Todas as câmeras focalizavam o caixão que carregava o corpo da palestino-americana Shireen Abu Akleh, 51 anos, a jornalista da rede de tevê Al-Jazeera assassinada com um tiro na cabeça, na manhã de quarta-feira, durante uma operação militar israelense no campo de refugiados de Jenin, na Cisjordânia. Investigações preliminares foram incapazes de determinar de onde partiu o tiro que matou a repórter. Um clima de tensão envolveu o cortejo fúnebre de Shireen. Sob a alegação de terem sido apedrejadas, as forças de Israel avançaram contra a multidão, chutaram e golpearam palestinos com cassetetes, quase derrubando o caixão. A Casa Branca classificou a violência como "profundamente perturbadora".
Horas depois do enterro, Nida Ibrahim — colega de Shireen no escritório da Al-Jazeera em Ramallah (Cisjordânia) e correspondente da emissora na Palestina — falou ao Correio. "Shireen era um ícone que se tornou lenda. Isso foi claramente demonstrado pelo número de pessoas no funeral. Ela sempre teve orgulho de ser chamada de filha de Jerusalém. Milhares foram à despedida de Shireen, algo nunca antes visto por aqui. Israel sempre dificulta para as pessoas que tentam sepultar seus entes queridos", disse.
Segundo Nida, a polícia israelense atacou os presentes somente porque carregavam o caixão do lado de fora do hospital. "Os militares agrediram as pessoas por terem colocado uma bandeira da Autoridade Palestina sobre o caixão e chegaram a removê-la. Uma foto enviada à reportagem por Nida mostra cartazes espalhados pelo escritório da Al-Jazeera. Traziam a foto de Shireen e as mensagens "A cobertura continuará" e "Mártir da verdade". Na sala da jornalista morta, três coroas de flores e uma foto sobre a mesa vazia.
Ibrahim Alzeben, embaixador palestino em Brasília, afirmou ao Correio que Shireen tornou-se um ícone da luta de seu povo e da imprensa livre. Em relação à repressão durante o cortejo fúnebre da jornalista, o diplomata salientou que o comportamento israelense não é novo. "A novidade está no fato de a imprensa conseguir mostrar a cara feia da ocupação desta vez. Aprendemos duas lições com o que aconteceu: a insistência do povo palestino em obter seus direitos, em preservar a própria dignidade e a de seus mártires; e a feiúra da ocupação israelense e sua barbárie indescritível." (RC)