As forças russas estão se preparando para uma guerra na Ucrânia nos próximos meses? Embora Moscou negue essa possibilidade, líderes ocidentais e políticos da própria Ucrânia têm se perguntado isso, com base em algumas movimentações.
A Ucrânia acusa a Rússia de despachar dezenas de milhares de soldados para a fronteira entre os dois países, no que seria um preparativo para uma invasão ou uma ação militar de grande escala. Já a Rússia diz que não planeja atacar o território ucraniano, mas sim garantir sua segurança - e acusa o vizinho (e os EUA) de estar adotando um comportamento desestabilizador na região.
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As tensões reverberam na Europa e no mundo, com o envolvimento da União Europeia e dos EUA nas conversas (veja mais detalhes abaixo) e com novas ameaças de sanções contra o governo russo.
A seguir, a BBC explica o que está acontecendo.
1. O que está por trás das tensões?
A Ucrânia faz fronteira com a Europa e a Rússia, mas, como ex-república soviética, tem profundos laços com a Rússia, inclusive com sua língua, já que o russo é amplamente falado por lá.
A Rússia há muito tem resistido à aproximação da Ucrânia de instituições europeias, e seu principal temor é que Kiev se junte à Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), a aliança militar ocidental.
Nesta sexta-feira (10/12), Moscou exigiu que a Otan rescinda um compromisso firmado em 2008 com Ucrânia e Geórgia (outro país próximo) que previa a filiação de ambos à organização. Além disso, a Rússia afirmou que a Otan tem de prometer não armar países fronteiriços que pudessem ameaçar a segurança russa.
A Ucrânia, por sua vez, pressiona por mais ajuda do Ocidente, dizendo que seria incapaz de conter por conta própria uma eventual ação militar russa.
"Infelizmente, a Ucrânia precisa ser objetiva à esta altura", disse o chefe do serviço de inteligência militar ucraniano, general Kyrylo O. Budanov, segundo reportagem do jornal The New York Times desta quinta (9/12). "Não temos recursos militares suficientes para repelir um ataque de larga escala russo sem o apoio de forças ocidentais."
A história recente dos dois países é de confronto.
Em 2014, os ucranianos depuseram seu presidente pró-russo. Na sequência, a Rússia conquistou e anexou o sul da península da Crimeia, pertencente à Ucrânia. Separatistas apoiados pela Rússia também conquistaram grandes áreas dos territórios orientais ucranianos, conhecidos como Donets.
2. Pode haver uma guerra em 2022?
Esse conflito no leste da Ucrânia persiste até hoje. O governo ucraniano diz que a Rússia tem enviado tanques e franco-atiradores para o front em áreas controladas pelos rebeldes. Mas são as supostas forças russas, com mais de 90.000 militares ao alcance da fronteira, que mais preocupam.
Imagens recentes de satélite mostram o aumento da presença de militares na Crimeia, não muito longe do leste da Ucrânia.
Mas não há sinais de invasão iminente ou ação do presidente russo Vladimir Putin que evidencie isso. O porta-voz do Kremlin pediu a todos que mantenham a "cabeça fria".
Entretanto, serviços de inteligência ocidentais, assim como os da Ucrânia, acham que isso pode acontecer em algum momento no início de 2022.
"O momento mais provável para se estar pronto para uma escalada (no conflito) será no final de janeiro", afirmou o ministro da Defesa ucraniano, Oleksiy Reznikov.
A inteligência dos EUA diz que em janeiro pode-se chegar a cerca de 175 mil militares mobilizados para ações na Ucrânia, e o diretor da CIA (serviço secreto americano), William Burns, acredita que o presidente Putin "está colocando os militares russos e os serviços de segurança russos em posições das quais possam agir de maneira bastante abrangente".
O mundo já testemunhou uma sequência parecida de acontecimentos em abril deste ano, mas na ocasião a Rússia minimizou suas ações e disse que estava realizando exercícios militares próximos à Ucrânia. Depois, recuou.
Na terça-feira (7), antes de uma videochamada de duas horas entre Putin e o presidente americano, Joe Biden, cinco líderes ocidentais apelaram a Moscou para "diminuir as tensões".
As tensões em torno da Ucrânia foram, por sinal, o tema central da conversa entre os dois mandatários.
"O presidente Biden expressou sua profunda preocupação com a escalada de forças ao redor da Ucrânia e deixou claro que os EUA e seus aliados responderiam com medidas econômicas e de outros tipos no caso de uma escalada militar", diz comunicado da Casa Branca. "Biden reiterou seu apoio à soberania ucraniana e pediu pela distensão e retorno à diplomacia."
A Europa também reagiu.
Nesta sexta, a presidente da Comissão Europeia (braço executivo da União Europeia), Ursula von der Leyen, afirmou que uma eventual ação russa na Ucrânia "terá seu preço" - embora não tenha deixado claro que tipo de resposta ou sanção aplicaria a Moscou.
3. O que a Rússia diz?
A Rússia descreveu inicialmente as fotos de satélite mostrando a maior presença militar na Crimeia como alarmistas. Porém, no início de dezembro, um assessor presidencial defendeu que o país tem "o direito de mover tropas em nosso território" e negou que se trate de uma escalada nas tensões.
Moscou também acusou a Ucrânia de aumentar o tamanho de suas tropas e de planejar atacar áreas controladas por separatistas apoiados pela Rússia.
A Ucrânia diz que as acusações são um "absurdo da propaganda" russa para encobrir os planos de Moscou.
Eventualmente, essas acusações podem se tornar justificativas para uma ação militar russa.
Vladimir Dzhabarov, do comitê de assuntos internacionais do Conselho da Federação da Rússia, disse no início de dezembro que meio milhão de ucranianos nas áreas controladas pelos rebeldes agora têm passaportes russos.
Ele colocou que, se os líderes rebeldes pedirem ajuda russa, "é claro" que Moscou a fornecerá.
"Não podemos abandonar nossos compatriotas", disse Dzhabarov.
4. O que a Rússia quer?
Vladimir Putin advertiu o Ocidente para não cruzar as "linhas vermelhas" russas na Ucrânia.
Então, quais são essas linhas vermelhas?
Uma delas é impedir a expansão da Otan em direção ao leste e a distribuição de armas em países vizinhos que possam ser uma ameaça à Rússia. Há uma hostilidade particular em relação a exercícios militares de países ocidentais no Mar Negro e ao uso de drones turcos pela Ucrânia em áreas onde atuam rebeldes apoiados por Moscou.
No final de novembro, Putin afirmou esperar que "o bom senso e a responsabilidade por seus próprios países e pela comunidade global acabem prevalecendo".
Em julho de 2021, o presidente russo publicou um longo texto no site do Kremlin detalhando a história das duas nações e rotulando os atuais líderes da Ucrânia como condutores de um "projeto anti-russo". Segundo defendeu Putin, aqueles que colocarem a Ucrânia contra a Rússia "destruirão seu próprio país".
A Rússia também está frustrada porque o acordo de paz de Minsk de 2015, cujo objetivo era interromper o conflito na Ucrânia, está longe de ser cumprido. Ainda não há acordos firmados para a realização de eleições monitoradas por organizações independentes nas regiões separatistas.
5. Como a Otan está ajudando a Ucrânia?
A aliança militar ocidental da Otan tem uma função defensiva e, segundo seu secretário-geral, Jens Stoltenberg, qualquer apoio militar segue puramente esse dever.
O Reino Unido, particularmente, deve ajudar a Ucrânia a construir duas bases navais, em Ochakiv e em Berdyansk. Os EUA também entregaram às forças ucranianas mísseis antitanque Javelin e dois barcos de patrulha da Guarda Costeira americana.
"Depende da Ucrânia e de nossos 30 aliados decidir quando a Ucrânia está pronta para se juntar à aliança", disse Stoltenberg, acrescentando que a Rússia "não tem poder de veto" e nem "o direito de interferir nesse processo".
6. Até onde o Ocidente irá em prol da Ucrânia?
Os EUA deixaram claro que estão empenhados em ajudar a Ucrânia a defender seu "território soberano", mas Biden indicou que uma ação militar não é uma opção por enquanto.
Nesse caso, mesmo que os EUA se recusem a respeitar as "linhas vermelhas" colocadas pela Rússia, até onde irão para ajudar Kiev?
A principal ferramenta no arsenal do Ocidente parecem ser as sanções. Biden falou de "custos muito reais" se a Rússia tomar uma ação militar, e fontes do governo americano estão considerando que elas podem significar medidas econômicas e apoio a militares ucranianos.
A ministra das Relações Exteriores do Reino Unido, Vicky Ford, também disse que as autoridades britânicas estão avaliando uma extensão do apoio defensivo.
Quanto às medidas econômicas, uma ferramenta poderosa é a desconexão do sistema bancário russo do sistema internacional de pagamentos Swift. Isso sempre foi visto como um último recurso.
Outros cenários possíveis seriam a suspensão da abertura do gasoduto russo Nord Stream 2 na Alemanha, medidas que impactem o RDIF (fundo soberano da Rússia) ou restrições à conversão de rublos em moeda estrangeira pelos bancos.
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