GUERRA NA UCRÂNIA

O risco Rússia: Putin eleva o tom das ameaças contra Otan e Zelensky

Presidente russo considera as sanções impostas pelos países ocidentais como declarações de guerra e avisa ao líder ucraniano: o país dele pode desaparecer como Estado independente. Aliança Atlântica mantém a posição de não intervir diretamente

Vinicius Doria - Especial para o Correio
postado em 06/03/2022 06:00
 Vladimir Putin posa para foto com aeromoças da empresa aérea Aeroflot, em um encontro recheado de mensagens duras aos países da Otan e a Zelensky       -  (crédito:  AFP)
Vladimir Putin posa para foto com aeromoças da empresa aérea Aeroflot, em um encontro recheado de mensagens duras aos países da Otan e a Zelensky - (crédito: AFP)

Enquanto a Rússia despeja bombas sobre as cidades ucranianas e milhões de pessoas abandonam suas casas para fugir da guerra, que entrou na terceira semana, o presidente da Rússia, Vladimir Putin, aproveitou um encontro com comissárias de bordo de uma empresa aérea para mandar recados aos líderes ocidentais. Todos provocativos e preocupantes.

O presidente russo compara as sanções econômicas impostas ao seu país como uma declaração de guerra. "Muito do que está acontecendo agora, do que vemos e do que enfrentamos é, sem dúvida, um meio de lutar contra a Rússia. Aliás, essas sanções que estão sendo impostas são como a declaração de guerra. Graças a Deus, as coisas ainda não foram tão longe, mas acho que nossos chamados parceiros ainda entendem quais podem ser os resultados e quais ameaças isso representa para todos", disse.

Além da crítica às sanções, o presidente russo fez um alerta sobre o pedido do presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, para que os países ocidentais fechem o espaço aéreo russo — já negado pela Otan. Putin disse que uma medida como essa também será interpretada como ato de guerra. E fez uma ameaça à existência da Ucrânia como país: "A atual liderança tem que entender que, se continuarem fazendo o que fazem, arriscam o futuro do Estado ucraniano. Se isso acontecer, eles serão os culpados".

Para o público interno, o chefe do Kremlin disse que não vai impor lei marcial no território russo e que o país tem alimentos para suportar as sanções econômicas. "Somos totalmente autossuficientes em todos os produtos alimentícios, produtos básicos, cobrimos completamente as necessidades do país", assegurou.

Aproveitando que a conversa era com um grupo de aeromoças, disse que o país já está substituindo importações por produtos locais, incluindo aeronaves. Ontem, a empresa aérea russa Aeroflot anunciou a suspensão dos voos para cidades do Sul do país.

As agências de notícias russas foram ágeis na divulgação das declarações de Putin, que repercutiram imediatamente. Já o presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, cobrou o endurecimento das sanções, em especial, o bloqueio das importações de petróleo e gás russos, assim como a suspensão, na Rússia, do uso de cartões de crédito Mastercard e Visa.

À tarde, as duas gigantes americanas confirmaram o encerramento das operações no país. Em comunicado, as bandeiras avisam que cartões emitidos por bancos russos não serão aceitos fora do país, enquanto os cartões emitidos no exterior não funcionarão em caixas eletrônicos na Rússia.

Zelensky participou, ontem, de uma audiência virtual no Congresso dos Estados Unidos. Conseguiu, além da solidariedade parlamentar, a promessa de que os EUA vão desbloquear US$ 10 bilhões para ajudar a financiar a resistência ucraniana e os esforços humanitários no país ocupado.

Segundo o líder do Partido Democrata no Senado, Chuck Schumer, o presidente ucraniano também apelou aos congressistas para que ajudem o país dele a receber aviões de fabricação russa, para os quais os pilotos ucranianos já tem treinamento.

O ministro das Relações Exteriores da Rússia, Sergey Lavrov, disse que Zelensky está "tentando provocar um conflito envolvendo a Otan, entre a Otan e a Rússia". Considerou as atitudes do líder ucraniano "um frenesi militarista que sugere que ele não precisa de negociações", em referência ao diálogo aberto por delegações dos dois países no sentido de buscar, ao menos, um cessar-fogo. "Mas, vamos torcer para que esse clima possa mudar, ele é um homem de humores. Vamos torcer", declarou Lavrov.

As agências de notícias russas confirmaram para amanhã a terceira rodada de negociações diretas entre Rússia e Ucrânia, na região de fronteira com a Polônia. Para o ministro Lavrov, as condições para solucionar a crise "estão postas na mesa". "Acreditamos ser indispensável eliminar a ameaça que vem sendo criada há anos pela Otan contra a Rússia", disse o chefe da diplomacia do Kremlin.

Ele lembrou que essas condições incluem a desmilitarização e a "desnazificação" da Ucrânia, que teria status de país neutro e o reconhecimento das áreas ocupadas, como a Península da Crimeia (ocupada pela Rússia desde 2014) e a região do Donbass, controlada por separatistas pró-Rússia.

Cautela

"A Crimeia faz parte da Rússia há muito tempo. Esse é um fato que deve ser reconhecido. E a independência proclamada pelas Repúblicas Populares de Donetsk e Lugansk dentro das fronteiras das respectivas regiões deve ser reconhecida também", destacou o ministro russo.

Em Bruxelas, na sexta-feira, ministros das Relações Exteriores dos países da Otan reuniram-se extraordinariamente para avaliar os cenários da crise. O secretário-geral da aliança, Jens Stoltenberg, reafirmou que a organização tem a responsabilidade de garantir que o conflito fique circunscrito ao território ucraniano.

Disse ainda que "a Otan não está buscando uma guerra com a Rússia" e que a aliança pretende manter abertos os canais de comunicação com Moscou.

A agência de notícias espanhola Efe, a Rádio e Televisão Espanhola (RTVE), a BBC britânica, a agência de informação financeira Bloomberg, os canais públicos alemães ARD e ZDF e a italiana RAI anunciaram a suspensão das atividades na Rússia, depois que Moscou aprovou uma lei que prevê multas e penas de até 15 anos de prisão para quem publicar "notícias falsas" sobre a Forças Armadas russas.

Ontem, vários sites de notícias já estavam parcialmente inacessíveis. O Facebook foi bloqueado e o Twitter está com acesso "restrito". Para o porta-voz do Kremlin, Dmitri Peskov, a lei é necessária porque entende que o país dele está enfrentando uma "guerra de informação".

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