Guerra no leste europeu

Israel aceita retratação de Putin por declarações de chanceler sobre Hitler

Israel aceita retratação do presidente da Rússia pelas declarações do chanceler sobre Adolf Hitler ter "sangue judeu". Inteligência norte-americana teria repassado informações que ajudaram ucranianos a matarem generais de Moscou, diz The New York Times

Demorou quatro dias e custou o estremecimento das relações entre Tel Aviv e Moscou. No último domingo, o chanceler russo, Serguei Lavrov, afirmou que o líder nazista Adolf Hitler tinha "sangue judeu". O pedido de desculpas pelas palavras do chefe da diplomacia de Moscou foi feito, ontem, pelo presidente Vladimir Putin e aceito pelo governo de Israel, por meio de um telefonema. "O primeiro-ministro (Naftali Bennett) aceitou as desculpas do presidente Putin pelos comentários de Lavrov e agradeceu por ter esclarecido sua postura sobre o povo judeu e a memória do Holocausto", destacou o governo israelense, por meio de nota. 

Durante a ligação, Putin e Bennett destacaram a importância do dia 9 de maio — aniversário da derrota da Alemanha nazista - tanto para israelenses quanto para russos. Também lembraram que a data tem grande significado para a memória das vítimas do Holocausto. Ao conversar com o presidente de Israel Isaac Herzog, Putin disse acreditar que as relações entre as duas nações se baseiam nos princípios da amizade e do respeito mútuo, e continuarão a se desenvolver "para o benefício de nossos povos e no sentido de se fortalecer a paz e a segurança no Oriente Médio". 

No último domingo, em entrevista à emissora italiana Rete 4, Lavrov foi questionado sobre como as forças russas "desnazificariam" a Ucrânia se o próprio presidente do país (Volodymyr Zelensky) é judeu.  "Quando eles dizem 'Que tipo de nazificação é essa, se nós somos judeus?'. Bem... Eu acho que (Adolf) Hitler também tinha sangue judeu, então, isso não significa nada. O sábio povo judeu diz que os antissemitas mais ardentes são judeus", respondeu. A associação entre Hitler e origens judaicas provocou a revolta de Israel.

O chanceler Yair Lapid classificou os comentários de Lavrov de "escandalosos, imperdoáveis e um horrível erro histórico". O Ministério das Relações Exteriores israelense convocou o embaixador russo em Tel Aviv, Anatoly Viktorov, para prestar esclarecimentos e escutar o repúdio do governo Bennett. A Rússia acusa Zelensky de apoiar o grupo paramilitar ultranacionalista Batalhão de Azov. Ontem, combatentes da facção permaneciam entrincheirados no subsolo do complexo siderúrgico de Azovstal, em Mariupol, no sudeste da Ucrânia. 

Moradora de Herzliya (Israel) e sobrevivente do Gueto de Varsóvia e do campo de extermínio de Auschwitz — onde perdeu praticamente toda a família —, Halina Birenbaum, 92 anos, não aceita as desculpas de Putin. No entanto, ela disse ao Correio sentir-se melhor pelo fato de o líder russo ter admitido o perigo das mentiras relacionando Hitler aos judeus. "É difícil para mim acreditar em Putin, em Lavrov e em outros membros do governo russo. Muitas pessoas no mundo os escutam e acreditam que o ódio que eles sentem pelos judeus é algo correto."

Saiba Mais

Altos oficiais

O jornal The New York Times divulgou, ontem, que a inteligência dos Estados Unidos repassou informações para o Exército da Ucrânia que permitiram a localização de vários generais russos perto do front. Segundo a publicação, os esforços dos EUA para auxiliar a Ucrânia nos combates "foram concentrados em determinar a localização e outros detalhes sobre os quartéis móveis do Exército russo. As autoridades de Kiev estimam que 12 generais da Rússia foram mortos durante a guerra. As fontes de inteligência não reveladas pelo NY Times explicaram que dados combinados com os dos EUA, além da interceptação das comunicações, levaram a ataques de artilharia contra altos oficiais de Moscou. 

Diretor da ONG Eurasia Democracy Initiative, em Kiev, Peter Zalmayev admitiu ao Correio que, desde o início da guerra, em 24 de fevereiro, os ucranianos utilizaram imagens de satélites fornecidas por Washington para a defesa territorial. "Os americanos permitiram que os ucranianos soubessem quando os generais estavam próximos do front, a fim de Kiev atacá-los. A exceção ficou por conta do general Valery Gerasimov, chefe do Estado-Maior da Rússia, que visitou o leste da Ucrânia, na última semana de abril, e teria sido poupado", afirmou. 

Zalmayev demonstra ceticismo em relação a ações do Ocidente para provocarem Putin ainda mais. "No caso de uma derrota militar, Putin alegará que perdeu para um exército muito maior e que trava uma  espécie de 'guerra santa' contra a Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte)", comentou. 

Ontem, a Organização das Nações Unidas (ONU) enviou novo comboio para resgatar pelo menos parte dos 200 civis abrigados no subsolo do complexo siderúrgico de Azovstal, na cidade de Mariupol, no sudeste da Ucrânia. As autoridades de Kiev acusaram os russos de ignorarem uma trégua uniltateral que teria sido acordada para possibilitar a retirada, em segurança, dos moradores rumo à cidade de Zaporizhzhia, a cerca de 230km.

O Kremlin assegura o funcionamento dos corredores humanitários e o respeito à trégua humanitária, prevista para durar até domingo. Em vídeo, porém, o subcomandante do Batalhão de Azov, Sviatolslav Palamaar, relatou "combates sangrentos" no complexo de Azovstal e acusou as tropas de "violarem sua promessa de trégua". As suspeitas são de que a Rússia tentará esmagar o foco de resistência em Azovstal e controlar Mariupol, onde pretende fazer um desfile militar, na segunda-feira, para marcar o aniversário da vitória da União Soviética sobre a Alemanha nazista, na Segunda Guerra Mundial. 

Zelensky confirmou que 344 pessoas foram retiradas de Mariupol e de cidades vizinhas para Zaporizhzhia. Por meio de vídeo divulgado no Twitter, o presidente ucraniano lançou uma campanha de arrecadação de fundos para ajudar o seu país. O sistema utiliza a plataforma United24, criada especialmente com essa destinação. "Com um único clique, você pode doar fundos para ajudar nossos defensores, salvar nossos civis e reconstruir a Ucrânia", disse Zelensky. 

Atentado em Israel mata três e fere quatro

Às 20h53 (14h53 em Brasília), um morador da cidade ultraortodoxa de Elad — 25km a leste de Tel Aviv — publicou a mensagem no Twitter. "Eu estava no ataque em Elad. Os terroristas surgiram diante de mim e de outro amigo com machados enormes. Minha mão inteira está ensanguentada, mas miraculosamente escapei", escreveu. Dois homens armados com machados e facas afiadas chegaram a um parque na região central, mataram três judeus e feriram quatro. A situação clínica de um dos feridos era gravíssima, e outro tinha o estado crítico. O ataque ocorreu no Dia da Independência de Israel, um feriado festivo no qual várias famílias se reúnem e lotam os parques para celebrar. Desde 22 de março e antes do atentado de ontem, 15 pessoas haviam morrido em outros incidentes, entre elas um policial árabe israelense e dois ucranianos. Até o fechamento desta edição, ninguém tinha reivindicado a autoria do ataque de ontem. 

Eu acho...

"Eu não aceito as desculpas de Putin. Mas poderia ter sido bem pior, caso as palavras dele fossem substituídas por foguetes contra Israel. As palavras dos nazistas alemães sobre nós, judeus, terminaram com a câmara de gás e em 6 milhões de mortos!"

Halina Birenbaum, 92 anos, moradora de Herzliya (Israel), sobrevivente do Gueto de Varsóvia e do campo de extermínio de Auschwitz

 

 

 

"Na semana passada, colhemos o depoimento de um rapaz. Ele e quatro amigos civis foram presos pelos russos. Os soldados amarraram as mãos deles, os vedaram e os deitaram no acostamento de uma estrada. Os cinco foram mantidos ali por duas semanas, no chão. À noite, a temperatura chegava a 10 graus Celsius negativos. Uma tortura."

 

Katerina Butko, 33 anos, presidente da AutoMaidan, ONG criada em 2013 em Kiev, que exigia a integração do país à União Europeia, o combate à corrupção e sanções

contra a Rússia