Aconchegados sob mantas e cobertores térmicos, dezenas de pacientes idosos tremem em seus leitos do lado de fora de um hospital em uma das comunidades mais pobres de Hong Kong, cujo sistema de saúde está lutando para combater uma onda de covid-19 impulsionada pela variante ômicron
"Chamamos de zona de febre", disse à AFP uma enfermeira com equipamento de proteção de corpo inteiro, que pediu para não ser identificada.
Hong Kong está enfrentando sua pior onda de coronavírus, e novas infecções levaram os hospitais da cidade à beira da sobrecarga.
Na segunda-feira, o hospital Caritas Medical Center, no distrito de Sham Shui Po, começou a montar tendas de isolamento do lado de fora, inicialmente com um paciente por tenda.
Mas na noite de quarta-feira, famílias inteiras lotavam a instalação, enquanto outros 50 pacientes definhavam no frio de fevereiro em macas do lado de fora do hospital.
"Alguns de meus colegas dizem que estamos em modo de guerra”, disse David Chan, enfermeiro de emergência da Caritas, que também preside a Hong Kong Hospital Authority Employees Alliance.
"Estamos preocupados que as condições dos pacientes piorem com o passar dos dias", disse à AFP, descrevendo a situação como "muito indesejável".
Idosos não vacinados
Como a China, Hong Kong segue uma estratégia de 'zero covid' que há muito tempo consegue evitar um surto de infecções, embora tenha deixado a cidade isolada do mundo.
Mas a ômicron expôs as fraquezas da estratégia e a ausência de um plano para lidar com uma onda de infecções.
Na quarta-feira, foi registrado um número recorde de 4.285 infecções confirmadas, com outras 7.000 preliminarmente positivas nesta cidade de 7,5 milhões.
Agora, especialistas alertam que em março podem chegar a 28.000 infecções diárias.
Os mais vulneráveis são os idosos de Hong Kong, os mais relutantes às vacinas.
Apesar da abundância de vacinas, apenas 43% das pessoas de 70 a 79 anos e 26% das pessoas com mais de 80 anos a receberam.
Na semana passada, o governo disse que pessoas com sintomas leves podem se auto-isolar em casa, mas na quarta-feira havia 12.000 pessoas aguardando hospitalização.
Sem plano
Em Caritas, o volume de pacientes deixou a equipe "exausta, estressada e desamparada", segundo Chan.
“É tão doloroso que trabalhamos sem parar e mesmo assim não conseguimos atender adequadamente cada paciente”, admitiu o enfermeiro, que acrescentou que a crise supera a enfrentada no início da pandemia.
"Dois anos depois, esperávamos que a Autoridade Hospitalar tivesse planos melhores, mas acontece que não", afirmou.
A chefe do governo local, Carrie Lam, descartou na terça-feira um confinamento total na cidade. Mas, no dia seguinte, jornais controlados por Pequim publicaram uma ordem do presidente Xi Jinping para que Hong Kong tomasse "todas as medidas necessárias" para controlar a situação.
O governo montou clínicas temporárias de covid e planeja construir um grande hospital de campanha. Também espera usar 3.000 apartamentos vagos e está procurando hotéis que possam receber pessoas que testarem positivo.
Profissionais de saúde alertaram que os hospitais públicos de Hong Kong carecem de financiamento e preparação adequados para um surto de covid.
Esse despreparo foi evidenciado por surtos anteriores de gripe, comentou Siddharth Sridhar, microbiologista da Universidade de Hong Kong, no Twitter.
"Agora, com uma doença mais grave/transmissível do que a gripe... os hospitais de Hong Kong são castelos de areia em um tsunami", afirmou.
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