Guerra no leste europeu

ONU pune a Rússia por suposto massacre de Bucha; Brasil se abstém

Assembleia Geral suspende o país de Putin do Conselho de Direitos Humanos, em retaliação ao suposto massacre de Bucha. Brasil se abstém. Kremlin reconhece, pela primeira vez, "perdas significativas de soldados russos" e fala em "grande tragédia"

Rodrigo Craveiro
postado em 08/04/2022 06:00
 (crédito: Ronaldo Schemidt/AFP)
(crédito: Ronaldo Schemidt/AFP)

Ao levar a mão direita à cabeça, diante de uma das covas coletivas encontradas em Bucha, 15km a noroeste de Kiev, Martin Griffiths — subsecretário-geral das Nações Unidas para Assuntos Humanitários — sinalizou a gravidade do massacre supostamente cometido pelas tropas russas. No mesmo dia, em Nova York, a Assembleia Geral da ONU suspendia a Rússia do Conselho de Direitos Humanos da instituição, organismo que congregava, até então, 47 países-membros. A inédita punição a Moscou contou com 93 votos a favor, 24 contra e 58 abstenções, incluindo o Brasil. O governo de Vladimir Putin denunciou uma punição "ilegítima e de motivação política". O porta-voz do Kremlin, Dmitry Peskov, reconheceu, pela primeira vez, "perdas significativas de soldados" russos na Ucrânia. "É uma grande tragédia para nós", afirmou ao citar "milhares de mortes".

Em Bucha, onde forças russas são acusadas de executar moradores, Griffiths anunciou que uma investigação sobre as circunstâncias das mortes de pessoas em trajes civis é "a próxima etapa". Anatoliy Fedoruk (leia entrevista), prefeito de Bucha, disse ao Correio que a suspensão da Rússia do Conselho de Direitos Humanos foi uma medida tardia. "Desde a década de 1990, a Rússia tem sistematicamente bloqueado decisões que a impediam de cometer crimes em várias partes do mundo. Os criminosos de guerra não têm lugar nas instituições de defesa dos direitos humanos", ressaltou. "Infelizmente, essa decisão não vai deter Putin. Ele somente será impedido pela Corte Penal Internacional."

Para Kenneth Roth, diretor executivo da ONG Human Rights Watch (HRW), o voto da Assembleia Geral da ONU para suspender a Rússia do Conselho de Direitos Humanos foi um reconhecimento importante sobre os crimes de guerra cometidos na Ucrânia pelas forças russas. "Os membros do Conselho supostamente deveriam defender os mais altos padrões de direitos humanos. As forças russas na Ucrânia fazem o oposto", explicou ao Correio, por e-mail.

Ele disse não ter dúvidas de que Bucha foi palco de crimes de guerra. "É um evidente crime de guerra atirar em civis ou executar prisioneiros. As forças russas estão cometendo crimes de guerra em todos os lugares na Ucrânia, uma vez que atacam cidades e sitiam civis de Mariupol (leste)", comentou Roth. Ao ser questionado sobre a posição do Brasil na votação, o diretor da HRW lembrou que as abstenções não contam na definição dos dois terços de votos necessários para suspender um governo do Conselho de Direitos Humanos da ONU. "Embora tivesse sido melhor o Brasil votar 'sim', em apoio à resolução suspendendo a Rússia, a abstenção ainda foi um repúdio ao que Moscou pretendia", disse.

Comunicações

A revista alemã Der Spiegel publicou, ontem, que os serviços de inteligência da Alemanha interceptaram comunicações via rádio entre soldados da Rússia, em que eles abordavam os abusos e a matança de civis em Bucha. Em uma das mensagens de rádio, um soldado russo afirma a um colega que ele e sua equipe dispararam contra um ciclista. Em outra mensagem de rádio, um homem afirma: "Primeiro interrogamos as pessoas e depois as derrubamos". Os áudios sugerem uma participação importante de mercenários do chamado Grupo Wagner, organização nebulosa que teria ligações com o Kremlin, nos assassinatos.

Bucha seria a ponta do iceberg. Autoridades pró-Rússia revelaram que "cerca de 5 mil pessoas" morreram na cidade portuária de Mariupol, sitiada há semanas pelo Exército de Putin. O prefeito nomeado por Moscou, Konstantin Ivashschenko, também disse que entre "60% e 70% das residências foram destruídas ou parcialmente arruinadas" — o governo ucraniano fala em 90%.

Em discurso na noite de ontem, o presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, falou sobre a situação em Bucha e advertiu que o cenário é "muito mais assustador" em Borodianka, 25km a noroeste, com um número maior de vítimas. "Cada crime será esclarecido e seu carrasco, encontrado", prometeu.

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Pink Floyd lança música dedicada às vítimas

 (crédito: Pink Floyd/Reprodução)
crédito: Pink Floyd/Reprodução

A lendária banda britânica Pink Floyd se reuniu para lançar uma música em protesto ao conflito na Ucrânia. A canção Hey hey rise up, disponibilizada ontem nas redes sociais, é o primeiro lançamento inédito desde The Division Bell, de 1994. David Gilmour e Nick Mason trouxeram Guy Pratt e Nitin Sawhney para o single. Além do grupo, o cantor ucraniano Andriy Khlyvnyuk, que interrompeu uma turnê nos Estados Unidos para lutar na guerra, colabora nos vocais. "Nós, como muitos, temos sentido a fúria e a frustração desse ato vil de um país democrático independente e pacífico sendo invadido e tendo seu povo assassinado por uma das maiores potências do mundo", afirmou Gilmour, sogro e avô de ucranianas.

*Estagiária sob a supervisão de Rodrigo Craveiro

 

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