A ONU identificou "graves violações" dos direitos humanos por agentes estatais nos protestos ocorridos este ano na Colômbia, que incluem o homicídio de pelo menos 28 civis, segundo um relatório publicado nesta quarta-feira (15) pelo Alto Comissariado de Direitos Humanos da organização (Acnudh).
Em um documento de 63 páginas, a delegação do Acnudh na Colômbia cita "razões fundamentadas" para sustentar que as autoridades incorreram no "uso desnecessário ou desproporcional da força" nas mobilizações de 28 de abril a 31 de julho.
A ação abusiva de efetivos estatais derivou em homicídios, detenções arbitrárias, violência sexual e de gênero, e atos de discriminação e racismo.
A partir de entrevistas, verificação forense de vídeos e consulta comparada de fontes, o Acnudh verificou 46 mortes: 44 civis e dois policiais.
"Em pelo menos 28 casos os supostos responsáveis seriam membros da Força Pública" e em "10 seriam atores não estatais", segundo o relatório. Nos outros casos, segundo o Acnudh, não foi possível identificar o suposto agressor.
Por outro lado, o Ministério Público colombiano fala de 29 homicídios relacionados com a agitação social que se seguiu às também numerosas mobilizações de 2019 e 2020, esta última contra a violência policial
No entanto, foi apenas em abril que se configurou um inédito movimento nacional de protesto, em sua maioria pacífico, que se estendeu por meses e envolveu as principais cidades do país.
Centenas de milhares de pessoas saíram às ruas todos os dias em protesto contra o aumento de impostos proposto pelo governo para enfrentar a crise gerada pela pandemia. Contudo, o Executivo acabou desistindo da ideia diante da pressão popular.
A mobilização, liderada por jovens sem oportunidades de emprego e estudos, deixou à mostra a crise social e econômica que foi acentuada pela emergência sanitária em um dos países mais desiguais do mundo e com uma informalidade que gira em torno de 50% dos trabalhadores.
Duramente reprimidas, as manifestações que pediam um Estado mais solidário se tornaram violentas e incorporaram as demandas por uma reforma da polícia.
Governo inconformado
Visivelmente incomodado, o governo conservador de Iván Duque afirmou que não concorda com "muitas das afirmações" contidas na investigação da ONU.
"Não podemos permitir, de nenhuma maneira, que venham desqualificar a institucionalidade e o Estado de Direito", disse a vice-presidente e chanceler, Marta Lucía Ramírez, em entrevista à emissora Blu Radio.
Em seu relatório, o Acnudh também assinalou que, entre os abusos que pôde verificar, estão os de "16 vítimas de violência sexual" cometida por agentespúblicos.
Por outro lado, a organização também documentou "graves ações de violência" contra agentes estatais e a destruição de bens públicos e privados.
"O Alto Comissariado teve conhecimento de algumas situações de bloqueios e fechamentos de estradas que afetaram negativamente ou impediram o exercício e o gozo dos direitos humanos", afirmou.
A partir de suas descobertas, a organização formulou várias recomendações ao Estado colombiano, entre elas "uma transformação profunda" do Esmad, a força policial encarregada do controle e da dispersão dos protestos.
Segundo o Alto Comissariado das Nações Unidas, as autoridades devem revisar os protocolos seguidos por esse corpo policial sobre "o uso da força e das armas e munições menos letais para que cumpram com as normas e padrões internacionais de direitos humanos".
Além disso, "é necessário promover um debate amplo na sociedade sobre a reforma da Polícia Nacional, incluindo os mecanismos de controle e de prestação de contas" e a "pertinência" de que sua vinculação passe do "Ministério da Defesa para uma pasta de autoridade civil".
Por sua vez, a vice-presidente Ramírez insistiu em seu repúdio, alegando que relatórios como o da ONU "causam uma desconfiança geral nas instituições" e destacando que o governo tem "tolerância zero com a violação" das garantias fundamentais.
A Comissão Interamericana de Direitos Humanos já havia denunciado em julho a reação "desproporcional" das forças estatais com os manifestantes.
Na última segunda-feira, também foi apresentado um relatório independente, realizado a pedido da Prefeitura de Bogotá, no qual a polícia é acusada de ter cometido "um massacre" em setembro de 2020. Na época, 11 jovens morreram pelas mãos das forças públicas durante os protestos contra a violência policial na cidade, segundo a investigação.
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