À espera de um novo governo, um protesto de centenas de pessoas em Cabul foi dispersado nesta terça-feira (7) com tiros para o alto pelos combatentes do Talibã, cujos líderes prometeram novamente aos Estados Unidos que permitirão as saídas de afegãos em risco.
Apesar das palavras tranquilizadoras dos novos donos do poder no Afeganistão, com o compromisso de mais inclusão e tolerância, muitas pessoas na capital do Afeganistão temem o retorno do regime ultra-rigoroso imposto entre 1996 e 2001 pelo movimento islamita radical.
Em uma demonstração da rejeição ao retorno do sistema dos anos 1990, centenas de manifestantes protestaram em diferentes pontos de Cabul, algo impensável no regime anterior Talibã, quando eram organizadas execuções públicas e as mãos de pessoas acusadas de roubo eram cortadas.
"As mulheres afegãs querem que seu país seja livre. Querem a reconstrução do país. Estamos cansadas", declarou à AFP Sarah Fahim em um protesto diante da embaixada do Paquistão, muito próximo aos Talibã.
"Queremos que nosso povo tenha uma vida normal. Quanto tempo teremos que viver nesta situação?", questionou a mulher de 25 anos.
O protesto reuniu 70 pessoas, a maioria mulheres, que exibiram cartazes e gritaram frases contrárias ao país vizinho, acusado com frequência de dar cobertura ao movimento islamita após a invasão liderada pelos Estados Unidos em 2001.
Combatentes talibãs no local dispersaram rapidamente o protesto com tiros para o alto.
Apesar de pequenas e isoladas, alguns afegãos, geralmente mulheres, protestaram em cidades como Cabul, Herat e Mazar-i-Sharif após a queda do país nas mãos dos talibãs há três semanas.
Aproveitando a retirada das tropas estrangeiras o movimento Talibã executou uma ofensiva relâmpago que pegou de surpresa as potências ocidentais e, segundo alguns analistas, os próprios islamistas, que não estavam preparados para assumir o controle de um país em uma grave crise econômica e humanitária.
O anúncio do novo governo era aguardado para o fim de semana passado, mas na segunda-feira o porta-voz do movimento, Zabihullah Mujahid, afirmou que ainda levaria alguns dias por "questões técnicas".
O porta-voz também anunciou que suas tropas acabaram com o último foco de resistência a seu poder, no vale de Panjshir, onde estão concentradas milícias anti-Talibã e remanescentes do exército afegão.
A chamada Frente Nacional de Resistência respondeu que ainda mantém "posições estratégicas" na região e seu líder Ahmad Masud convocou um levante da população.
Nesta terça-feira, Ahmad Wali Masud, irmão do falecido comandante Ahmad Shah Masud, assassinado em 2001 pela Al-Qaeda, e tio de Ahmad, afirmou que os talibãs não têm o controle de todo o vale de Panjshir.
"O Talibã veio com terroristas para tomar a estrada de Panjshir. Quem conhece a geografia de Panjshir sabe como é o local. Eles vieram para tomar uma estrada, mas Panjshir tem tantos vales...", disse Masud, em uma conferência sobre o Afeganistão organizada por uma universidade suíça e a missão permanente da ONU para o Afeganistão em Genebra.
"Por isso, não pensem que porque tomaram a estrada, eles tomaram o Panjshir", insistiu.
- Blinken no Catar -
O rápido avanço Talibã também pegou desprevenidas as potências ocidentais, que tentaram organizar, em uma corrida contra o tempo, uma retirada em larga escala de estrangeiros e afegãos em risco a partir do aeroporto de Cabul.
A saída das forças americanas em 30 de agosto interrompeu a operação antes da retirada de todas as pessoas que cumpriam os requisitos para deixar o país.
Durante uma visita ao Catar, a primeira de um funcionário de alto escalão do governo americano à região desde a queda de Cabul, o secretário de Estado Antony Blinken afirmou que as novas autoridades em Cabul prometeram novamente que permitirão a saída de todos os afegãos que desejam abandonar o país.
Líderes talibãs afirmaram que "permitirão que as pessoas com os documentos necessários para viajar partam de maneira livre", disse Blinken.
"A comunidade internacional espera que o Talibã respeite este compromisso", disse o chefe da diplomacia, ao lado do secretário de Defesa, Lloyd Austin.
Ao mesmo tempo, o Catar reafirmou que o aeroporto de Cabul, fechado desde que os últimos soldados americanos saíram do país no fim de agosto, reabrirá em breve, mas não anunciou uma data concreta.
A infraestrutura é essencial para transportar ajuda humanitária ao país, assim como para reativar o processo de retirada dos afegãos em risco, em caso de permissão do Talibã.
A ONU pediu 200 milhões de dólares de fundos adicionais em ajuda humanitária para o Afeganistão.
O Escritório para a Coordenação de Assuntos Humanitários (OCHA, na sigla em inglês) afirma que, com o valor extra, é necessária uma ajuda no valor de 606 milhões de dólares para o Afeganistão até o fim de 2021.
"Os serviços básicos no Afeganistão estão em colapso e os alimentos e outros bens básicos para a sobrevivência estão prestes a acabar", disse o porta-voz do OCHA, Jens Laerke.
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