O esquerdista Pedro Castillo, do partido Perú Libre, recebeu a faixa presidencial em 28 de julho. Em 26 dias de governo, viu a popularidade minguar de 47% para 39% e tem recebido críticas pela formação do gabinete ministerial. Alguns de seus assessores são meros desconhecidos da população. Outros, como o primeiro-ministro Guido Bellido Ugarte, militam na extrema esquerda e colocam em risco o projeto político do ex-professor de escola rural que se alijou das elites política e econômica. A situação de Castillo é delicada no Congresso do Peru, controlado pela oposição. Em 5 de agosto, ao ser reconhecido como “comandante supremo” das Forças Armadas e da Polícia Nacional, o presidente pediu “a união de todos os peruanos”. Demanda complicada em um país bastante polarizado. Um dos primeiros anúncios de Castillo causou controvérsia: ele enviou ao Parlamento um projeto de lei para reformar a Constituição fujimorista.
Professor de ciência política da Pontifícia Universidad Católica del Perú (PUCP), Mauricio Zavaleta admitiu ao Correio que o início do governo de Castillo tem sido “complicado”. Além de citar a vitória estreita no segundo turno sobre a direitista Keiko Fujimori, filha do ex-presidente Alberto Fujimori, ele lembrou que Castillo não buscou forjar uma coalizão mais ampla, formada por pessoas independentes ou mais posicionadas ao centro. “Castillo decidiu trabalhar, basicamente, sob a base do Perú Libre, de extrema-esquerda. Nomeou como primeiro-ministro Guido Bellido Ugarte, um político muito próximo ao neurocirurgião Vladimir Cerrón, fundador do partido, Mas, Guido é pouco afeito ao diálogo, por estar no extremo do espectro político”, explicou Zavaleta.
De acordo com o especialista, o governo montado por Pedro Castillo aferrou-se ao partidarismo. “Essa composição não permitiu esfriar a oposição no Parlamento e se aproximar de setores importantes, como os sindicatos. Entre os ministros, Pedro Francke, titular da pasta de Economia e esquerdista moderado, é visto como um nome positivo em meio a nomeações polêmicas”, disse Zavaleta. O analista da PUCP reconhece que Castillo é um líder muito débil. “Ele conta com o apoio de apenas 37 entre os 130 congressistas. O partido Perú Libre bem que tentou apresentar uma lista para a mesa diretora do Congresso, mas ela nem sequer foi aceita. Nesse sentido, sua fragilidade revela-se extrema.”
Vacância
O Peru utiliza de um mecanismo constitucional polêmico: a vacância presidencial. O poder se torna vago após a morte do presidente, mas também por sua incapacidade física e moral. O recurso foi usado para forçar a renúncia de Pedro Pablo Kuczynski, em 2018. Zavaleta vê o perigo de o Congresso tornar a lançar mão da vacância presidencial, caso Castillo perca ainda mais influência. Para piorar, o especialista cita que o Perú Libre se configura como uma aliança precária, o que ameaça a governabilidade. “Os votos para Castillo no Congresso não estão assegurados, nem coordenados entre si.”
Em entrevista ao Correio, Edward Martínez Talavera, deputado pelo partido Acción Popular, reconheceu que Castillo tomou decisões ruins. “Os assessores escolhidos por ele não contam com o respaldo do povo. Isso causou muita expectativa e especulação entre a população e entre nós, congressistas. Ainda há esperança de que ele corrija o rumo e faça um bom governo, pelo bem do Peru”, comentou. Para tanto, o parlamentar sugere que o presidente remova de seu entorno as pessoas “que fazem muitos danos ao país, como Cerrón e Guido Bellido”. “Estou plenamente convencido de que podemos colocar o Peru adiante. Somos um país forte, soberano, com gente trabalhadora e empreendedora”, ressaltou Edward.
O deputado vê a oposição parlamentar a Castillo com bons olhos. “É melhor que ele não tenha apoio total do Congresso, ou não poderíamos equilibrar a balança de poderes, pelo bem da democracia”, observou. “Se tivesse a maioria total no Parlamento, seria algo preocupante”, acrescentou Edward.