Um bombardeio de mensagens de condolências acordou a ucraniana Yulia Mysko, de 33 anos, na manhã desta quinta-feira (24/2). “Sinto muito”, diziam recados enviados por dezenas de amigos à artista plástica e capoeirista, que vive há 10 anos no Brasil, 5 deles em Belo Horizonte.
“Como estava acompanhando as notícias, logo entendi que a Rússia havia invadido a Ucrânia. Acordei chorando e fui direto ligar para os meus pais”, conta Mysko, natural de Ternopil, no interior do país do leste europeu. A cidade fica a cerca de duas horas de Ivano-Frankivs'k, onde os russos lançaram um míssil nas primeiras horas desta madrugada, atingindo uma base aérea militar.
“Não cheguei a pensar que minha família tivesse sido atingida, mas fiquei muito apreensiva, pois não imaginei que a Rússia fosse atacar logo de cara as cidades do interior. Então entrei em contato com meus pais para ver como estava o planejamento deles, se pretendiam deixar o país e se estavam seguros”, relata a artista.
Os familiares de Yulia a tranquilizaram. Segundo a artista, tanto em Ternopil, quanto na capital ucraniana Kiev, onde ela tem tios e primos, estão todos bem e, por ora, não pensam em deixar a Ucrânia.
Medo e caos
O clima geral, contudo, é de caos e tensão. Mysko diz que uma das primas está presa em Kiev, já que o combustível acabou por lá. Com a invasão russa, os postos registram longas filas, uma vez que o espaço aéreo foi fechado e milhares de pessoas tentam fugir pelas estradas.
Os supermercados também estão lotados. Em muitos já falta comida. Os moradores ainda registram bloqueios em cartões de crédito por causa de ataques virtuais ao sistema bancário e consequente corrida aos bancos para sacar dinheiro, pois a população teme que os cartões permaneçam inoperantes por muito tempo.
"Em Ternopil, o dia de trabalho foi suspenso, está todo mundo em casa. Apesar da desordem e do medo, minha família está relativamente tranquila e pretende ficar na Ucrânia. Mesmo porque estão cientes da estratégia da Rússia, que é usar o desespero para expulsar as pessoas do país. A orientação do governo ucraniano, neste momento, é que a população fique unida e fortaleça a Ucrânia”, afirma Yulia.
"De qualquer forma, fiquei muito feliz com as demonstrações de solidariedade que recebi. Meus amigos italianos, por exemplo, de imediato, se ofereceram para receber minha família, caso fosse necessário", complementa.
Em caso de eventuais bombardeios, os pais e os irmãos da ucraniana planejam se abrigar em um bunker (cômodo feito para resistir a projéteis de guerra) situado logo abaixo do prédio em que moram. “Essas estruturas são muito comuns no país. São heranças da Segunda Guerra Mundial. Grande parte dos prédios tem bunkers”, diz a capoeirista.
Questionada sobre o que sentiu diante do apoio do presidente Jair Bolsonaro (PL) a Vladmir Putin, demonstrado em 16 de fevereiro, quando o mandatário brasileiro esteve na Rússia, Yulia demonstra indignação.
“Talvez o presidente não saiba que a maior comunidade de ucranianos fora do país está no Brasil, especialmente no Paraná. A ligação entre a Ucrânia e o Brasil é tão estreita que, em Prudentópolis (PR), a língua ucraniana é reconhecida como oficial dessa cidade desde novembro de 2021, ao lado do português. Só ditadores têm apoiado Putin. Quando Bolsonaro se coloca do lado desses líderes, ele mostra quem é”, critica.
Migração
Yulia Mysko conta que chegou ao Brasil em 2012. Naquele ano, ela se mudou da Itália, onde estudava, para Curitiba (PR), para fazer um intercâmbio cultural ligado à prática de capoeira. Em 2017, ela veio para BH, onde se casou e pretende ficar por longos anos.
“Gosto muito do Brasil e de BH. Por enquanto, não pretendo voltar para a Ucrânia. Trazer minha família seria ótimo, mas também não está nos planos. Eles não querem e eu também não teria condições de mantê-los aqui. Mas falo constantemente com eles”, diz Yulia.
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“Gosto muito do Brasil e de BH. Por enquanto, não pretendo voltar para a Ucrânia. Trazer minha família seria ótimo, mas também não está nos planos. Eles não querem e eu também não teria condições de mantê-los aqui. Mas falo constantemente com eles”, diz Yulia.