Há 20 anos, quando as Torres Gêmeas do World Trade Center, em Nova York, ruíram e o Pentágono foi atingido, em Washington, a maior potência do planeta viu-se humilhada. Comandos terroristas suicidas sequestraram quatro aviões comerciais e lançaram três deles contra os símbolos do poderio econômico e militar. A outra aeronave caiu em descampado da Pensilvânia, depois de uma rebelião dos passageiros, provavelmente a caminho do Capitólio ou da Casa Branca. A rede Al-Qaeda, comandada pelo dissidente saudita Osama bin Laden, expôs a vulnerabilidade dos Estados Unidos, naquela manhã ensolarada de terça-feira, 11 de setembro de 2001.
As cenas de civis saltando para a morte do alto de arranha-céus, da fumaça espessa sobre Manhattan e dos semblantes de pavor nas ruas chocaram o planeta e mostraram que a fortaleza do Ocidente poderia ser transposta. Sinais de alerta difusos e crescentes tinham sido captados pela inteligência dos EUA, mas sem precisão sobre a ameaça.
Sob pressão das famílias dos quase 3 mil mortos na tragédia, o presidente norte-americano, Joe Biden, ordenou a divulgação de documentos secretos da investigação governamental sobre os atentados. A desclassificação dos dossiês deverá ocorrer em seis meses. “Nunca devemos esquecer a dor duradoura das famílias e entes queridos dos 2.977 inocentes que foram mortos durante o pior ataque terrorista de nossa história”, declarou, na última quinta-feira. Para analistas, o 11 de Setembro é um ponto de inflexão na influência norte-americana sobre a geopolítica internacional.
Diretor do Centro para Estudos do Afeganistão da Universidade de Nebraska (EUA), o afegão Sher Jan Ahmadzai afirmou ao Correio que os ataques contra Nova York e Washington representaram um imenso desafio aos esforços dos Estados Unidos para manterem a condição de potência global, especialmente no Oriente Médio. “Com a perseguição à Al-Qaeda e ao Talibã, aliado de Bin Laden que comandava o Afeganistão até 2001, os norte-americanos mostraram-se capazes de reagir a agressões em qualquer lugar do planeta. Os países da Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte) apoiaram a operação, e isso mostrou a dimensão dos EUA na reunião de nações contra um inimigo em comum”, avaliou.
A volta do Talibã ao poder, em Cabul, e a retirada do Afeganistão indicaram um ângulo diferente. “Isso provou que o poder dos Estados Unidos é limitado, e que a política global mudou nos últimos 20 anos. Há potências emergentes, como a China e a Rússia, além de outras menores no Oriente Médio: Irã, Paquistão e Índia”, disse o afegão.
Desmoralização
Ahmadzai prefere não falar em desmoralização. “Os EUA foram machucados pelo que ocorreu em 11 de setembro de 2001. O país mantinha o status de potência global. Nas últimas duas décadas, com o envolvimento nas guerras do Afeganistão, do Iraque, da Líbia e da Síria, a situação se modificou um pouco.”
Para Alan Dershowitz, professor emérito da Faculdade de Direito da Universidade de Harvard, o fato de 19 terroristas — comandados pelo egípcio Mohamed Atta e armados com estiletes — terem provocado tantos danos, sem que a maior potência militar e de inteligência os detivesse, desmoralizou uma nação inteira. “A realidade de que o Talibã venceu uma guerra de 20 anos enfraqueceu o poder dos EUA”, disse à reportagem.
Dave DesRoches, professor do Centro para Oriente Médio e Sul da Ásia da Universidade da Defesa Nacional (em Washington), explicou ao Correio que o 11 de Setembro mostrou aos EUA que problemas em outras nações podem afetá-los. “Os atentados revelaram que, se um país fracassar (com o Talibã no poder e o abrigo à Al-Qaeda), isso pode ter implicações para a segurança dos EUA. Os americanos tendem a atravessar ciclos de engajamento e de isolacionismo. O 11 de Setembro marcou o começo de um período de engajamento. Depois dos atentados, houve um ressurgimento do patriotismo.”
Em 7 de outubro de 2001, o presidente George W. Bush ordenou o ataque a posições da milícia fundamentalista Talibã e da Al-Qaeda. Tropas invadiram o Afeganistão para caçar Bin Laden. O regime talibã ruiu, e os EUA mantiveram a ocupação por 20 anos. Bin Laden foi morto em 2011, em Abbottabad (Paquistão).
Na última terça-feira, 18 dias após a retomada do poder pelo Talibã, os Estados Unidos abandonaram o Afeganistão. Mais uma vez, o Tio Sam viu-se acuado. Um atentado suicida reivindicado pelo Estado Islâmico-Khorasan (ISIS-K) matou 10 fuzileiros navais (marines) e acelerou a retirada. Biden anunciou uma “virada de página na política externa” e prometeu abandonar a política de polícia do mundo. “Temos que aprender com nossos erros.”