O anúncio surpresa, nesta sexta-feira (3), do líder japonês Yoshihide Suga de que não concorreria a um novo mandato após apenas um ano no poder, lembra um passado não tão distante, quando o cargo de primeiro-ministro japonês era uma verdadeira cadeira de ejeção.
O complicado calendário eleitoral do país e as incessantes disputas pelo poder dentro dos partidos geraram períodos de valsa de primeiros-ministros no arquipélago, onde o Partido Liberal Democrata (PLD) de Suga está no poder quase continuamente há quase 70 anos.
Desde a Segunda Guerra Mundial, apenas cinco primeiros-ministros japoneses passaram mais de cinco anos no cargo.
Entre o fim do mandato de Yasuhiro Nakasone, em 1987, e a ascensão ao poder do populista Junichiro Koizumi, em 2001, o Japão teve dez primeiros-ministros. Um deles permaneceu no cargo por apenas dois meses.
Koizumi ficou por cinco anos, mas após sua saída em 2006, a porta do Kantei - residência e local de trabalho do primeiro-ministro - não parou de abrir.
Mesmo que tenha quebrado recordes de longevidade durante seu segundo mandato (2012-2020), Shinzo Abe teve de jogar a toalha depois de apenas um ano durante o primeiro (2006-2007), minado por escândalos e por problemas de saúde.
Seu sucessor Yasuo Fukuda também durou apenas um ano (2007-2008), tendo de lidar com uma oposição majoritária na Câmara alta do Parlamento.
Taro Aso, o atual ministro das Finanças, subiu ao posto de primeiro-ministro que há muito cobiçava. Impopular e ridicularizado por suas repetidas gafes, foi destituído do poder em 2009, após um raro sucesso eleitoral da oposição.
Pandemia desestabilizadora
Os primeiros-ministros do Partido Democrata do Japão (PDJ) também pouco duraram, com Yukio Hatoyama (2009-2010) permanecendo menos de nove meses no poder.
Seu sucessor Naoto Kan (2010-2011) também cedeu rapidamente, em um cenário de deterioração das relações com a China e de críticas à sua gestão do triplo desastre de março de 2011 (terremoto, tsunami e acidente nuclear de Fukushima).
A passagem do PDJ pelo poder terminou com a saída precipitada de Yoshihiko Noda (2011-2012).
A pandemia de coronavírus que o país ainda luta para controlar, principal causa da impopularidade de Yoshihide Suga, agora está fazendo alguns observadores temerem que a instabilidade inerente ao sistema político volte.
"É definitivamente um risco", segundo o especialista em política japonesa e relações internacionais Corey Wallace, professor da Universidade de Kanagawa (sul de Tóquio).
"Posso imaginar perfeitamente uma situação em que veríamos por alguns anos (esta situação se repetir), enquanto a pandemia continuar a desestabilizar" o país, disse ele à AFP nesta sexta-feira.
Wallace observa, no entanto, que Suga chegou ao poder em circunstâncias especiais com a crise sanitária, e que sua não filiação a uma facção do PLD tornou sua posição frágil desde o início.
"Ele não teve sorte, porque teve que lidar com a covid-19", estima Mikitaka Masuyama, professora de política da Faculdade de Pesquisa Política de Tóquio. "É extremamente difícil para qualquer pessoa nesta posição", completou.
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© Agence France-Presse