Ofensiva em um novo patamar

Invasão russa entra na quarta semana com o aumento da pressão sobre cidades ucranianas estratégicas e o uso repetido de mísseis de longo alcance. Kiev denuncia ataque a escola de artes que servia de refúgio para cerca de 400 civis

Enquanto o presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, se diz aberto ao diálogo para pôr fim à guerra com a Rússia, um conflito prestes a completar um mês, Moscou dá demonstrações claras de que não há intenção de recuar. Ao contrário: a semana começa com sinais de que a ofensiva chega a um patamar ainda mais destrutivo. Ao longo do fim de semana, cidades ucranianas estratégicas foram ainda mais pressionadas por tropas russas — com um ultimato de rendição para Mariupol — e o Kremlin parece ter consolidado o uso de mísseis hipersônicos no confronto.

Ao sudeste da Ucrânia, Mariupol tem o principal porto marítimo do país, além de ligar a península de Crimeia, que foi anexada pelos russos em 2014, à região de Donbas, onde estão as duas repúblicas que tiveram a independência reconhecida por Putin no mês passado: Donetsk e Lugansk. A cidade tinha até hoje para se render às tropas russas. "Abaixe suas armas. Todos aqueles que o fizerem têm garantia de passagem segura para fora de Mariupol", exigiu o diretor do Centro Nacional Russo de Gerenciamento de Defesa, Mikhail Mizintsev, em um comunicado emitido ontem à noite. Em resposta, a vice-primeira-ministra ucraniana, Iryna Vereshchuk, declarou que "não se pode falar de rendição de qualquer tipo".

A pressão russa se deu horas depois de Zelensky denunciar um bombardeio a uma escola de artes em Mariupol que servia de refúgio para 400 civis. "O prédio foi destruído, e as pessoas ainda estão sob os escombros. O número de mortos ainda está sendo levantado", informou o conselho da cidade. O presidente disse se tratar de mais um "crime de guerra". "Infligir algo assim em uma cidade pacífica... é um ato de terror", declarou.

Os ataques também seguiram na capital, Kiev, onde um projétil destruiu a parede externa de um prédio, ferindo ao menos cinco pessoas, segundo Vitali Klitschko, prefeito da região. De acordo com informações da Agência France-Presse (AFP) de notícias, o edifício de 10 andares está seriamente danificado, com todas as janelas destruídas. "Minha irmã estava na varanda quando aconteceu, ela quase morreu", contou Anna, 30 anos, que é moradora do prédio. As ofensivas também seguiram em Kharkiv, a segunda maior cidade do país, onde pelo menos 500 pessoas morreram desde o início da guerra, segundo dados do governo.

Hipersônicos

Há um temor de que os cenários de destruição e o número de vítimas aumente nos próximos dias, já que o Exército passou a usar o que considera um arsenal "invencível". As armas hipersônicas foram lançadas no fim de semana — primeiro em um depósito de armas, depois em uma reserva de combustível. "Um grande estoque de combustível foi destruído por mísseis de cruzeiro Kalibr disparados do Mar Cáspio e por mísseis balísticos hipersônicos lançados pelo sistema aeronáutico Kinjal do espaço aéreo da Crimeia", informou o Ministério da Defesa russo. O ataque também danificou severamente a siderúrgica Azovstal de Mariupol, cujo porto é crucial para a exportação do aço produzido no leste da Ucrânia.

Para os Estados Unidos, porém, o uso desses novos artefatos pode não ter grandes efeitos sobre o curso da guerra. "Não os vejo como revolucionários", declarou Lloyd Austin, secretário de Defesa americano, ao canal de televisão CBS. Segundo ele, ao usar essas armas, Moscou está "tentando recuperar o impulso em um conflito em que seu Exército está atolado". "Vimos (os russos) atacarem deliberadamente cidades e civis nas últimas semanas (...), isso porque a ofensiva está bloqueada", justificou. Austin também alertou a Rússia contra o uso de armas químicas ou biológicas no conflito. Se forem empregadas, observou ele, haverá "uma reação significativa não apenas dos Estados Unidos, mas também da comunidade internacional".