Dois anos após o início da pandemia de covid-19, a Europa poderá entrar em breve “num longo período de tranquilidade”, destacou, ontem, Hans Kluge, diretor da Organização Mundial da Saúde (OMS) para o continente. “É uma trégua que pode nos trazer uma paz duradoura”, ressaltou. Nos últimos dias, vários países começaram a suspender suas restrições, após semanas conturbadas em razão da variante ômicron.
A agência da ONU argumenta que, graças ao alto número de pessoas vacinadas, à menor gravidade da cepa e à proximidade do fim do inverno, o continente poderá se defender melhor contra qualquer
ressurgimento do vírus. “Há uma oportunidade única de assumir o controle da transmissão”, disse Kluge.
Ele assinalou, contudo, que essa situação só vai durar se a imunidade for preservada, ou seja, se as campanhas de vacinação continuarem e o aparecimento de novas variantes for monitorado. Nesse sentido, o especialista pediu aos governos que continuem protegendo a população mais vulnerável, principalmente.
A região Europa da OMS inclui 53 países. Em todos eles, as infecções dispararam devido à variante ômicron. Apesar dos números de contágio, vários países, como Dinamarca, Noruega, Suécia e França, reduziram suas restrições. Decisões que a OMS considera adequadas. “Penso que é possível responder às novas variantes, que inevitavelmente surgirão, sem repor o tipo de medidas de que precisávamos antes”, enfatizou o especialista.
Lockdown
Em meio às boas-novas, um estudo de pré-print ainda não revisado por pares causou polêmica no mundo científico ao afirmar que os lockdowns na primeira onda de covid-19, em 2020, reduziram a mortalidade pela doença em apenas 0,2% nos EUA e na Europa. “Embora essa meta-análise conclua que os bloqueios tiveram pouco ou nenhum efeito na saúde pública, eles impuseram enormes custos econômicos e sociais onde foram adotados”, escreveram os pesquisadores. “Em consequência, as políticas de lockdown são infundadas e devem ser rejeitadas como instrumento de política pandêmica.”
A pesquisa foi liderada por economistas — Steve Hanke, da Johns Hopkins, e Lars Jonung, da Universidade de Lund, na Dinamarca. Eles compilaram os dados de pesquisas norte-americanas e europeias sobre os efeitos do lockdown na mortalidade por covid para fazer a meta-análise.
Críticos do artigo apontaram falhas. Pelo menos dois estudos — um no Reino Unido — que detectaram quedas claras nas mortes por covid ao comparar a taxa diretamente antes e depois de um lockdown foram deixados de fora da meta-análise porque os pesquisadores alegaram que os resultados podem ter sido influenciados por “fatores dependentes do tempo”, como a sazonalidade. Outra pesquisa que ficou de fora indica que 3 milhões de vidas na Europa foram salvas devido aos bloqueios da primavera de 2020.
O trabalho feito pela Johns Hopkins também ignorou os estudos que analisaram os efeitos de lockdonwns precoces em países que conseguiram suprimir a covid e registrar taxas de mortalidade extremamente baixas durante a pandemia, por meio de bloqueios e controles de fronteira rígidos, como China, Austrália e Nova Zelândia.
“Fumar causa câncer, a terra é redonda e mandar as pessoas ficarem em casa (a definição correta de bloqueio) diminui a transmissão de doenças. Nenhum cientista tem dúvidas sobre isso”, criticou Seth Flaxman, professor de Ciência da Computação da Universidade de Oxford, no Reino Unido. “Um estudo que queira provar o contrário, provavelmente, é falho”, diz o cientista, autor de um artigo publicado na revista Nature sobre a quantidade de vidas salvas pelos bloqueios, que ficou de fora da meta-análise.