Enquanto o líder francês Emmanuel Macron tentava pavimentar uma saída diplomática para a crise em torno da Ucrânia, o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, aumentou, ontem, o tom contra Moscou. Após receber o chanceler alemão, Olaf Schölz, na Casa Branca, Biden afirmou que o gasoduto Nord Stream 2 não vai entrar em operação se o presidente russo, Vladimir Putin, ordenar a invasão do país vizinho.
Orçado em US$ 11 bilhões, Nord Stream 2 liga os campos de produção russos à Alemanha pelo Mar Báltico, com a meta de dobrar a capacidade de fornecimento. O primeiro Nord Stream leva anualmente 55 bilhões de m³ de gás para o país europeu, quase metade do consumido por lá. "Não haverá mais Nord Stream 2. Vamos colocar fim a isso", assegurou Biden, em coletiva de imprensa conjunta com Schölz.
"Eu prometo a vocês que vamos acabar com isso", reforçou, diante dos comentários dos jornalistas de que os EUA não participam do projeto. O chanceler alemão, defensor do Nord Stream 2, não endossou, nem mesmo comentou, a ameaça do líder americano. "Concordamos que não pode haver negócios como usual no caso de uma invasão", acrescentou o chefe da Casa Branca.
Biden procurou demonstrar que EUA e Alemanha estão alinhados perante a Rússia sobre a crise com a Ucrânia. "Estamos trabalhando em sintonia para deter uma futura agressão russa na Europa", disse o democrata, no Salão Oval da Casa Branca. Scholz, em sua primeira visita a Washington desde que substituiu a longeva líder Angela Merkel, disse que os dois países são "aliados próximos e trabalham juntos intensamente".
O chanceler ressaltou que as tarefas dele e de Biden incluíam combater uma agressão russa à Ucrânia. "Portanto, é uma reunião importante em um momento muito, muito importante". O novo governo alemão tem sido alvo de críticas da Ucrânia e de Washington de que não estaria totalmente comprometido com os esforços liderados pelos americanos para fazer recuar a pressão militar russa sobre a Ucrânia, que é pró-Ocidente. A visita a Biden teve o objetivo de atenuar as divergências.
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Garantias
Em Moscou, Macron investia em uma negociação diplomática com Putin. O encontro, de mais cinco horas de duração, aparentemente alcançou resultados. Após a longa conversa, os dois líderes, a despeito das conhecidas diferenças, falaram em possíveis pontos de convergências, sem especificá-los.
"Ainda é muito cedo para falar sobre isso, mas acho que é bem possível que elas se tornem a base de nossos próximos passos", disse o russo, ao lado do francês, no Kremlin. Emmanuel Macron propôs "construir garantias de segurança concretas" para todos os Estados implicados na crise ucraniana. Um novo diálogo entre eles deve ocorrer após a visita que Macron faz hoje a Kiev.
Na conversa com Vladimir Putin, Macron disse que desejava "iniciar uma desescalada" da crise em torno da Ucrânia. "Nosso continente está, atualmente, em uma situação muito crítica, o que nos obriga a ser extremamente responsáveis", destacou o francês, sentado em uma ponta de uma longa mesa branca no salão do Kremlin e a vários metros de Putin.
O presidente da França, cujo país ocupa a presidência rotativa da União Europeia (UE), é o primeiro líder ocidental de alto nível a se encontrar com o líder russo desde que as tensões aumentaram, em dezembro do ano passado. Putin voltou a acusar a Otan de ter se expandido nos últimos 30 anos a ponto de ameaçar a Rússia. Também denunciou a ajuda militar que os países ocidentais dão à Ucrânia.
O russo condenou ainda a negativa do Ocidente a aceitar suas principais exigências, como o fim da expansão da Aliança Atlântica, e criticou a Ucrânia.
"Kiev continua rejeitando todas as possibilidades de restabelecer pacificamente sua integridade territorial", queixou-se. Moscou nega qualquer intenção bélica, mas quer garantias sobre sua segurança, reivindicação sobre a qual aparentemente Macron aceitou conversar.
Em meio a toda essa movimentação, o chefe da diplomacia europeia, Jose Borrell, externou ontem apreensão. "Sem dúvida, estamos vivendo, na minha opinião, o momento mais perigoso para a segurança na Europa após o fim da Guerra Fria", disse. Considerou, de qualquer forma, que uma "solução diplomática" com a Rússia na Ucrânia ainda é possível.
"Ninguém concentra 140 mil soldados fortemente armados na fronteira de um país sem que isso represente uma forte ameaça", enfatizou, calculando que há mais tropas russas nos portões da Ucrânia do que os 110 mil mencionados nos últimos dias por funcionários americanos. "Eles não estão lá para tomar chá", exclamou Borrell.
Junto a ele, o secretário de Estado norte-americano, Antony Blinken, negou que haja exagero nas advertências feitas por Washington. "Não é alarmismo, são apenas os fatos", disse em uma coletiva de imprensa conjunta. "Nós não acreditamos que Putin tenha tomado uma decisão, mas ele colocou os meios, caso decida fazê-lo, para agir muito rapidamente contra a Ucrânia de uma forma que teria consequências terríveis para a Ucrânia, a Rússia e todos nós", insistiu o chefe da diplomacia dos Estados Unidos.