Um líder que trabalhou para organizar negociações entre Ucrânia e Rússia ou um apoiador convicto dos planos de Vladimir Putin?
Belarus é um ator-chave no conflito entre a Rússia e a Ucrânia, embora suas intenções nem sempre pareçam totalmente claras.
Por um lado, o seu líder Aleksander Kukashenko organizou as negociações entre os delegados russos e ucranianos, mas, por outro, ofereceu seu país como base para tropas russas invadirem a Ucrânia.
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E no domingo (27/02), Belarus votou por uma mudança em sua Constituição que abre o caminho para que o país volte a abrigar armas nucleares.
"Se vocês [da Otan] transferirem armas nucleares para a Polônia ou Lituânia, para nossas fronteiras, então eu vou recorrer a Putin para recuperar as armas nucleares que entreguei incondicionalmente em 1994", disse Lukashenko.
Belarus, sob a liderança de Lukashenko, é um fiel aliado do Kremlin. Isso pode permitir que o país obtenha armas nucleares pela primeira vez desde que conquistou a independência da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS) em 1990.
O referendo também fortaleceu o próprio Lukashenko, que aos 67 anos garantiu efetivamente a presidência do país até 2035. Ele está no poder desde 1994.
Lukashenko é amplamente rotulado como um líder autoritário e acusado de censurar a oposição, a imprensa independente e ser subserviente aos interesses do Kremlin.
O Reino Unido decretou sanções contra comandantes do Exército de Belarus. Quatro oficiais de defesa e duas empresas militares estão incluídos no pacote de sanções .
A secretária de Relações Exteriores, Liz Truss, disse que o líder de Belarus, Alexander Lukashenko, ajudou e encorajou a invasão da sanções. Truss disse que Belarus "vai sentir as consequências econômicas de seu apoio a Putin".
Qual o papel de Belarus no conflito com a Ucrânia?
O encontro organizado por Lukashenko entre delegados russos e ucranianos foi um esforço para se conseguir uma solução pacífica para o conflito.
"Assim como fez em 2014, Lukashenko agora quer mostrar sua utilidade e mediar essas conversas entre a Rússia e a Ucrânia", diz Dina Fainberg, professora de Política Internacional da University College London, à BBC News Mundo (serviço de notícias em espanhol da BBC).
Em 2014, a Bielorrússia também sediou as negociações que tentaram neutralizar o confronto entre ucranianos e separatistas pró-russos na região de Donbas — em acordos que ficaram conhecidos como protocolo de Minsk.
Mas apesar dessa atitude mediadora, desde o início da atual invasão tem sido relatado que as tropas russas entraram na Ucrânia a partir de Belarus, com permissão de Lukashenko — uma atitude amplamente criticada pelo Ocidente.
No mesmo dia em que se anunciou o início de conversas entre a Ucrânia e a Rússia, um assessor do Ministério do Interior ucraniano disse que mísseis iskander haviam sido disparados de Belarus.
O ataque aconteceu mesmo depois que Lukashenko "assumiu a responsabilidade de garantir que todos os aviões, helicópteros e mísseis estacionados em território bielorrusso fossem aterrados durante a viagem, conversa e retorno da delegação ucraniana", segundo a Ucrânia.
Também houve especulações de que as tropas bielorrussas poderiam se juntar à invasão do lado russo. Relatos que apareceram no The Washington Post e no jornal ucraniano The Kyiv Independent sugerem que esse destacamento militar pode acontecer ainda esta semana.
Além disso, houve o referendo bielorrusso de domingo, que cria um marco legal para Belarus possuir armas nucleares.
O movimento coincide com a ordem de Putin de colocar suas forças de dissuasão, incluindo o arsenal nuclear, em estado de "alerta especial". O anúncio não significa que a Rússia pretenda usar as armas, mas o gesto foi amplamente percebido como uma ameaça.
O que significa que Belarus pode voltar a ter armas nucleares?
"A nova doutrina militar incluirá uma maior integração entre os dois exércitos (bielorrusso e russo) e permitirá a potencial implantação nuclear da Rússia em território bielorrusso", analisou William Alberque, diretor de Estratégia, Tecnologia e Controle de Armas do Instituto Internacional de Estudos Estratégicos.
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Entre 1994 e 1996, Belarus, Ucrânia e Cazaquistão concordaram em entregar suas armas nucleares em troca de promessas de segurança que Belarus agora diz terem sido ignoradas.
Para Fainberg, isso é algo que "precisamos levar muito a sério".
"Isso pode ter um impacto significativo na dissuasão futura e na forma como a região ficará após o conflito. É muito preocupante porque, além da possibilidade de abrigar armas nucleares, Lukashenko também garantiu mais tempo no poder e isso é mais tempo sendo fiel a Putin e ao Kremlin", disse Fainberg à BBC News Mundo.
O movimento de Belarus permitiria à Rússia colocar suas armas nucleares na "porta" da Polônia, entrada territorial na União Europeia.
Segundo Pablo de Orellana, professor de Relações Internacionais do King's College de Londres, isso é uma reminiscência de outros tempos.
"A possível nuclearização de Belarus, na minha opinião, é um jogo da Guerra Fria. Putin poderia, dessa forma, subir o tom de sua ameaça à Europa", disse o acadêmico à BBC News Mundo.
Orellana traça um paralelo com a crise dos mísseis cubanos em 1962, quando os principais blocos opostos da Guerra Fria —Estados Unidos e URSS — chegaram perto de um confronto nuclear.
"Naquela época a ameaça serviu para se retirar os mísseis. Se o próximo passo de Putin for levar armas nucleares para Belarus, pelo menos isso seria menos agressivo do que disparar. É uma forma de usar as armas sem realmente usá-las", diz o especialista. .
Por que Belarus é tão importante para Putin?
Durante muito tempo, Belarus tentou manter uma posição equilibrada entre a Europa e o Kremlin.
Mas essa posição relativamente neutra tomou um rumo radical com os protestos antigovernamentais sem precedentes que acusaram Lukashenko de ser um ditador e tentaram removê-lo do poder em 2020, após uma disputada eleição presidencial em que a oposição política foi perseguida.
Esse foi o ponto de inflexão depois do qual, segundo os especialistas, Lukashenko perdeu sua independência, aproximou-se ainda mais de Putin e transformou Belarus em "praticamente o mesmo Estado que a Rússia", diz Orellana.
"O que aconteceu com Lukashenko em Belarus é o principal medo de Putin: revoluções liberais ocidentais. Putin quase perdeu Lukashenko e, com ele, o controle de um território chave para dominar todo o acesso ao espaço eurasiano", acrescenta.
Para Fainberg, o terremoto político que afetou Lukashenko em 2020 foi algo a qual EUA e Europa não deram a devida atenção. Trata-se de uma "oportunidade perdida", diz ele, em que a Europa poderia ter feito mais para evitar o rumo seguido por Belarus.
"Precisamos ver o que está acontecendo como um conflito europeu e não como algum tipo de bárbaros loucos da Europa Oriental lutando entre si. Isso afeta toda a Europa e marcará os próximos anos", diz Fainberg.
Vários especialistas concordam que o plano de Putin é obter na Ucrânia o mesmo que em Belarus — um governo submisso que atende a seus interesses e o protege geopoliticamente da ameaça que ele vê na Europa e nos EUA.
No entanto, o presidente russo continua insistindo que o único objetivo de sua "operação militar especial" é defender a população de língua russa da Ucrânia, que ele considera ameaçada pelo atual governo.
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