Emmanuel Macron terá mais cinco anos pela frente no comando do Palácio do Eliseu. A vitória no segundo turno das eleições presidenciais — 58,5% dos votos contra 40,5% para a ultraconservadora Marine Le Pen — está longe de garantir um segundo mandato tranquilo. As urnas trouxeram ao líder da centro-direita uma importante lição: a França está profundamente dividida. Elas também deram à extrema-direita a votação mais expressiva de sua história.
O processo eleitoral implodiu os partidos tradicionais, como os Socialistas e os Republicanos (de direita). Para unir a nação e viabilizar a governabilidade, Macron aposta todas as fichas nas eleições legislativas marcadas para 12 e 19 de junho. Le Pen, por sua vez, vê a nova eleição como uma oportunidade de reafirmar o bom desempenho eleitoral e de enfraquecer Macron.
Na madrugada de 25 de abril, ao reconhecer a derrota, Le Pen anunciou: "Lançamos esta noite a grande batalha eleitoral das legislativas". As eleições parlamentares também são vistas como uma espécie de "terceiro turno" pela esquerda radical. Por sua vez, Macron pretende assegurar uma bancada confortável para impulsionar seu plano de governo rumo a uma "França mais independente" baseado no "trabalho", com foco na ecologia e no social. Segundo a agência de notícias France-Presse, o presidente quer transformar o país por meio do "renascimento" da energia nuclear e da meta de obter neutralidade do carbono em 28 anos. Também deseja aumentar a idade de aposentadoria dos 62 para os 65 anos — medida bastante impopular.
Na última sexta-feira, o Partido Socialista interrompeu as tratativas sobre uma coalizão de esquerda com a França Insubmissa, de Jean-Luc Mélenchon. "Queremos chegar a um acordo entre todos os partidos de esquerda e os ecologistas", anunciou Olivier Faure, líder dos socialistas. "Mas para isso, necessitaremos de uma lógica compartilhada verdadeira. Temos que quebrar essa lógica hegemônica e aceitar a pluralidade. Neste momento, não temos qualquer garantia disso." Mais um sinal do desgaste dos socialistas.
Jean-Yves Camus, cientista político do Instituto de Relações Internacionais e Estratégicas (Iris), em Paris, afirmou que Macron tem buscado antecipar as eleições legislativas em um mês — de junho para maio — para "surfar na onda" da vitória no pleito presidencial. "De qualquer forma, essa será uma eleição sem representação proporcional. Isso significa que tanto a esquerda radical quanto a extrema-direita geralmente ganham um número de assentos que não reflete a força vista na corrida presidencial", explicou ao Correio.
"Jean-Luc Mélenchon (extrema-esquerda) e Marine Le Pen (extrema-direita) querem transformar as legislativas em uma espécie de referendo contra Macron. Eles podem ser ajudados pelo fato de a abstenção costumar ser alta: eleitores bastante militantes votam mais do que a média do cidadão. Como as eleições para a Câmara dos Deputados ocorre depois da presidencial, o partido governista sempre tem confirmado a maioria", acrescentou Camus.
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Expectativas
De acordo com Camus, levando-se em conta o fato de não haver proporcionalidade nas eleições legislativas, as expectativas de Le Pen são altas. "Em 2017, o seu partido Frente Nacional obteve oito assentos na Assembleia Nacional, enquanto ela conquistou 10 milhões de votos na disputa presidencial naquele ano. Ela pode esperar um resultado melhor agora, incluindo ser reeleita em sua própria circunscrição eleitoral. No entanto, será preciso assegurar 15 assentos para formar uma facção parlamentar — a Câmara dos Deputados conta com 577 cadeiras. Se o partido de Le Pen ganhar 15 assentos, obviamente será uma grande vitória. Alcançar maioria na Câmara está além da imaginação."
Professor emérito da Universités à Sciences Po Paris, Bertrand Badie disse à reportagem que o espectro político francês encontra-se em uma "estranha situação". "Em primeiro lugar, o vencedor não é apoiado por um partido político e uma coalizão política verdadeira, o que dificulta a campanha para as eleições legislativas. Em segundo lugar, não existe uma estruturação clara dos eleitores franceses que foram muito mais motivados pelas opções negativas, como protestos, ira social ou o desejo de conter a ameaça da extrema-direita", observou.
Badie acredita que Macron terá problemas para governar. Ele ressaltou que o presidente foi reeleito pelos votos negativos — daqueles eleitores que não aceitavam o risco de terem uma liderança da extrema-direita. "O índice de abstenção foi alto. No geral, as pessoas estão realmente ficando cansadas de entregar votos negativos, em vez de escolher um presidente. Isso tem ocorrido em todas as eleições desde 2002!", afirmou.