A capital ucraniana, Kiev, e a cidade de Lviv, a maior do oeste do país e uma das mais próximas da Polônia, voltaram a ser alvo de ataques russos.
Segundo a imprensa oficial russa, mais de 300 alvos foram atingidos por bombardeios em toda a Ucrânia, incluindo em Kiev, durante a madrugada desta segunda-feira (18/04). As autoridades de Lviv afirmaram que ao menos sete pessoas morreram como consequência dos ataques.
Entre os alvos na cidade localizada a cerca de 60 quilômetros da fronteira polonesa estão instalações militares e uma oficina de pneus.
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"Quarenta carros foram destruídos lá [na oficina]. Graças a Deus o número de mortos não foi maior", relatou o prefeito de Lviv, Andriy Sadovyi, em uma coletiva de imprensa.
Os bombardeios contra Kiev e Lviv seguiram um período de relativa calmaria nas cidades, depois que as forças russas retiraram suas tropas da capital e mudaram grande parte do foco da guerra para o leste do país, especialmente para a região de Donbas, nas últimas semanas.
A mudança no final de semana provocou uma série de especulações sobre a estratégia russa.
Para Mark Lowen, repórter da BBC News enviado a Kiev, os ataques dos últimos dias são uma espécie de alerta de que Moscou ainda não concluiu sua missão na capital e em outras regiões para além do leste do país.
Ao mesmo tempo, os bombardeios podem ter sido ordenados como forma de vingança pelo naufrágio do navio Moskva na semana passada.
"Os ataques diários são claramente uma vingança russa pelo naufrágio de seu principal navio no Mar Negro, o Moskva, na semana passada", diz Lowen em sua análise.
O cruzador de mísseis Moskva era a principal embarcação da frota russa do Mar Negro e afundou após ser profundamente danificado por uma explosão na quarta-feira (13/04).
O governo da Ucrânia afirma que a explosão foi causada por um ataque executado por suas forças. Moscou, por sua vez, diz que o naufrágio aconteceu após um incêndio a bordo, que causou uma "explosão de munição" guardada no Moskva.
O naufrágio do navio foi humilhante para Moscou - a maior perda de um navio de guerra russo desde a Segunda Guerra Mundial. E embora as forças russas tenham tentado demonstrar resiliência ao divulgar fotos da tripulação sobrevivente, é uma perda amarga, que a Rússia não deixaria passar em branco.
Novas imagens que supostamente mostram o navio pouco antes do naufrágio passaram a circular online.
As imagens foram supostamente tiradas em 14 de abril, um dia depois que a Ucrânia afirmou ter atingido o Moskva.
O Kremlin respondeu à publicação das fotos: "Nós vimos a filmagem, mas não podemos dizer quão autêntica e verdadeira ela é", disse o porta-voz do presidente Vladimir Putin, Dmitry Peskov.
As novas fotos não comprovam imediatamente as reivindicações de nenhum dos lados - mas não há sinal de tempestade no momento do vídeo.
A BBC mostrou as imagens do navio ao especialista naval Jonathan Bentham, do Instituto Internacional de Estudos Estratégicos, que disse que os danos visíveis sofridos pelo cruzador são consistentes com um possível ataque do míssil Neptune, mas enfatizou que não é possível descartar outras causas.
"As marcas de fumaça a bombordo parecem estar perto da linha d'água. Isso pode indicar mísseis que deslizam sobre o mar, como os mísseis Neptune", disse Bentham.
O especialista também observou as portas do hangar escancaradas, o que ele acredita sugerir uma tentativa apressada de evacuação por helicóptero. "Você normalmente fecharia as portas como uma boa prática para isolar qualquer coisa no hangar", disse Bentham.
Choque e destruição em Lviv
As mortes registradas em Lviv nesta segunda-feira são as primeiras de civis na cidade desde que a guerra começou.
Segundo o prefeito Andriy Sadovyi, 11 pessoas ficaram feridas com os bombardeios, e o número de mortes pode subir ainda mais nos próximos dias.
Lviv foi usada como local de passagem por dezenas de milhares de pessoas que fugiram para a vizinha Polônia após semanas de ataques em cidades como Kiev, Kharkiv e Mariupol.
Mas segundo o prefeito da cidade, os últimos bombardeios mostraram que agora "não há locais seguros e inseguros" na Ucrânia. "Todo mundo está inseguro", disse a repórteres.
E com a mudança de foco das forças russas para o leste do país, os ataques em Lviv deixaram muitos moradores em choque.
"Quando vemos [ataques] em Mariupol, quando vemos em Kharkiv, vemos através do prisma de uma grande tragédia", disse Sadovyi à BBC. "Mas quando acontece em casa, as pessoas veem através da perda da pessoa que você viu e com quem trabalhou apenas 30 minutos atrás".
Autoridades disseram que os mísseis atingiram três armazéns e uma oficina, onde um grupo de colegas se reuniu para tomar um café antes do trabalho.
Yury Baran - que trabalhava na área de TI da oficina - estava entre eles.
Seus pais, Anatoly e Maria, foram ao local do ataque procurar o filho que estava a menos de um mês de completar 27 anos. Voluntários que ajudavam a vasculhar os escombros lhes deram a notícia do falecimento de Yury.
"Seres humanos não podem fazer essas coisas. Eles não são seres humanos, são invasores bárbaros", disse Anatoly sobre os russos.
Valya mora em um prédio próximo ao local atingido pelos bombardeios desde que nasceu. A mulher de 70 anos ouviu as sirenes pouco antes das 8h do horário local, mas as ignorou, pois assumiu que estaria segura.
A explosão a derrubou no chão. "Eu estava com tanto medo", contou. "Tudo estava tremendo, todos os vidros se estilhaçaram."
Ainda de pijama, ela vagou pela rua atordoada até que um vizinho gritou para ela se refugiar em um abrigo. "Meu coração estava batendo forte", disse ela. "Tenho sorte que isso foi apenas a [onda de choque] e não um foguete."
Em entrevista à BBC após os ataques, Sadovyi disse que os moradores da cidade agora levarão as sirenes de ataque aéreo mais a sério.
Ataques russos já haviam atingido a região de Lviv em março, quando feriram cinco pessoas, mas essas são as primeiras mortes de civis confirmadas na cidade. "Acho que depois de hoje os moradores de Lviv não vão questionar, devo ir para o porão ou não?", disse o prefeito.
Os ataques do final de semana destruíram a sensação de segurança que muitos experimentavam no oeste do país.
Domingo (17/04) foi o primeiro dia desde o início da guerra em que o número de pessoas que cruzou a fronteira com a Polônia em direção à Ucrânia ultrapassou o dos que deixam o país. Alguns refugiados entrevistados pela BBC disseram estar voltando para casa depois de fugir do leste do país.
A própria cidade de Lviv tornou-se um refúgio para civis em fuga, grupos humanitários, diplomatas estrangeiros e jornalistas. As autoridades recentemente estenderam o toque de recolher até as 23h e os bares e igrejas do centro da cidade estavam movimentados no fim de semana.
Com reportagem de Toby Luckhurst e Mariana Maglych, da BBC News em Lviv, Dan Johnson e Mohamed Madi, e Shayan Sardarizadeh e Leo Sands, da BBC Monitoring
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