Nicolas REVISE, AFP
"Simplesmente, queria ajudar!". Quando soube, "horrorizado", da queda de Cabul, em 15 de agosto, em mãos talibãs, o "influencer" do Instagram Tommy Marcus ignorava que ex-combatentes americanos queriam ajudar milhares de afegãos aterrorizados.
As imagens de afegãos pendurados em um avião americano decolando do aeroporto de Cabul chocaram este nova-iorquino de 26 anos, conhecido por seus 800 mil assinantes pelo pseudônimo de "Quentin Quarantino", graças a seus memes a favor das vacinas, do aborto ou contra Donald Trump.
Com alguns cliques em sua conta do instagram, ele ativou o que se transformaria em uma operação atípica de retirada de centenas de afegãos: em três dias, ele arrecadou US$ 7,2 milhões e incorporou em seu projeto militares reformados e ex-diplomatas, especialistas em direito de asilo, ajuda humanitária ou em transporte aéreo em zonas de guerra.
Um cenário digno de Hollywood, onde se juntam o poder das redes sociais, a arrecadação relâmpago de recursos, por meio de financiamento participativo, e a eficiência logística dos americanos.
A AFP coletou os testemunhos dos atores desta operação denominada "Flyaway", lançada em 17 de agosto e ainda em vigor; consultou mensagens de afegãos - mulheres, crianças, LGBTs, trabalhadores sociais, jornalistas, intérpretes - que suplicam para deixar o país; e recebeu documentos que confirmam o "resgate direto" de 565 afegãos em aeronaves fretadas. Alguns estão em trânsito e outros já chegaram aos Estados Unidos.
"Poder" do instagram
"Vi a queda de Cabul, com horror e asco. Simplesmente queria ajudar", disse Marcus, um empresário e influenciador digital, à AFP, que afirma viver de suas intervenções no instagram do Brooklyn e de Nova Jersey.
Consciente do "poder da (sua) plataforma", alertou seus assinantes.
Em minutos, "milhares e milhares" de respostas chegaram, incluindo a de um seguidor que garantiu estar "em contato com um grupo que tinha acabado de levar 100 pessoas para a França e que precisava de dinheiro", segundo Marcus.
Sua conta na rede se encheu de mensagens e de fotos insuportáveis, pedindo-lhe que fizesse algo. "Em nome da humanidade e da justiça, aceite-me como refugiada em um país seguro!", implorou uma mulher. Outra pessoa pediu, com "grande dor", que tirasse sua filha de lá, apavorada com o retorno dos talibãs.
Inundado de pedidos de ajuda, Marcus recorreu aos seus seguidores, solicitando-lhes que o ajudassem a levantar "pelo menos meio milhão de dólares em 24 horas". Recebeu, disse ele, "um milhão em duas horas (...), 5 milhões em 24 horas (...) e 7 milhões em três dias".
"Pacifista de esquerda"
Diante do "fluxo louco de dinheiro", este "pacifista de esquerda" começou a procurar profissionais de zonas de guerra. Foi contactado pela Raven Advisory, um escritório de serviços de segurança formado por ex-funcionários do Pentágono e da CIA, a Agência Central de Inteligência dos EUA.
A eles, somou-se a experiência de Karen Kraft, uma ex-oficial na reserva do Exército de Terra que virou produtora de televisão e dirige uma associação de ex-combatentes.
Liderados pelo novato Marcus, "todos nós sentimos a mesma necessidade de fazer algo", diz Kraft.
"Foi a coisa mais pura que já fiz", exclama Jason Hatch, um veterano das Forças Armadas e da diplomacia, encarregado de compilar listas e encontrar documentos para afegãos em trânsito nos Emirados Árabes Unidos, Catar, Kosovo, Uganda e Albânia.
O orçamento global da operação detalha que o custo dos voos foi de US$ 4,79 milhões, que é distribuído entre várias empresas de fretamento, como a egípcia Mayfair, ou Kiwijet, do empresário neozelandês Nicolas Steele.
Atentado suicida
Os organizadores do "Flyaway" lamentam que, no contexto da retirada caótica do Afeganistão, o atentado suicida cometido pelo grupo Estado Islâmico no aeroporto de Cabul, em 26 de agosto, com mais de 100 mortos, incluindo 13 militares americanos, "tenha congelado completamente" as retiradas.
Os voos foram cancelados, apesar de já estarem pagos, devido à deterioração da segurança e ao aumento das apólices de seguros.
Segundo Kraft, há dois novos aviões com capacidade para 600 passageiros prontos para decolar a qualquer momento, um deles, da Kiwijet.
Os US$ 7,2 milhões - 123.000 pessoas doaram uma média de US$ 59 - e o desbloqueio dos fundos foram administrados pelo GoFundMe, que garantiu à AFP que a "Flyaway" cumpriu as regras financeiras e internacionais de controle e de segurança.
Os Departamentos americanos da Defesa e de Estado não se manifestaram sobre a operação. o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR) também não se manifestou.
Em privado, seus críticos afirmam que as centenas de pessoas socorridas são uma gota d'água em relação aos 123 mil retirados pelo governo americano e por outros Estados.
Então, "por que valeu a pena?", parece se perguntar Enrique Herrera, veterano da Força Aérea que participou da operação:" porque se trata de vidas humanas".
Como a de Somayah, de 21 anos, cujo pai foi assassinado pelos talibãs. Ela foi embarcada em 21 de setembro rumo aos Estados Unidos, país que ela espera transformar em "sua nova pátria".
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