No próximo sábado, 20 anos terão se passado desde o dia em que o terrorismo golpeou a maior potência do planeta e assombrou o mundo. Às 8h46 (9h46 em Brasília) de 11 de setembro de 2001, uma terça-feira ensolarada, cinco extremistas suicidas lançaram o avião que fazia o voo 11 da American Airlines contra a Torre Norte do World Trade Center, em Manhattan, provocando um rombo entre o 93º e o 99º andares. Dezessete minutos depois, cinco terroristas arremeteram o voo 175 da United Airlines contra a Torre Sul, entre o 77º e o 85º andares. Às 9h59, a Torre Sul desabou. O mesmo ocorreu com a Torre Norte, às 10h28.
Os atentados cobriram Nova York com densa camada de poeira e espalharam o horror. Na mesma manhã, o Pentágono, em Washington D.C., era atacado. Outro avião, que fazia o voo 93 da United Airlines, caiu na Pensilvânia, após passageiros tentarem tomar a cabine. O maior ataque terrorista da história deixou 2.977 mortos, além dos 19 sequestradores.
Duas décadas depois, o Correio entrevistou quatro sobreviventes — dois trabalhavam na Torre Norte, um na Torre Sul e outro em um prédio situado em frente ao World Trade Center. As lembranças os assombram. Dois deles foram diagnosticados com transtorno do estresse pós-traumático. Três acham que o mundo não está seguro. Todos ressignificaram a vida: passaram a valorizar as pequenas coisas, engajaram-se na solidariedade ou deixaram o emprego. Leia os relatos, em primeira pessoa, de quem foi marcado para sempre pelo terror.
Lolita K. Jackson
54 anos, diretora-executiva de Comunicações e Cidades Sustentáveis da Sustainable Development Capital LLC, em Nova York
“Eu sobrevivi aos atentados de 26 de fevereiro de 1993 — um caminhão-bomba explodiu dentro da garagem do World Trade Center — e de 11 de setembro de 2001. Naquela manhã de quase 20 anos atrás, eu estava numa sala de reunião, no 72º andar da Torre Sul. Ao olhar pela janela, vislumbrei o primeiro avião se chocar com a Torre Norte, às 8h46 (9h46 em Brasília). Quando descíamos pelas escadas, houve um anúncio do setor de segurança pedindo que pegássemos o elevador até o 44º andar.
Eu estava com meu amigo Thomas Swift, que decidiu fazer uma ligação para a esposa e acabou não entrando no elevador. Foi quando o avião colidiu com a nossa torre. Senti o impacto, e o prédio balançou. Descemos 44 andares pelas escadas em 10 minutos. No metrô, soube que a Torre Sul tinha desabado. Sofri um trauma. Primeiro porque Thomas não pôde sair. Depois, porque vi quando a Torre Norte foi atingida pelo avião — uma bola de fogo se formou e papéis caíram. Meus pesadelos têm a ver com o momento do impacto.
Percebi que, se posso ser morta no trabalho, é melhor que eu ame o meu emprego de verdade. Eu me afastei, passei um ano e meio sabático; e mudei de carreira. Trabalhei por 15 anos para o gabinete do prefeito em posições que ajudaram a sociedade. Todas as coisas que eu queria fazer, comecei a fazê-las plenamente. Isso inclui me envolver na universidade como ex-aluna, cantar em bandas, viajar pelo mundo — agora, estou em Galápagos, no Equador, de férias —, estar mais ligada em meu relacionamento com Deus e apenas ter uma vida plena e rica.”
Manuel Chea
57 anos, peruano, morador de Nova York
“É óbvio que jamais me esquecerei daquele dia. Ainda consigo reprisar cada momento, desde a hora em que o avião atingiu o meu prédio, até a fuga pelas escadas. Eu sempre tive medo de altura. Tornou-se muito pior desde aquele 11 de setembro. Eu me recordo que estava sentado em minha mesa, no 39º andar da Torre Norte, quando, às 8h46, o prédio sacudiu, como se fosse um terremoto. A torre começou a balançar para frente e para trás, de forma simultânea. Ouvi uma grande explosão, acima. Imediatamente, depois que o prédio parou de chacoalhar, levantei-me da cadeira e corri até a escada. Depois de uma hora, cheguei ao átrio do World Trade Center e à rua.
A queda das Torres Gêmeas foi a cena mais difícil que presenciei naquele dia. Quando a Torre Sul caiu, eu estava a duas quadras e comecei a fugir da imensa nuvem de poeira que se aproximava e dos escombros que se deslocavam pela rua em minha direção. Eu estava mais longe quando testemunhei a queda da Torre Norte. Não pude deixar de pensar nos bombeiros que encontrei enquanto descia as escadas. Sabia que eles tinham morrido de forma instantânea.
Antes do 11 de Setembro, eu trabalhava com tecnologia de informação em um banco. Agora, ajudo na resposta a calamidades, na Agência de Gerenciamento de Emergências de Nova York. Tenho flashbacks recorrentes. Por um tempo, evitei a região onde ficavam as Torres Gêmeas. Também reajo com breve pânico diante de situações que me tragam as lembranças. O mundo está mais vigilante, mas muitos atentados ocorreram desde então. Os terroristas encontram maneiras de atacar. Sei de uma coisa: não passarei a minha vida com medo; se eu o fizer, então os terroristas terão vencido.”
Artie Van Why
68 anos, funcionário de uma firma de advocacia em frente ao World Trade Center
“Fui diagnosticado com transtorno do estresse pós-traumático pouco depois do 11 de Setembro e sofro com isso. O atentado mudou minha vida rapidamente. Saí do emprego que eu tinha em frente ao World Trade Center. Não poderia descer, dia após dia, e me deparar com os escombros fumegantes onde estavam as Torres Gêmeas. Não lidaria emocionalmente com isso. Pedi demissão. Mudei-me para a Pensilvânia, para ficar com meus pais. Vivi em Nova York por 26 anos. Meus pais tornaram-se prioridade.
Eu me lembro de tudo o que aconteceu. Trabalhava em um prédio em frente ao World Trade Center, no 23º andar. Quando o avião bateu na Torre Norte, nosso prédio estremeceu e ouvimos um som incrivelmente alto. Alguém entrou no escritório e disse que uma aeronave havia atingido uma das Torres Gêmeas. Pensei que fosse um avião pequeno, que tivesse errado de direção. Curioso, desci para ver o que aconteceu. A rua parecia uma zona de guerra. Papéis e destroços cobriam o asfalto. Olhei para a Torre Norte e fiquei chocado ao ver um buraco negro imenso no lado do prédio, com fogo e fumaça.
Vi destroços caindo. Então, percebi que era uma pessoa. Quando entendi que estavam pulando, comecei a gritar ‘Não!’ várias vezes e corri rumo à Torre Norte. Choviam escombros, e vi, de perto, pessoas despencarem. Eu estava abaixo da Torre Sul quando o segundo avião se chocou contra o prédio. Comecei a correr pela minha vida. Vi um homem ferido, com a cabeça aberta e o cérebro exposto. Havia sangue por todos os cantos. Uma ambulância chegou, mas duvido que ele tenha sobrevivido. Gostaria de pensar que o mundo está mais seguro do terrorismo. Acho que não, especialmente ante os incidentes no Afeganistão.”
Kayla Bergeron
58 anos, diretora do Programa Conexão Forsyth, uma organização comunitária que visa ajudar dependentes químicos. Hoje, vive em Suwanee (Geórgia)
“Eu estava na Torre Norte. Meu escritório ficava no 68º andar. Fui uma das últimas pessoas a sair do prédio. As cenas mais impressionantes que guardo envolveram pessoas ensanguentadas, incluindo policiais e bombeiros. Logo depois que consegui deixar o World Trade Center, a Torre Norte caiu. Uma nuvem de fuligem negra e espessa engolfou Manhattan, enquanto eu corria para salvar a minha vida, subindo 16 quarteirões, até o Túnel Holland.
Fui diagnosticada com transtorno do estresse pós-traumático em 2018. Os terroristas roubaram minha carreira, ainda que eu esteja no caminho da recuperação. Centenas de sobreviventes foram esquecidos. Eles não receberam nenhuma assistência. Nada... Percebi que a vida é frágil. Ela pode ser mudada em um piscar de olhos. Há extremistas que odeiam os EUA, e nós não podemos mudar isso. Mas podemos transformar o modo como tratamos uns aos outros. Podemos começar a respeitar pontos de vista diferentes. Não acho que o mundo esteja mais seguro, pois o ódio continua a ser incutido entre os extremistas. Mas, não podemos viver com medo. Precisamos viver nossas vidas e cuidar de quem amamos.”