Na corrida pelas cruciais vacinas contra o coronavírus, os países ricos nem sempre cumprem as promessas na hora de compartilhar as doses com os países em desenvolvimento, como acontece no continente africano.
Até o momento, apenas 3,6% da população da África está vacinada, muito longe dos mais de 60% registrados na Europa e Reino Unido. Mas, por que e como a África foi relegada desta maneira?
Qual a situação da África?
Os países africanos recebem vacinas por meio de compras diretas dos fabricantes, doações de outras nações ou por meio do mecanismo Covax da Organização Mundial da Saúde (OMS) para o acesso às vacinas de Estados em desenvolvimento.
A União Africana (UA) também adquiriu vacinas que distribui aos países membros.
Mas a OMS e a UA lutam para obter doses suficientes devido às restrições à exportação impostas por alguns países produtores e à prioridade que alguns laboratórios concedem a determinados governos com os quais têm acordo.
Os países africanos dependem cada vez mais das doações dos excedentes adquiridos pelas nações mais ricas.
Quase 75% das 77,5 milhões de doses prometidas à África foram administradas, ou seja quase 57 milhões, de acordo com o Unicef.
Quem doa mais?
Os países ocidentais são os mais rápidos a prometer. Em junho, o G7 anunciou centenas de milhões de doses que, em sua maioria, ainda não chegaram ao continente africano.
A lista de países doadores é liderada pelos Estados Unidos, com 31,5 milhões de doses, à frente da China com 6,8 milhões; Reino Unido, com 5,3 milhões; e França, com 4,5 milhões, segundo os dados oficiais.
Mas isto não permite esquecer que os países ricos não conseguiram avançar na quebra das patentes sobre as vacinas anti-covid, o que permitiria aos países em desenvolvimento produzir vacinas genéricas mais baratas a nível local.
"Esta é a história desta pandemia. Todo mundo fala, mas ninguém faz nada", afirma, indignada, Fatima Hassan, da ONG sul-africana Iniciativa Justiça Saúde. "O resto do mundo não se preocupa com a África", completa Hassan.
Para não esperar por doações, a África exige acesso justo ao mercado das vacinas.
"Podem doar, mas queremos poder comprar doses", afirmou na semana passada o enviado da UA para a covid-19 em uma entrevista coletiva da OMS. Ele pediu o fim das restrições às exportações das vacinas.
E a China?
Quase todas as doações ocidentais aconteceram por meio do mecanismo Covax. Mas a China, que se tornou um ator importante na África para a ajuda estrangeira, o comércio e, inclusive, a construção de infraestruturas, assinou acordos bilaterais com os países.
Mas sua estratégia de vacinação se viu "obstruída pelas persistentes preocupações sobre a eficácia" das vacinas desenvolvidas no país, de acordo com Hugo Brennan, da consultoria de riscos Verisk Maplecroft.
O fornecimento de vacinas para a África continua sendo, no entanto, "uma das múltiplas frentes geopolíticas sobre as quais discutem Estados Unidos e China", destaca Brennan.
A Rússia viu suas ambições de vacinação no continente prejudicadas sobretudo pelos problemas de produção.
A próxima etapa?
Apenas 2% das quase seis bilhões de doses administradas em todo o mundo foram aplicadas na África.
Alguns esperam que uma reunião programada para esta semana à margem da Assembleia Geral das Nações Unidas apresente resultados.
O presidente americano, Joe Biden, que deseja assumir a liderança na vacinação do planeta, convidou chefes de Estado, empresas e ONGs a um debate para "acabar com a pandemia".
Biden comparou o esforço dos Estados Unidos, o maior doador de vacinas do mundo, com a entrada americana na Segunda Guerra Mundial.
"Estados Unidos afirmaram muitas coisas positivas sobre os compromissos mundiais (...) mas isto não se traduziu em vacinas", destaca Mitchell Warren, ativista de vacinação da ONG americana Avac.
O continente tem apoio suficiente para alcançar um determinado nível de imunidade? "No momento, a África não tem tantos amigos", afirma Cobus Van Staden, analista do Instituto de Relações Internacionais da África do Sul.
Notícias pelo celular
Receba direto no celular as notícias mais recentes publicadas pelo Correio Braziliense. É de graça. Clique aqui e participe da comunidade do Correio, uma das inovações lançadas pelo WhatsApp.
Dê a sua opinião
O Correio tem um espaço na edição impressa para publicar a opinião dos leitores. As mensagens devem ter, no máximo, 10 linhas e incluir nome, endereço e telefone para o e-mail sredat.df@dabr.com.br.