Índia

Crise climática provoca aumento de mortes por raios na Índia

Os raios têm até um trilhão de volts de eletricidade e podem causar grandes danos aos edifícios.

Agência France-Presse
postado em 03/09/2021 12:48 / atualizado em 03/09/2021 12:49
 (crédito: Narinder NANU / AFP)
(crédito: Narinder NANU / AFP)

Faizuddin ainda está traumatizado com o raio que atingiu seus três amigos quando tiravam fotos em um forte de 400 anos na Índia, onde a mudança climática tem provocado um aumento desses incidentes.

Dezenas de pessoas morreram atingidas por raios este ano no deserto do estado de Rajastão, onde era raro alguém falecer em uma tempestade elétrica.

"Fui atingido por três raios, um após o outro", recorda Faizuddin, trêmulo, enrolado em um cobertor em sua modesta casa em Jaipur.

Ele e seus três amigos de infância subiram centenas de degraus para chegar a uma torre de vigia acima do Forte Amber durante uma tempestade em julho, que ceifou outras oito vidas.

"O som foi ensurdecedor, pareceu um grande estrondo. Minhas calças e sapatos pegaram fogo, meus membros ficaram paralisados, eu não conseguia me mover", diz o jovem de 21 anos à AFP.

Cerca de 2.500 pessoas morrem a cada ano na Índia, devido à queda de raios, de acordo com dados do governo, em comparação com apenas 45 nos Estados Unidos.

Gado e outros animais são frequentemente mortos, ou mutilados, durante tempestades elétricas. Um raio no estado de Assam, no nordeste do país, abateu uma manada de 18 elefantes em maio passado.

Os raios têm até um trilhão de volts de eletricidade e podem causar grandes danos aos edifícios.

Meses atrás, em outro forte de Chittorgarh, algumas horas ao sul de onde os amigos de Faizuddin morreram, um raio atingiu uma torre, fazendo com que uma enorme pedra caísse.

Um para-raios foi instalado no local para evitar danos à estrutura centenária, "mas foi ineficaz", segundo Ratan Jitarwal, que supervisiona os reparos do forte.

Aumento repentino

Os raios se tornaram mais frequentes, com quase 19 milhões de impactos registrados nos 12 meses anteriores a março, um terço a mais que no ano anterior.

O aumento é causado pelo aquecimento global, disse Sanjay Srivastava da Lightning Resilient India Campaign, uma das poucas organizações que coletam dados sobre tempestades elétricas.

"Devido à mudança climática, ao aquecimento localizado da superfície da Terra e à maior umidade, há um aumento repentino de raios", explicou à AFP.

O fenômeno é global, e os pesquisadores preveem que, neste ano, a média de queda de raios dentro do Círculo Polar Ártico poderá dobrar neste século.

Isso poderia causar incêndios de tundra e fazer com que grandes quantidades de carbono armazenado no permafrost sejam liberadas na atmosfera, exacerbando o aquecimento global.

As evidências sugerem que os raios estão se tornando mais comuns em áreas urbanas, uma preocupação na Índia. Espera-se um aumento dramático da população urbana no país para os próximos anos.

Srivastava comenta que os resultados podem ser catastróficos se, por exemplo, um raio atingir um hospital e danificar o equipamento usado para manter vivos os pacientes em terapia intensiva.

"O diabo caiu do céu"

Tal como acontece em relação ao aumento do nível do mar, ao aumento da frequência das ondas de calor e a outras consequências da mudança climática, este país de 1,3 bilhão de pessoas luta para se adaptar à ameaça do aumento das tempestades elétricas.

A maioria das mortes humanas por tempestades elétricas é evitável, mas poucos prédios têm para-raios para proteger seus ocupantes, disse Srivastava.

Recentemente, cientistas indianos desenvolveram um aplicativo móvel que busca emitir alertas em tempo real sobre quedas de raios e os cuidados a serem tomados. A ferramenta é de pouca utilidade, porém, em um país onde apenas metade da população tem acesso a smartphones e, menos ainda, nas áreas rurais, onde as quedas de raios são mais frequentes.

Muitas pessoas desconhecem os perigos e o que fazer em uma tempestade. Entre outros cuidados a serem tomados neste tipo de situação, orienta-se evitar espaços abertos e não se abrigar debaixo de uma árvore.

"Se soubéssemos que os raios podem matar e mutilar, não teríamos permitido que nosso filho saísse de casa", comentou Mohamed Shamim, cujo filho de 20 anos morreu no incidente do Forte Amber.

"Ele vestiu uma camisa nova naquele dia e só queria tirar boas fotos com seu celular. Mas parece que o diabo caiu do céu e levou nosso filho", desabafou.

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