Superpotência energética, a Rússia sofreu duro golpe, ontem, com o anúncio do presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, de cancelar a compra de petróleo, gás e energia produzida com carvão russo. A medida fez o preço do gás chegar ao seu nível mais alto de todos os tempos nos EUA. No Brasil, o barril do petróleo do tipo Brent chegou a US$ 130 nas bolsas, o maior valor nominal em 14 anos. A reação de países que condenam a invasão russa à Ucrânia pode marcar uma nova era para o mercado global de energia, que vê o Kremlin perder influência, enquanto outras potências emergentes lutarão para preencher o vazio, preveem especialistas.
"Os Estados Unidos vão mirar na principal artéria da economia da Rússia. Isso significa que o petróleo russo não será mais aceito nos portos norte-americanos", disse Biden em pronunciamento.
O presidente dos EUA disse que o preço da gasolina no país "deve subir mais" com a medida, mas afirmou que seu governo fará todo o possível para mitigar o impacto sobre os consumidores. "Estamos adotando o pacote mais significativo de sanções da história, deixando buracos na economia russa. O rublo vale agora menos de um centavo de dólar", ressaltou, citando alguns pontos, entre eles evitar que o banco central da Rússia consiga apoiar o valor do rublo e restringir o acesso do país a itens de tecnologia, o que acaba por penalizar a economia russa.
"Putin parece determinado a continuar nesse caminho da morte, não importa o quanto isso vai custar", declarou Biden. "Ele atacou a maior usina nuclear do mundo sem pensar que isso poderia ter causado um desastre gigantesco. A Ucrânia não será uma vitória para Putin", complementou, sobre a incursão militar na Ucrânia e o fato de Moscou não ter aceito um cessar-fogo até então.
Biden destacou que várias empresas americanas têm suspendido negócios com a Rússia, mesmo sem um pedido do governo americano, e cobrou companhias do setor de energia a não aproveitar o quadro para subir demais seus preços. Segundo ele, as empresas de energia que têm abandonado a Rússia estão "liderando pelo exemplo".
O mandatário norte-americano destacou que o país está perto de seu recorde na produção de petróleo, e também ressaltou o trabalho para que os EUA se torne um líder mundial na exportação de tecnologias ecológicas. Biden ainda celebrou a resistência dos ucranianos à invasão militar russa e disse que os Estados Unidos já enviaram mais de US$ 1 bilhão em assistência de defesa ao país, pedindo que o Congresso em Washington aprove um pacote de ajuda à nação europeia.
Resposta de Moscou
Logo após o anúncio, o governo de Putin comunicou que iria restringir a exportação e importação de alguns produtos e matérias-primas. O país irá determinar em dois dias quais são os insumos e países atingidos. Os russos ameaçaram cortar o fornecimento de gás para a Europa, caso sanções econômicas fossem impostas ao setor energético. E a dependência da União Europeia é alta: pelo menos 40% da energia a gás da União Europeia vem da Rússia.
Entre outros efeitos, a Rússia também alertou que, caso o embargo americano se concretizasse, o preço do barril poderia chegar a US$ 300, mais que o dobro do valor atual. O país também sinalizou que pode haver retaliações, como o fechamento do principal gasoduto para a Alemanha.
O Banco Central da Rússia anunciou, ontem, novas medidas que limitam as transações com moedas estrangeiras no país. Em comunicado, a instituição afirma que, até o dia 9 de setembro, os clientes poderão retirar no máximo US$ 10 mil de suas contas. Em caso de valor excedente, será convertido em rublos russos com a taxa de mercado do dia.
Os bancos também não venderão dinheiro aos cidadãos durante a vigência da ordem temporária, segundo a publicação, o que tem potencial de levar a transações no mercado paralelo. Os cidadãos poderão abrir novas contas e depósitos em moeda estrangeira, mas só será possível retirar fundos delas em rublos, aponta o Banco Central russo.
Segundo o comunicado, nos bancos russos, cerca de 90% das contas em moeda estrangeira não excedem o valor de US$ 10 mil, ou seja, 90% dos titulares de depósitos ou contas em moeda estrangeira poderão receber integralmente seus fundos em dinheiro.
Desdobramentos
Para o professor José Romero Pereira Júnior, coordenador do curso de relações internacionais da Universidade Católica de Brasília (UCB), a ação dos Estados Unidos é uma medida de contenção para não levar as duas potências a um conflito militar. "A decisão de Biden me parece alinhada a uma posição de potência preocupada com o ressurgimento da Rússia, rival histórico, e a frear a política agressiva de Moscou, entendendo que um dos mecanismos desse tipo de contenção, sem apelar para um conflito direto, é a decisão econômica, de tentar bloquear os principais produtos russos no mercado internacional — petróleo e gás, últimas commodities que não estavam em sanção", avalia.
Já sobre a reação da Rússia, o especialista é categórico ao afirmar que eles 'pagarão para ver'. "Os Estados Unidos entendem os limites dessa ação na coordenação com os europeus. Por hora, é uma medida mais unilateral, ao contrário do que a gente viu com as sanções na área bancária. Já a resposta russa, me parece ser na lógica do 'pagar para ver'. E o cenário está longe de ser o ideal economicamente, já que teremos impactos em todo o mundo, em termos de preço de gás e do petróleo", analisa.
* Estagiária sob a supervisão de Adson Boaventura
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