Rússia, China e Irã pediram nesta quarta-feira (20) para trabalhar com o novo governo talibã no Afeganistão para garantir a "estabilidade" da região, ameaçada pela atividade de grupos jihadistas e pelo risco de uma grave crise humanitária.
Uma delegação do Talibã está em Moscou para as primeiras negociações internacionais desde que o grupo assumiu o poder em agosto deste ano.
Uma dezena de países participa das discussões, incluindo China, Irã, Paquistão e países da Ásia Central, mas não os Estados Unidos.
Em uma declaração conjunta, os países participantes expressaram sua vontade de cooperar com o regime talibã em questões de segurança para "contribuir para a estabilidade regional", dada a ameaça de "organizações terroristas" que pesa sobre o novo regime em Cabul.
"Qualquer compromisso futuro com o Afeganistão exige que se leve em consideração a nova realidade, a chegada ao poder dos talibãs", afirmaram no comunicado conjunto.
O Afeganistão, exausto após décadas de guerra, enfrenta a dupla ameaça de uma grave crise humanitária e de segurança diante da atividade de grupos jihadistas, após a retirada das tropas americanas em agosto.
Conferência de doadores
Moscou, Pequim e Teerã exigiram que os insurgentes afegãos apliquem "políticas moderadas", tanto em casa quanto no exterior.
Eles também pediram que os novos líderes em Cabul adotem "políticas favoráveis aos países vizinhos do Afeganistão e trabalhem em prol da paz sustentável e da segurança e prosperidade a longo prazo".
Além disso, reivindicaram a organização por parte da ONU de "uma conferência internacional de doadores" para evitar uma grave crise humanitária.
Segundo eles, o "peso" da reconstrução econômica deve recair sobre "os atores que estiveram no país durante os últimos 20 anos", em uma referência clara aos países ocidentais que intervieram no conflito.
Sujeito a sanções internacionais, o Talibã não tem fundos para alimentar os bancos ou pagar salários.
Em outro comunicado, a diplomacia russa insistiu em seu pedido de formação de um governo "inclusivo" em Cabul, envolvendo outras tendências políticas além dos insurgentes.
O enviado do Kremlin para o Afeganistão, Zamir Kabulov, exortou o Talibã a cumprir seus compromissos de respeito aos direitos humanos e ao pluralismo político, com vistas a um eventual reconhecimento por parte da comunidade internacional.
A delegação afegã foi informada de que o reconhecimento "virá apenas se começar a responder à maioria das expectativas da comunidade internacional em relação aos direitos humanos e à representatividade" do regime, disse Zamir Kabulov a jornalistas.
No início das discussões em Moscou, o chefe da delegação talibã, o vice-primeiro-ministro Abdul Salam Hanafi, declarou que seu governo "já é representativo".
Em outra declaração, Hanafi exortou a comunidade internacional a reconhecer o poder do Talibã e argumentou que "o isolamento do Afeganistão não é mais do interesse de nenhum lado".
Temores de Moscou
No início das negociações, o ministro russo das Relações Exteriores, Sergei Lavrov, destacou que "vários grupos terroristas, em primeiro lugar o Estado Islâmico e a Al-Qaeda, buscam tirar vantagem" da instabilidade do país.
"Há um risco real de que as atividades terroristas e o tráfico de drogas [...] se espalhem para os territórios dos países vizinhos", acrescentou.
As ex-repúblicas soviéticas (Tadjiquistão, Uzbequistão, Quirguistão e Turcomenistão) são aliadas próximas de Moscou.
"Reconhecemos os esforços lançados para estabilizar a situação política e militar", enfatizou Lavrov.
O Talibã vê a reunião como um reforço da "estatura" do novo governo afegão, segundo Zabihullah Mujahid.
Para a Rússia, entretanto, representa uma oportunidade de fortalecer sua posição como potência regional na Ásia Central. Seu objetivo é estabilizar a situação política e militar, com um governo "inclusivo" que apazigue os grupos jihadistas.
Desde o seu retorno ao poder em agosto, o Talibã tem enfrentado a ameaça de grupos ainda mais radicais, principalmente o Estado Islâmico-Khorasan (EI-K), que cometeu vários ataques mortais.
A situação atual não é estranha para a Rússia, após a invasão soviética de 1979 a 1989, que marcou o início de décadas de guerras no Afeganistão.
Russos, turcos, iranianos, europeus - todos querem evitar uma crise de refugiados. Lavrov indicou na quarta-feira que os jihadistas poderiam "se esconder nos fluxos migratórios".
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