um policial escolar teria enfrentado Ramos no momento em que tentava ingressar no centro de ensino. "Ele não foi confrontado por ninguém", afirmou. Chefe da Patrulha Fronteiriça dos EUA, Raul Ortiz assegurou que os policiais "não hesitaram" em responder à ocorrência. "Eles elaboraram um plano. Entraram naquela sala de aula e cuidaram da situação o mais rápido que puderam", declarou à CNN.

Uma das gravações foi feita pelo trabalhador de construção Hugo Cervantes, 35 anos. Vizinho da escola, ele contou ao Correio que chegou ao centro de ensino por volta de meio-dia (14h em Brasília) de terça-feira, cerca de  20 minutos depois que Ramos invadiu o local com uma pistola e um fuzil AR-15. "Não havia muitos policiais no local. Vi desespero, angústia e impotência por não poderem entrar no prédio e ver o que estava se passando com as crianças. A polícia não atuou como deveria", criticou. "Nós pedíamos aos policiais que invadissem a escola. Eles apenas nos diziam que estava tudo bem, mas sabíamos que não. Do lado de fora, escutávamos os tiros vindos de dentro da escola. No fim das contas, foi um policial da guarda fronteiriça que entrou, sozinho, e matou o atirador."

Hugo disse que também escutou os disparos no momento em que Ramos abriu fogo contra o rosto da avó, de 66 anos. "O assassino vivia na casa de trás da minha. Ele atirou contra a idosa, que tentou detê-lo. Roubou a camioneta da avó e, por não saber dirigir, caiu em uma vala na esquina. Foi então que abandonou o veículo e entrou na escola", relatou. Por pouco, a filha de Hugo não entrou nas estatísticas de um dos maiores tiroteios em massa a atingir os Estados Unidos nos últimos anos. "Ela frequentava a Escola Primária Robb. Depois que a colocamos em um programa de ensino bilíngue, decidiram mudá-la de escola. Mas meus amigos perderam os filhos", lamentou. 

Jacinto Cazares disse à emissora ABC News que correu até a escola quando soube do tiroteio. Sua filha, Jacklyn, é uma das 19 crianças assassinadas. "Havia ao menos 40 agentes da lei armados até os dentes, mas não fizeram nada, até que foi tarde demais", contou. "A situação poderia ter terminado rapidamente se tivessem um melhor treinamento tático. Nós, como comunidade, fomos testemunhas de primeira mão."

Saiba Mais

"Monstro"

Adriana Reyes, mãe do atirador Salvador Ramos, contou à ABC News que o rapaz ficava agressivo ao sentir raiva, mas sublinhou que ele "não era um monstro". "Às vezes eu tinha uma sensação desconfortável, como 'o que você está fazendo?'", disse, ao admitir que não sabia que o filho tinha adquirido dois fuzis e uma pistola. "Essas crianças... Eu não tenho palavras", afirmou, em meio ao choro. "Não sei o que dizer sobre essas pobres crianças." No domingo, o presidente norte-americano, Joe Biden, deverá visitar Uvalde. 

Fotos: Hugo Cervantes/Divulgação - Policiais contêm moradores, enquanto mulher se desespera, diante do centro de ensino
Hugo Cervantes/Reprodução - Pouco depois, um agente (D) gesticula para a mesma mulher, a fim de evitar que ela fure o bloqueio de segurança e entre no prédio
Hugo Cervantes/Reprodução - Oficial imobiliza mãe de estudante, jogada ao chão, entre dois carros: truculência registrada em vídeo foi criticada nas redes sociais
Hugo Cervantes/Reprodução - Sentada no meio-fio, mulher é consolada por duas pessoas: na tarde de terça-feira, pais viveram momentos de horror ante a falta de notícias, enquanto Salvador Ramos executava 19 crianças

Eu acho...

"A polícia poderia ter disparado contra o atirador antes de ele invadir a escola. Como o assassino atirou contra os agentes, eles não quiseram se aproximar. As forças de segurança podderiam ter evitado tudo isso. Os moradores da nossa cidade estão chateados, porque os policiais não fizeram o que deveriam ter feito."

Hugo Cervantes, 35 anos, trabalhador da construção, vizinho da Escola Primária Robb, em Uvalde (Texas)