Uma novela que se arrasta há dois anos caminha para um desfecho desfavorável para Julian Assange, fundador do site WikiLeaks. O governo dos Estados Unidos conseguiu uma vitória importante na tentativa de extraditar o austaliano de 50 anos, preso em Londres desde sua detenção na Embaixada do Equador, em 2019. Um tribunal de apelações do Reino Unido anulou a decisão prévia de não entregar Assange.
Washington deseja julgar o fundador do WikiLeaks pela publicação, a partir de 2010, de quase 700 mil documentos diplomáticos e militares secretos, relacionados, principalmente, com as guerras lideradas pelos Estados Unidos no Afeganistão e Iraque. Na primeira instância, a juíza Vanessa Baraitser bloqueou a extradição, em janeiro, por considerar que Assange, com uma saúde mental considerada frágil, poderia cometer suicídio se fosse entregue ao sistema judicial dos Estados Unidos.
No entanto, os advogados do governo norte-americano recorreram da decisão e, nove meses depois, alegaram que a magistrada não atribuiu importância suficiente a outros depoimentos de especialistas sobre o estado psicológico do detido. Eles garantiram que o austaliano não seria mantido em isolamento punitivo em uma penitenciária federal de segurança máxima e que receberia o tratamento médico adequado.
Ontem, o tribunal de apelações de Londres deu razão a Washington e anulou a sentença prévia, por considerar que o governo dos Estados Unidos "apresentou ao Reino Unido um pacote de garantias" e destacando que aceitaria uma transferência de Assange para a Austrália em caso de condenação. Desta maneira, o tribunal ordenou que, sem mais exames, o caso seja enviado ao Ministério do Interior, que tem a última palavra sobre qualquer extradição.
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Recursos
A batalha legal deve se arrastar por um tempo. Os advogados de Assange anunciaram uma apelação ao Tribunal Supremo britânico e a Cortes internacionais, se for necessário. "Vamos esgotar todos os recursos nacionais e internacionais para defender aquele que não cometeu nenhum crime e tem resistido heroicamente, e com coragem, por mais de 11 anos à perseguição por defender a liberdade de expressão e o acesso à informação", disse o ex-juiz espanhol Baltasar Garzón, coordenador internacional da defesa de Assange.
Na saída do tribunal, a noiva de Assange, a advogada sul-africana Stella Moris, denunciou o "cinismo" de "ter um dos principais jornalistas dos últimos 50 anos em uma prisão britânica acusado de publicar a verdade sobre crimes de guerra, sobre os assassinatos da CIA".
A organização não governamental de defesa dos direitos humanos Anistia Internacional questionou as garantias de Washington, que chamou de "intrinsecamente pouco confiáveis". A Repórteres Sem Fronteiras (RSF) criticou uma decisão com "perigosas consequências para o futuro (...) da liberdade de imprensa no mundo". Em um contexto de crescente tensão diplomática com o Ocidente, o governo russo chamou a decisão britânica de "vergonhosa".
O processo de Assange virou uma causa para os defensores da liberdade de expressão. Seus partidários alegam que o WikiLeaks tem os mesmos direitos que outros meios de comunicação a publicar material confidencial, desde que seja de interesse público. Mas o governo americano, que apresentou 18 acusações — que incluem espionagem — , afirma que Assange não é jornalista e sim um hacker. Além disso, alega que a divulgação de documentos sem filtro colocou em perigo a vida de seus informantes. Em caso de extradição, ele pode ser condenado ao máximo de 175 anos de prisão.