O presidente do Afeganistão, Ashraf Ghani, desembarcou nesta quarta-feira (11/8) em Mazar-i-Sharif, a grande cidade do norte do país na mira dos talibãs, para tentar coordenar uma resposta que interrompa o avanço dos insurgentes.
Os talibãs já controlam mais de 25% das capitais de províncias.
Na madrugada desta quarta-feira, os talibãs assumiram o controle de Faizabad, capital da província de Badajshan (nordeste), área em que não conseguiram entrar durante seu avanço rumo ao poder nos anos 1990.
No momento, os insurgentes controlam nove das 34 capitais de província do Afeganistão, que caíram sob o controle talibã como peças de dominó. Sete delas ficam no norte do país, uma região que sempre resistiu ao domínio do grupo.
"As forças de segurança abandonaram Faizabad e se retiraram (para os distritos vizinhos). Os talibãs tomaram a cidade. Os dois lados sofreram baixas importantes", declarou à AFP Zabihullah Attiq, deputado da província de Badajshan.
Faizabad seguiu os exemplos de Farah, no oeste, e Pul-e Khumri, ao norte, que caíram sob controle dos insurgentes na terça-feira (10/8).
Desde sexta passada (6/8), os talibãs registraram uma série de conquistas: Zaranj (sudoeste), Sheberghan (norte) e, sobretudo, Kunduz, a grande cidade do nordeste, assim como outras três cidades setentrionais, Taloqan, Sar-e-Pul e Aibak.
Em Kunduz, centenas de integrantes das forças de segurança afegãs, que estavam entrincheirados perto do aeroporto desde a queda da cidade nas mãos dos talibãs no fim de semana, entregaram-se aos insurgentes nesta quarta-feira.
"Os talibãs nos cercaram, dispararam obuses. Não havia maneira de responder", disse um soldado, que pediu anonimato, à AFP.
Organizar a "resistência"
A situação no norte do país é crítica e as forças de segurança afegãs parecem desmoralizadas.
Em Mazar-i-Sharif, Ghani se reuniu com Mohammad Atta Noor - ex-governador da província de Balj (cuja capital é Mazar-i-Sharif), um homem com muito poder no norte do território, que prometeu resistir "até a última gota de sangue" - e com Abdul Rachid Dostom, que já foi seu vice-presidente.
A conversa abordou a "coordenação, fornecimento de equipamentos e mobilização das forças de resistência", escreveu no Twitter Latif Mahmood, porta-voz da Presidência.
Os talibãs, que convergem de vários pontos em direção a Mazar-i-Sharif, atacaram na terça-feira bairros da periferia da cidade, mas foram obrigados a recuar, segundo correspondentes da AFP.
Se Mazar-i-Sharif cair sob controle dos insurgentes, isto será catastrófico para o governo, que ficará sem qualquer controle sobre a região norte do país. Este quadro permitiria aos talibãs concentrar forças em outras áreas, incluindo a capital do país, Cabul.
"Não aprendem com o passado. Vieram diversas vezes ao norte sempre caíram na armadilha", advertiu Dostom, acusado de ter matado 2.000 talibãs por asfixia em contêineres em 2001.
Atrocidades
A violência levou dezenas de milhares de pessoas a fugirem por medo das atrocidades cometidas pelos talibãs.
Quase 360.000 pessoas foram deslocadas no país pelos combates desde o início do ano, segundo a Organização Internacional para as Migrações (OIM).
Os talibãs deflagraram sua ofensiva em maio passado, no início da retirada final das forças americanas, mas o avanço dos insurgentes se acelerou nas últimas semanas.
Além da ofensiva no norte, também há combates perto de Kandahar, a segunda maior cidade do país, na região central, cercada há semanas. Os talibãs tentaram entrar na prisão local para libertar insurgentes presos.
A saída das tropas estrangeiras do Afeganistão deve ser concluída até 31 de agosto, 20 anos depois da intervenção motivada pelos atentados de 11 de setembro de 2001 nos Estados Unidos.
Biden não se arrepende
"Não me arrependo da minha decisão de sair do Afeganistão", afirmou na terça-feira o presidente americano, Joe Biden. "Os afegãos devem ter vontade de lutar e devem lutar eles mesmos, por sua nação", completou.
Washington não esconde, porém, a frustração diante da fragilidade do Exército afegão, treinado, financiado e equipado pelos Estados Unidos há vários anos.
O porta-voz do Departamento de Estado americana, Ned Price, destacou que as forças governamentais são "muito superiores em número" aos talibãs e têm o "potencial de provocar perdas mais importantes".
Na terça-feira, representantes de Catar, Estados Unidos, China, Reino Unido, Uzbequistão, Paquistão, ONU e União Europeia se reuniram em Doha para tratar da situação no Afeganistão.
Os encontros prosseguem nesta quarta-feira. O enviado americano Zalmay Khalilzad deve fazer um apelo para que os talibãs ponham fim à ofensiva militar e negociem um acordo político.
A cidade do Catar recebe desde setembro negociações entre o governo afegão e os talibãs, após o acordo de paz assinado em fevereiro de 2020 entre os insurgentes e o governo dos Estados Unidos. O processo se encontra estagnado.