Chile

Mulheres são maioria no gabinete do presidente eleito do Chile

Com 14 representantes do sexo feminino, entre os 24 integrantes, gabinete anunciado pelo presidente eleito, Gabriel Boric, é marcado pela diversidade. Analista político vê tentativa do futuro governo de recuperar espaço no Congresso e reduzir fraturas na esquerda

A 49 dias de ser empossado o presidente mais jovem da história do Chile, Gabriel Boric, 35 anos, surpreendeu, ontem, ao anunciar um gabinete marcado pela forte presença feminina e pela diversidade. Dos 24 ministros escolhidos pelo líder de centro-esquerda, 14 são mulheres e um terço é formado por independentes — principalmente nomes provenientes do meio acadêmico. "Nos acompanham nessa equipe de ministros e ministras pessoas de diversas origens e partidos; um gabinete diverso, um gabinete com maioria de mulheres (...), com presença de regiões, intergeracional, com pluralidade política, com diversos pontos de vista e com uma forte presença também de independentes e de militantes de partidos políticos", declarou Boric, durante a solenidade de apresentação do futuro gabinete, no pátio do Museu de História Nacional de Santiago do Chile. 

Entre as pastas mais importantes a serem ocupadas pelas mulheres, estão as do Interior (Izkia Siches), das Relações Exteriores (Antonia Urrejola), da Defesa (Maya Fernández) e das Mulheres e Igualdade de Gêneros (Antonia Orellana). Com a mesma idade de Boric, Siches também terá a missão de chefiar o gabinete. Ela é médica cirurgiã da Universidade do Chile e, em 2017, fez história ao se tornar a primeira mulher alçada à Presidência do Colégio Médico. Urrejola, 53 anos, é advogada e ex-presidente da Comissão Interamericana dos Direitos Humanos. Maya, 50, é neta do ex-presidente Salvador Allende, deposto em 1973 em um golpe que instituiu o general Augusto Pinochet no poder. A mais jovem dos ministros, Orellana, 32, é uma conhecida jornalista e feminista. 

Para Marcelo Mella, cientista político da Universidad de Santiago de Chile, o futuro gabinete pode ser interpretado como "um vinho" para os setores independentes da política. "A grande quantidade de mulheres e de ministros provenientes de distintas regiões do país busca ampliar as bases de respaldo social para o governo de Boric", admitiu. Ele também aposta que, com a indicação, o próximo presidente busca articular uma maioria política e remediar as divisões dos distintos espaços da esquerda chilena. Mella classifica o nome de Izkia Siches para o Ministério do Interior como um fato simbólico de alta relevância. "Pela primeira vez uma mulher ocupará essa pasta. Além disso, trata-se de uma política independente. Ela precisará do dobro de talento e de capacidade para enfrentar o restabelecimento da ordem pública e manter o apoio fundamental para a própria gestão", disse  o especialista ao Correio.

Uma das primeiras impressões de Mella sobre a configuração do gabinete envolve o fato de ser composto por integrantes da coalizão eleitoral de Boric, a Apruebo Dignidad. "Também está formado por ministros oriundos de partidos da antiga Concertación (aliança de partidos de esquerda, centro-esquerda e centro que governo ou Chile entre 1990 e 2010) e por outros que provêm de um mundo mais independente e acadêmico, sem filiação a partidos políticos", explicou Mella. "Em resumo, podemos destacar três origens do gabinete de Boric: uma independente e reconhecida pelas universidades; uma de centro-esquerda; e uma da coalizão Apruebo Dignidad."

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Respaldo

Mella acredita que a diversidade do futuro governo busca ampliar o respaldo parlamentar de Boric. "Com os resultados das eleições de novembro no Congresso Nacional, o presidente eleito contará apenas com 24% dos assentos da Câmara dos Deputados — muito distante da maioria simples e do quorum qualificado. A nomeação de ministros da centro-esquerda o aproximaria de 48% a 50% das cadeiras, se é que o gabinete pode manifestar apoio político no Congresso. É preciso lembrar que o fato de formar um gabiente de centro-esquerda não significa um apoio mecânico ao Legislativo, mas um sinal de entendimento e de convergência com setores moderados da centro-esquerda", comentou.

A escolha por Mario Marcel, ex-presidente do Banco Central, para o Ministério da Fazenda merece destaque. Mella lembra que Marcel é um político moderado, que conta com o respaldo das empresas privadas e do setor financeiro, além de prover da antiga Concertación. "É um bom sinal para o setor empresarial chileno, que esperava uma indicação de que as coisas não mudariam tão drasticamente."

EU ACHO...

"O simbolismo e o fato de compor um gabinete majoritariamente feminino guarda relação com a necessidade de se criar espaço para mulheres e outros grupos sociais, especialmente os indígenas, excluídos do processo político institucional. Os nomes apontados por Boric refletem essa ênfase, de abrir espaço para que as mulheres ocupem espaços de poder de primeira importância."

Marcelo Mella, cientista político da Universidad de Santiago de Chile

 

Quem é quem

Conheça os principais nomes que vão assessorar Boric durante o governo, a partir de março

Ministério do Interior: Izkia Siches 

Ministério das Relações Exteriores: Antonia Urrejola

Ministério da Defesa: Maya Fernández

Ministério da Fazenda: Mario Marcel

Ministério do Trabalho e da Previdência Social:
Jeannette Alejandra Jara Román

Ministério da Saúde: María Bergoña Yarza Saez

Ministério da Agricultura: Esteban Manuel Valenzuela Van Treek

Ministério da Mineração: Marcela Ximena Hernando Pérez

Ministério de Bens Nacionais: Javiera Alejandra Toro Cáceres

Ministério da Energia: Claudio Alberto Huepe Minoletti

Ministério do Meio Ambiente: Maisa Rojas Corradi

Ministério do Esporte: Alexandra Benaro Vergara

Ministério da Mulher e da Igualdade de Gênero:
Antonia Cósmica Orellana Guarello

Ministério da Habitação e Urbanismo: Carlos Eduardo Montes Cisternas

Ministério das Culturas, das Artes e do Patrimônio:
Julieta Brodsky Hernández

Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação:
Flavio Andrés Salazar Onfray

Secretaria Geral da Presidência: Camilla Valejos