Del Rio, sudoeste do Texas, cidade de 35 mil habitantes situada na fronteira sul dos Estados Unidos. Mais de 12 mil imigrantes não documentados estão acampados sob a Ponte Internacional, depois de atravessarem o Río Grande. “Eles são principalmente do Haiti. (…) Apenas estão esperando serem detidos pelos guardas fronteiriços” para começarem os trâmites de autorização de permanência, explicou o prefeito Bruno Lozano, em vídeo publicado em seu perfil no Twitter. “Precisamos de uma ação rápida do governo (dos EUA)”, acrescentou, antes de decretar estado de emergência.
A crise humanitária aumentou a pressão sobre o presidente norte-americano, Joe Biden. Até o fechamento desta edição, o democrata não tinha se pronunciado diretamente sobre a situação em Del Río. Biden apenas publicou um vídeo alusivo ao Dia da Cidadania. “Os imigrantes vêm para a América por diferentes circunstâncias, mas cada geração nos tornou mais fortes. Este Dia da Cidadania serve como lembrete de que cabe a nós garantir que continuemos um país digno dos sonhos e das aspirações dos imigrantes de todo o mundo”, declarou na gravação.
O senador republicano Ted Cruz usou um filmagem dos imigrantes amontoados sob a ponte. “Isso é o que Joe Biden e seu governo não querem que você veja”, escreveu. O Escritório de Alfândega e Proteção das Fronteiras dos Estados Unidos (CBP, em inglês) explicou que reforçou sua equipe para enfrentar a situação de forma “segura, humana e ordeira” e que providenciou água potável, toalhas e banheiros químicos.
A 1,8 mil quilômetros de Del Rio, em Tapachula — estado mexicano de Chiapas —, cerca de 40 mil centro-americanos e haitianos vivem em uma espécie de prisão. Por telefone, o Correio falou com Nadissa Demea, 25 anos, que chegou à cidade de 350 mil habitantes em julho passado, deixando em Cabo Haitiano um filho de 2 anos. “Estou aqui há dois meses, sem trabalho, sem nada. Vim para cá com o meu irmão. Muitos de nós estamos dormindo ao relento. Algumas famílias mexicanas também ajudam e cedem quartos. Há casos de até oito estrangeiros dividindo um quarto pequeno”, relatou.
Ele afirmou querer chegar aos Estados Unidos e arrumar um emprego. “O problema, aqui, é que, se entramos em um ônibus para seguir viagem, a Imigração para o veículo e nos devolve para Tapachula”, lamentou. “Se houver oportunidade, entro nos EUA. Mas, se Deus me ajudar, fico aqui, no México, mesmo”, acrescentou Nadissa.
Professor de história e especialista em imigração pela Universidade de Kentucky (EUA), Eladio Bobadilla disse ao Correio que a restrição aos estrangeiros não documentados estava no coração da ascensão de Trump ao poder e de sua própria presidência. “Biden prometeu uma abordagem mais humana, mas, até agora, decepcionou os ativistas dos diretos dos imigrantes. Eles veem suas políticas como insuficientemente diferentes das de Trump. Quando a vice-presidente, Kamala Harris, advertiu os guatemaltecos para que não viessem aos EUA neste verão, o que defensores de imigração escutaram foram ecos de Trump no novo governo”, explicou.
De acordo com Bobadilla, havia uma expectativa, por parte dos defensores dos direitos de imigração e dos progressistas, de que a atual gestão democrata apresentaria uma postura mais branda. “Sugerir que as plataformas de imigração das duas gestões (Biden e Trump) são indistinguíveis, como alguns têm feito, não é totalmente justo. Atualmente, os democratas trabalham para aprovar uma legislação que tornais mais fácil para milhões de não documentados nos EUA ajustarem seu status e obterem residência permanente. Mas isso encontrará ferrenha oposição dos republicanos”, avaliou. O especialista acredita que será interessante observar até que ponto os democratas estarão dispostos a pressionar os republicanos a aprovarem uma significativa reforma migratória.
Saiba Mais
» Eu acho...
“O presidente Joe Biden precisará levar em conta as políticas da era Trump e decidir se o seu governo deseja manter a linha dura restritiva de seu antecessor ou seguir um caminho mais humano, mesmo que isso arrisque atrair a ira dos republicanos anti-imigração.” Eladio Bobadilla, professor de história e especialista em imigração pela Universidade de Kentucky (EUA).