Uma das alternativas estudadas pelos ministros do presidente Jair Bolsonaro (PL), o congelamento temporário dos preços da Petrobras, foi defenestrada pelo ministro da Economia, Paulo Guedes. "Não tem congelamento, esquece esse troço", declarou, na noite de ontem, aos jornalistas, depois de encontro com o senador Roberto Rocha (PSDB-MA), relator da reforma tributária do Senado, a PEC 110/2019. Mais cedo, Guedes tinha demonstrado todo o seu descontentamento com a proposta de congelamento. Disse que "só maluco congela preço", segundo imagem flagrada pelo R7, em resposta a um questionamento de jornalistas sobre o assunto quando chegava à sede da pasta.
Analistas lembram que se as previsões de inflação já estavam sendo revisadas para cima com a invasão da Ucrânia pela Rússia, agora, com a decisão dos Estados Unidos, da União Europeia e do Reino Unido de suspenderem as compras de petróleo de Moscou, as perspectivas tendem a piorar, tanto para o Brasil quanto para o mundo. E, enquanto o barril do petróleo voltava a ficar acima de US$ 130, ontem, em meio a mais um dia turbulento nos mercado internacionais, os ministros e os técnicos do governo realizaram várias reuniões fora da agenda ao longo do dia. Mas não houve acordo.
A expectativa é de que as reuniões extra-agenda continuem hoje, porque as discussões prosseguem até que todos os cálculos sejam feitos pelos técnicos. Assim como Guedes, o ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, teve reuniões em seu gabinete e no Palácio do Planalto para tratar da questão dos combustíveis. No gabinete do ministro-chefe da Casa Civil, Ciro Nogueira, além de Guedes, de Albuquerque e de seus respectivos técnicos, os presidentes do Banco Central, Roberto Campos Neto, e da Petrobras, general Joaquim Silva e Lula, participaram das conversas. A Economia seguiu defendendo a redução de impostos e vetando as propostas de subsídios para compensar a diferença de preços internacionais, segundo fontes do governo. O presidente da Petrobras, o Ministério de Minas e Energia e a ala política do governo defenderam a adoção do subsídio.
Nervosismo
Na véspera, quando Bolsonaro criticou a política de preços da Petrobras, que acompanha o mercado externo, as ações da estatal desabaram sete pontos percentuais e lideraram as perdas de 2,52%, do Índice Bovespa (IBovespa), com a perspectiva do congelamento de preços. Ontem, o B3, principal indicador da Bolsa de Valores de São Paulo, recuou 0,35%, para 111.203 pontos.
As estimativas do mercado sobre o impacto fiscal de medidas para segurar os preços dos combustíveis variam muito, oscilando entre R$ 60 bilhões e R$ 200 bilhões, a depender do tempo em que forem adotadas. Ontem, após encontro almoço da Frente Parlamentar do Empreendedorismo (FPE), o presidente do Instituto Brasileiro de Petróleo, Gás e Biocombustíveis (IBP), Eberaldo de Almeida, estimou que o congelamento poderia chegar a R$ 200 bilhões se durasse todo o ano de 2022. Mais cedo, ele tinha afirmado que o impacto seria superior a R$ 113 bilhões, conforme simulação que considera o congelamento do diesel e da gasolina a preços de 2021.
Economista e professor de geopolítica Fábio Tadeu Araújo, sócio-diretor na Brain Inteligência Estratégica, avaliou que não está claro qual será o caminho para evitar o aumento muito forte no preço da gasolina e demais combustíveis para o consumidor neste momento. Mas ele estimou que o rombo fiscal poderá chegar a R$ 100 bilhões.
A Petrobras vem evitando fazer repasses contínuos dos choques recentes do petróleo. Conforme estimativas da Associação Brasileira dos Importadores de Combustíveis (Abicom), desde 12 de janeiro, a defasagem do preço interno da gasolina e do diesel está em torno de 25%. Resta saber como serão as conversas para a votação de hoje no Senado dos projetos de lei do senador Jean Paul Prates (PT-RN) que tratam de medidas para conter o preço dos combustíveis. Um dos projetos cria uma alíquota única do Imposto sobre Circulação de Mercadorias (ICMS) sobre combustíveis e o outro cria uma conta para estabilização dos preços do petróleo e derivados a partir do imposto sobre exportação do produto.
Revisões
A certeza de analistas é de que a inflação continuará em alta no meio da guerra, tanto que as previsões do mercado para o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) deste ano estão, cada vez mais, distantes do teto da meta, de 5%. Com isso, as estimativas para a taxa básica de juros (Selic) também estão sendo atualizadas para cima. O Banco Bradesco, ontem, apesar de manter a previsão de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) em 0,5%, elevou de 5,4% para 6% a estimativa para o IPCA no fim do ano e aumentou de 11,75% para 12,75% a expectativa para a taxa Selic em dezembro.
"Ainda é difícil prever o desfecho da guerra na Ucrânia e esse desfecho pode alterar de maneira significativa os números do cenário. De toda forma, como tratamos em nossa seção sobre o cenário internacional, os efeitos econômicos globais devem ser mais inflação e menos crescimento, resultados que também deveremos observar no Brasil", destacou o economista Fernando Honorato Barbosa, diretor de Pesquisas e Estudos Econômicos do Bradesco. O economista-chefe da Necton Investimentos, elevou a previsão para a inflação de 5,8% para 6%, e a estimativa para a Selic de 12,25% para 13,25%. "A situação corrente piorou muito, com o agravamento dos conflitos no Leste Europeu e da dinâmica das sanções impostas a Moscou e das retaliações que devem seguir por parte de Vladimir Putin (presidente da Rússia)", disse Perfeito.
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