O Facebook divulgou um relatório com os links mais vistos na rede social nos Estados Unidos no primeiro trimestre de 2021, e em primeiro lugar aparece uma notícia no site de um jornal americano que atribuiu equivocadamente a morte de um médico à vacina contra a Covid-19.
Depois, o conteúdo da matéria foi atualizado para informar que uma análise de peritos apontou não haver evidências de que a vacinação causou a morte do homem duas semanas depois — mas a esta altura, o texto já havia se tornado muito popular entre movimentos negacionistas contra as vacinas.
No total, o link teve 54 milhões de visualizações de usuários do Facebook, segundo o relatório Widely Viewed Content.
O Centro de Controle de Doenças (CDC) do Departamento de Saúde dos EUA afirma que milhares de ensaios clínicos já realizados no mundo, além de pesquisas com dados populacionais, mostram que as vacinas contra a Covid-19 são seguras e eficazes.
De acordo com o órgão americano, problemas de saúde após a imunização contra a doença são "raros" e até agora se resumem a dois tipos: anafilaxia e síndrome de trombose com trombocitopenia.
Repórter da BBC especializada em redes sociais e desinformação, Marianna Spring explica que a ampla disseminação do link tem a ver com a atuação de "uma rede comprometida de ativistas" antivacina, que encontram no Facebook um ambiente fértil para distribuição desse tipo de conteúdo.
"Promover histórias emotivas e pessoais como esta (do médico) no Facebook tem sido uma das principais táticas destes grupos para barrar as pessoas de serem vacinadas — mesmo quando, como aconteceu neste caso, não há nenhuma evidência de ligação entre a vacina contra a covid-19 e a morte", explica Spring.
"Na pandemia, esses ativistas misturaram histórias reais — e raras — sobre possíveis efeitos colaterais adversos da vacina com fortes teorias da conspiração, debates médicos, luto genuíno e questionamentos legítimos."
"Isso também demonstra a complexidade do ecossistema de desinformação nas mídias sociais, onde os usuários se prendem a um grão de verdade — neste caso uma notícia — e o transformam em uma narrativa enganosa", completa a jornalista da BBC.
Questionamentos ao Facebook
O Facebook só divulgou o relatório do primeiro trimestre de 2021 depois da publicação de uma reportagem do jornal americano The News York Times, segundo a qual a rede social postergou a revelação dos resultados porque eles "pegariam mal" — sobretudo por conta do link mais lido, com a história do médico.
Na 19ª posição das páginas de Facebook mais populares, está também o Epoch Times, acusado de disseminar teorias da conspiração de direita.
O relatório do segundo trimestre, de abril a junho, já havia sido publicado e mostrou que o post mais visualizado no período foi o de uma brincadeira de caça-palavras que mostraria a "realidade da pessoa" — por exemplo "gratidão", "conexão" e "mudanças".
Sobre o relatório do primeiro trimestre, o Facebook afirmou que atrasou sua publicação para fazer "verificações importantes" nos dados.
Um porta-voz da empresa disse: "Pensamos em tornar o relatório público mais cedo, mas como sabíamos que ele chamaria a atenção, exatamente como estamos vendo essa semana, quisemos fazer algumas correções no sistema."
O relatório foca em dados de visualização — e não de engajamento, que combina informações sobre curtidas, comentários e compartilhamentos e é medido por outra ferramenta, o Crowdtangle, normalmente usada por pesquisadores e jornalistas.
Estes profissionais já apontaram em algumas pesquisas que, no engajamento, o conteúdo político de direita seria dominante.
O Facebook se opõe fortemente a essa ideia, dizendo que apenas 6% do conteúdo visto pelos usuários é político.
Mas alguns pesquisadores e jornalistas que trabalham com o tema da desinformação temem que o Facebook esteja querendo escantear o Crowdtangle.
A empresa não respondeu ao questionamento da BBC sobre se a ferramenta está sob ameaça.
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