*Texto atualizado às 18h50
Com pouco menos da metade da população totalmente imunizada contra a covid-19 e infecções aumentando de modo desenfreado, os Estados Unidos estão "em uma direção equivocada" na pandemia.
O alerta é do assessor da Casa Branca para doenças infecciosas, Anthony Fauci, que prevê um recrudescimento da crise sanitária no país se não forem tomadas medidas para contornar a situação.
O país com maior número de mortos pela covid-19 viu o volume de novos casos da doença atingir 500 mil na última semana, um avanço expressivo frente aos 92 mil registrados na última semana de junho.
Ainda que a taxa de letalidade tenha diminuído, para cerca de 3 mil óbitos por semana - contra 20 mil há poucos meses -, a propagação da variante Delta está fora de controle em alguns Estados. A isso soma-se a estagnação do programa de vacinação, principalmente nas áreas mais conservadoras do país.
"É realmente uma pandemia entre os não vacinados", declarou Fauci à CNN no último domingo.
A escalada levou o Centro de Controle de Doenças (CDC) do Departamento de Saúde dos EUA na terça-feira (27/07) a recomendar aos americanos que vivem nas regiões mais afetadas que voltem a usar máscaras em ambientes fechados, mesmo aqueles que já estão vacinados.
Em maio, as autoridades de saúde do país haviam anunciado que as máscaras não seriam mais necessárias, com algumas poucas exceções, para aqueles totalmente imunizados. Na ocasião, epidemiologistas alertaram que a decisão era precipitada.
O foco do problema: os não vacinados
No início desta semana, Vivek Muthy, cirurgião geral e o principal porta-voz dos Estados Unidos em questões de saúde pública, disse que 99,5% das mortes recentes pela covid-19 no país foram entre pessoas não vacinadas.
O médico Marcus Plescia, diretor da Associação Estatal e Territorial de Funcionários de Saúde, explicou à BBC que o principal problema do aumento de contágios se concentra em determinadas regiões do país.
"É particularmente grave em, provavelmente, seis ou sete estados. Os Estados do sudeste e alguns do meio-oeste dos Estados Unidos", disse Plescia.
Alabama, Misisipi, Arkansas, Georgia, Tennessee, Oklahoma são Estados onde menos de 40% da população está completamente vacinada (em contrapartida, a região nordeste, como Vermont e Massachusetts, supera 65%).
Os governadores dos Estados com menores taxas de vacinação — majoritariamente republicanos — expressam desde o ano passado ceticismo sobre as políticas federais de combate ao novo coronavírus.
A vacinação estagnada
As taxas de vacinação nos Estados Unidos estão praticamente paralisadas nos últimos meses.
Os Estados Unidos tiveram, até abril, os índices mais altos de aplicações diárias de doses contra a covid-19 no mundo. Mas, desde então, o ritmo diminuiu consideravelmente.
O país tem, até agora, cerca de 163 milhões de pessoas vacinados, o que é aproximadamente 49% de sua população (cerca de 18% do total é menor de 12 anos, para quem não há indicação para vacina).
Plescia destaca que o país começou a registrar um "leve aumento" no ritmo de vacinação logo que as últimas notícias mostraram um crescimento de casos entre os não vacinados.
"Gostaríamos de ver muito mais, mas estamos vendo uma tendência ascendente e ouvimos das pessoas que isso [a nova onda de casos] chamou a atenção", principalmente entre aqueles que estão abertos a considerar a vacinação, nem tanto entre aqueles que a rejeitam, explica.
Em entrevista à CNN, Fauci disse que os líderes locais em áreas com baixas taxas de vacinação devem fazer mais para convencer as pessoas a tomar as doses do imunizante. Há até lugares que estão promovendo uma vacinação porta a porta.
Os governadores republicanos de Arkansas e Flórida — que criticaram os conselhos de Fauci no passado — passaram a promover as vacinas.
A propagação da variante delta
Um problema que acompanha as baixas taxas de vacinação em alguns locais dos Estados Unidos é a propagação da variante Delta.
Mais contagiosa que outras, essa variante é transmitida mais rapidamente entre as pessoas que não receberam nenhuma dose de vacina contra a covid-19, explicam estudiosos sobre o tema.
Estados que não ficaram tão pra trás na vacinação, como a Flórida (48,5%), estão entre os que começaram a duplicar ou até triplicar os contágios e hospitalizações.
Fauci disse que as autoridades sanitárias estão avaliando se as pessoas mais vulneráveis ao vírus, como aquelas que têm doenças pré-existentes ou são idosas, devem receber uma dose extra.
Máscaras em desuso
Diferente do ano passado, neste verão nos Estados Unidos, as pessoas voltaram a sair de férias, assistir a shows e eventos esportivos, comer em restaurantes cheios sem o uso de máscara e sem muito distanciamento social.
O abandono dessas recomendações avançou rapidamente a partir de 13 de maio passado, quando o presidente Joe Biden disse que aqueles que já estavam completamente vacinados poderiam voltar à vida normal sem o uso de máscaras.
Mas, à medida em que a situação começou a assustar novamente no país, as autoridades começaram a se perguntar se é necessário retomar medidas que foram abandonadas recentemente na pandemia.
"Estamos vendo isso em Los Angeles, em Chicago, em Nova Orleans", disse Fauci à CNN.
Plescia, por sua vez, considera que a vacina é a solução para as máscaras. "Essa é uma política sólida. Me refiro a pessoas que estão completamente vacinadas, porque temos muitas vacinas boas. São muito, muito efetivas", explicou.
"Inclusive nesse caso (da variante Delta), é pouco provável que essas pessoas fiquem doentes gravemente ou terminem morrendo em um hospital", acrescentou.
Fauci disse que participou de discussões sobre uma possível nova política para o uso de máscaras, com membros do Centros para o Controle e Prevenção de Enfermidades (CDC), mas ainda não há uma decisão tomada.
Vacina obrigatória?
Tanto autoridades públicas como associações começaram a debater se a vacinação deve ser um requisito para trabalhadores em certas atividades essenciais.
Em um comunicado conjunto, dezenas de associações médicas se pronunciaram no domingo a favor da vacinação dos trabalhadores como requisito para que possam atuar em hospitais.
"A vacinação é a principal forma para deixar para trás a pandemia e evitar a retomada de medidas restritivas de saúde pública", diz uma carta assinada por 60 associações dos Estados Unidos.
Nesta semana, o Departamento de Assuntos de Veteranos se tornou a primeira agência federal dos Estados Unidos a exigir que seus empregados — incluindo profissionais da saúde — tenham sido vacinados contra a covid-19.
Embora a Casa Branca tenha descartado a imposição de vacinas para funcionários púbicos, ela deixou em aberto a possibilidade de as empresas fazerem essa exigência.
"Certamente apoiamos essas ações das associações de hospitais", disse a porta-voz Jen Psaki na segunda-feira (26/7).
E a opinião pública está dividida: segundo uma pesquisa do site Político e da Universidade Harvard, publicada neste mês, 66% defendem que os profissionais de saúde devem estar vacinados para trabalhar.
Em relação a outros trabalhadores, as opiniões estão quase igualmente divididas se a vacinação deve ou não ser obrigatória.
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