O general sudanês Abdel Fattah al Burhan dissolveu, nesta segunda-feira (25), o governo de transição do país, cujos membros civis foram quase todos detidos, e decretou estado de emergência, em uma jornada que já registrou feridos entre os manifestantes pró-democracia que saíram às ruas.
Desde o início da manhã, o "golpe de Estado" denunciado pela comunidade internacional acontece por etapas. O primeiro-ministro Abdallah Hamdok, sua esposa, vários ministros e todos os membros civis do Conselho Soberano - maior autoridade da transição - foram detidos.
A televisão estatal está sob poder dos militares e, no meio da manhã, o general Abdel Fattah al Burhan deu uma declaração.
Apesar de repetir que deseja uma "transição civil e eleições livres em 2023", após 30 anos de ditadura de Omar al Bashir, o general afastou de suas funções todas as autoridades civis.
O governo está dissolvido, incluindo o Conselho Soberano, afirmou. Prefeitos e ministros estão destituídos, e o estado de emergência vigora em todo país, completou.
Antes mesmo do discurso do militar, milhares de manifestantes saíram às ruas. Diante da sede do Exército, no centro de Cartum, protegido por soldados há vários dias, 12 manifestantes ficaram feridos por tiros de militares, de acordo com um sindicato de médicos e o Ministério da Informação.
"Proteger a revolução"
O gabinete do primeiro-ministro Abdallah Hamdok havia convocado "protestos contra o golpe de Estado para proteger a revolução" de 2019 - movimento que derrubou Bashir.
Temendo pela vida de Hamdok, detido em um local não identificado, seu gabinete advertiu que as autoridades militares têm "toda responsabilidade sobre sua vida, ou morte", em um país que registrou uma tentativa de golpe no mês passado.
"Peço às Forças Armadas que libertem imediatamente os detidos", declarou o enviado da ONU para o Sudão, Volker Perthes, que considerou as detenções "inaceitáveis".
O governo dos Estados Unidos, cujo enviado Jeffrey Feltman visitou no domingo (24) o gabinete de Hamdok, advertiu que "qualquer mudança de governo de transição coloca a ajuda americana em perigo".
A Liga Árabe também manifestou "profunda preocupação" e pediu a todas as partes que respeitem o acordo de divisão do poder.
Diante dos apelos, o general Burhan disse que o país respeitará os acordos internacionais assinados. O Sudão é um dos quatro países árabes que normalizaram, recentemente, as relações com Israel.
De novo nas ruas
Nas ruas de Cartum, onde o serviço de telecomunicação é cada vez mais inconstante, muitos sudaneses protestaram e vaiaram o general Burhan.
"Não aceitaremos um regime militar. Estamos dispostos a dar nossas vidas pela transição democrática", declarou à AFP um deles, Haitham Mohamed.
"Não vamos abandonar as ruas antes do retorno do governo civil", afirmou Sawsan Bachir.
O Sudão enfrenta uma transição política precária, marcada por divisões e por lutas de poder desde a queda de Bashir em abril de 2019.
Desde agosto, o país está sob o comando de uma administração cívico-militar, responsável por conduzir o país para uma transição democrática plena sob gestão civil. O objetivo é organizar, no fim de 2023, as primeiras eleições livres no país em três décadas.
Nos últimos dias, porém, a tensão aumentou entre os dois lados. Em 21 de outubro, dezenas de milhares de sudaneses participaram de passeatas em várias cidades para apoiar a transição de poder para os civis e contra-atacar uma "manifestação" iniciada dias antes, diante do palácio presidencial de Cartum, para exigir a volta do "governo militar".