ATAQUES DE 11 DE SETEMBRO

11 de setembro: a ameaça do terror persiste 20 anos depois do atentado

Duas décadas depois dos atentados contra o World Trade Center e o Pentágono, o jihadismo se espalha pelo planeta, encontra abrigo na África e fortalece o Estado Islâmico. Especialistas e sobreviventes falam sobre risco do terror

Há 20 anos, o mundo assistia, atormentado, ao maior atentado da história. Hoje, o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, e a vice, Kamala Harris, se unirão aos familiares dos 2.997 mortos. Os nomes de todas as vítimas serão lidos. Durante as cerimônias, em Nova York, em Washington e em Shanksville (Pensilvânia), será observado um minuto de silêncio em seis momentos — às 8h46 (9h46 em Brasília), quando o primeiro avião colidiu com a Torre Norte do World Trade Center; às 9h03, hora em que segundo avião atingiu a Torre Sul; às 9h37, quando o Pentágono foi atacado; às 9h58 e às 10h28, para marcar respectivamente, os desabamentos da Torre Sul e da Torre Norte; e às 10h03, instante em que o terceiro avião caiu em Shanksville, na Pensilvânia.

Osama bin Laden, o extremista mais procurado do mundo e mentor do ataque, foi abatido pelas forças especiais dos EUA em 2011, e sua rede Al-Qaeda perdeu força. No entanto, o terrorismo espalhou os tentáculos, ao se aproveitar da fragilidade da democracia e da ideologia virulenta. Para especialistas consultados pelo Correio, a ameaça persiste.

Estudioso do Centro Internacional para o Estudo de Radicalização do King’s College London, Tore Hamming admite que, até 2001, o jihadismo — a luta para restaurar o domínio de Alá sobre a Terra e defender a umma (comunidade muçulmana) dos kafir (infiéis ou apóstatas) — estava praticamente isolado ao Afeganistão, após campanhas fracassadas no Egito e na Argélia. “Apesar da forte pressão contra o terrorismo, os jihadistas conseguiram tirar vantagem de conflitos locais para se espalharem geograficamente e engrossarem seus contingentes. Isso implica que, ao longo dos anos, eles instigaram insurgências em vários países do Oriente Médio, o que certamente amplificou a ameaça representada a estes regimes”, afirma.

Hamming aponta o Daesh (acrônimo em árabe para Estado Islâmico) como a maior ameaça terrorista atual, mas adverte sobre a metastização do jihadismo. “A partir de 2013, o Levante (região formada por Síria e Iraque) tornou-se o hotspot global da jihad. Com o colapso do califado do Estado Islâmico e a obliteração da Al-Qaeda na Síria, vimos uma mudança na atividade terrorista em direção à África”, explica.

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Migração

Segundo ele, o jihadismo migrou para o Sahel — região que abrange 10 países e vai do oeste ao leste do continente, abaixo do Deserto do Saara —, para a Nigéria e para a Somália. Nestes dois países, existem insurgências bastante ativas, o Boko Haram e o Al-Shabaab. “Os jihadistas têm sido bons em mobilizar simpatizantes. Por algumas décadas, têm sido a ideologia revolucionária dominante”, afirma o especialista de Londres.

Para o cingalês Rohan Kumar Gunaratna, autor de Inside Al-Qaeda: Global network of terror (“Por dentro da Al-Qaeda: Rede global de terror”, pela tradução livre), a ameaça da jihad global se coloca como a maior ameaça à segurança do planeta. “Apesar da guerra ao terror conduzida pelos EUA, o movimento jihadista cresceu de forma significativa. A estratégia de utilizar 90% de força local e 10% de engajamento da comunidade precisa ser revertida”, aconselha.

Ele diz que o wahhabismo salafista (movimento sunita ultraconservador e fundamentalista), o qutbismo (ideologia que prega a jihad ofensiva) e ideologias similares têm segregado muçulmanos de não muçulmanos. “As respectivas ideologias que impulsionam os exclusivistas, os extremistas e os terroristas precisam ser contidas, isoladas e eliminadas”, recomenda o escritor.

Gunaratna classifica a posição da Al-Qaeda como “estratégica”, por ela ter criado dezenas de grupos, incluindo o Daesh. “A Al-Qaeda, o Estado Islâmico e grupos afiliados representam a maior ameaça terrorista. Enquanto a comunidade internacional caçar os extremistas, os ataques poderão ser frustrados.”

Kayla Bergeron, 58 anos, uma das sobreviventes do 68º andar da Torre Norte do World Trade Center, afirma ao Correio que todos os países precisam se unir e rejeitar o terrorismo. Ela não pretende ir hoje ao Marco Zero, em Nova York. “Eu tinha planejado viajar a Nova York, mas não quero ouvir os políticos dizerem ‘Nunca nos esquecemos’, quando, de fato, há centenas de sobreviventes com distúrbios mentais que não tiveram ajuda. Na manhã deste sábado, conversarei por telefone com ex-colegas da Autoridade Portuária de Nova York e Nova Jersey, que estavam comigo naquele 11 de setembro de 2001.”

Artie Van Why, 68, funcionário de uma firma de advocacia em frente às Torres Gêmeas e também sobrevivente, admite que a ameaça é constante nos EUA. “Se o 11 de Setembro nos ensinou algo, foi que somos vulneráveis. Não podemos garantir, com segurança, que algo assim nunca mais ocorrerá”, diz ao Correio. “Aquela terça-feira foi o último dia da minha vida como eu a conhecia. 11 de Setembro é o dia em que tudo mudou. Eu me tornei uma pessoa diferente.”

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Por Tore Hamming

Al-Qaeda tem outras prioridades

“O Estado Islâmico (EI) continua a representar a maior ameaça terrorista. Desde 11 de setembro de 2001, a rede Al-Qaeda orquestrou, instruiu ou inspirou poucos ataques ao Ocidente, enquanto o EI esteve por trás da onda de ataques entre 2014 e 2017 (Paris, 130 mortos; Nice, 86; Bruxelas, 32; Manchester, 22). Para a Al-Qaeda, um novo 11 de Setembro não é o objetivo. O grupo tem outras prioridades. Um ataque em larga escala contra o Ocidente seria contraproducente para o seu projeto.”

Especialista do Centro Internacional para o Estudo da Radicalização do King´s College


Por Rohan Kumar Gunaratna

O Ocidente como alvo

“Os interesses ocidentais ainda são o alvo principal. No entanto, a gama de alvos se expandiu para os não muçulmanos e os muçulmanos que não sejam religiosos fanáticos. Além de cristãos e judeus, os islamitas atacam budistas, hindus e seguidores de outros credos. Eles visam o Ocidente, a Rússia e a China.”

Autor de Inside Al-Qaeda: Global network of terror (“Por dentro da Al-Qaeda: Rede global de terror”)

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