Peru

Alta de preços gera manifestações e confrontos em Lima

Presidente decreta toque de recolher diurno para tentar conter protestos violentos contra a crise econômica, recua horas depois pedindo ao povo "tranquilidade", mas a medida não interrompe confrontos, em Lima, entre policiais e opositores

Pressionado por uma grave crise econômica — que tem desencadeado protestos violentos contra a alta de preços de combustíveis e alimentos —, o presidente peruano, Pedro Castillo, tomou uma medida polêmica na madrugada da última segunda-feira (4/4): decretou um toque de recolher diurno na capital, Lima, e no porto vizinho de Callao. A medida acabou acirrando os ânimos entre os críticos ao governo, que decidiu derrubá-la horas antes de completar o ciclo de restrições, sob a justificativa de que convocava "o povo peruano à tranquilidade". Segundo a imprensa local, porém, os protestos prosseguiram nas ruas da capital depois do recuo, com confrontos entre policiais e manifestantes.

"As medidas tomadas, como as adotadas na segunda-feira (4), não são para ir contra o povo, mas para resguardar a vida dos compatriotas", disse Castillo, ao anunciar o fim do toque de recolher, que deveria durar até a meia-noite. A decisão foi recebida com vivas por centenas de manifestantes reunidos perto do edifício do Congresso e em outras partes de Lima, afirmando que tinham dobrado o presidente, segundo jornalistas da agência France-Presse de notícias (AFP) que estavam no local.

Durante as restrições, que atingiram 10 milhões de pessoas, comércio e escolas foram fechados, mas o maior impacto pareceu ser a suspensão dos serviços de ônibus intermunicipais — voos domésticos e internacionais operaram normalmente no Aeroporto Jorge Chávez, segundo a concessionária. Militares e policiais patrulharam as ruas vazias da capital, mas muitos moradores seguiram para o trabalho sem serem interrompidos pelas forças de segurança. "Foi uma medida improvisada", reclamou à AFP Cinthya Rojas, nutricionista de um hospital que esperava condução em um ponto de ônibus.

Ao meio-dia, panelaços foram ouvidos em Miraflores, San Isidro e outras regiões de Lima. Algumas cidades mantiveram os protestos e bloqueios nas ruas ao longo da tarde. Com o fim da medida antes do previsto, deu tempo de ocorrer a partida de futebol, pela Copa Libertadores, entre o peruano Sporting Cristal e o Flamengo, no Estádio Nacional de Lima.

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Congresso

Na tarde de ontem, Castillo e integrantes do governo se reuniram com líderes da oposição que controlam o Congresso antes de derrubar o toque de recolher. "Vamos ouvir o Congresso e dizer o que estamos fazendo nesta conjuntura, nesta pandemia e mais ainda nesta situação que foi agravada pela guerra entre a Rússia e a Ucrânia (…) Estamos dispostos a conversar e ver uma saída conjunta para este cenário", disse, ao chegar ao Parlamento.

Há oito meses no poder, o esquerdista enfrenta a primeira grande manifestação contra seu governo — na segunda-feira, manifestantes e a polícia entraram em confrontos, barricadas foram levantadas e lojas, saqueadas. Logo em seguida, em mensagem transmitida na televisão, Castillo anunciou a "imobilidade cidadã" argumentando que a medida buscava "resguardar a segurança" da população "diante dos atos de violência que alguns grupos querem criar".

Os residentes de Lima foram surpreendidos pelo anúncio, porque os distúrbios foram localizados e os mais graves aconteceram nas províncias. Enquanto o presidente se reunia com os parlamentares, centenas de pessoas protestavam nas ruas da capital, marchando em direção à Plaza San Martín. "Castillo não está governando bem nosso país. Em vez de nos passar uma mensagem de tranquilidade, ele colocou em prática uma ditadura de nos trancar o dia todo", criticou a manifestante Karina Velásquez.

Mesmo os setores mais próximos criticaram o toque de recolher. A ex-candidata presidencial de esquerda Verónika Mendoza, cujo partido colaborou com Castillo, expressou "total repúdio a essa medida arbitrária e desproporcional". O anúncio do toque de recolher chegou uma semana depois de Castillo se livrar de uma destituição pelo Congresso, onde os opositores mais radicais o acusam de "falta de rumo" e de permitir a corrupção em seu entorno. O presidente amarga uma taxa de rejeição de 66%, segundo uma pesquisa da Ipsos realizada em março.