CUBA

"Ouça seu povo", diz Biden a Diaz-Canel, que atribuiu crise de Cuba aos EUA

Em resposta ao herdeiro político dos irmãos Castro, que atribuiu crise na ilha caribenha aos EUA, chefe da Casa Branca pede ao regime que, "em vez de se enriquecer", atenda às necessidades da população. Rússia e México alertam contra interferências indevidas

Correio Braziliense
postado em 13/07/2021 06:00
Acesso ao Capitólio de Havana interditado um dia após os protestos contra a grave situação na ilha: governo acusa governo americano de asfixiar o país -  (crédito: Yamil Lage/AFP)
Acesso ao Capitólio de Havana interditado um dia após os protestos contra a grave situação na ilha: governo acusa governo americano de asfixiar o país - (crédito: Yamil Lage/AFP)

No dia seguinte aos maiores protestos registrados em quase três décadas contra o regime de Cuba, o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, disse que Miguel Díaz-Canel, o sucessor dos irmãos Castro no poder, deveria entrar em maior sintonia com os anseios populares. Cercado por seus ministros, o líder cubano reconheceu a crise na ilha e voltou a responsabilizar Washington pela situação na ilha, assinalando que a Casa Branca impõe “uma política de asfixia econômica para provocar revoltas sociais no país”.

Em transmissão ao vivo pela televisão e pelo rádio, Díaz-Canel garantiu que seu governo tenta “enfrentar e superar” as dificuldades diante das sanções americanas, reforçadas desde o mandato de Donald Trump. “O que querem com essas situações? Provocar revoltas sociais, provocar mal-entendidos (entre os cubanos)”, indagou o líder cubano. A pandemia da covid-19 agravou a situação econômica na ilha — a pior desde a queda da União Soviética.

“Estamos com o povo cubano e seu claro apelo por liberdade”, reagiu Joe Biden. Em nota, o líder dos EUA pediu ao “regime cubano que, em vez de se enriquecer, ouça seu povo e atenda suas necessidades”.

Em consonância com Biden, o secretário americano de Estado, Antony Blinken, disse que o líder cubano se equivoca ao culpar Washington. “Seria um grave erro do regime cubano interpretar o que está acontecendo em dezenas de vilas e cidades em toda a ilha como resultado ou produto de qualquer coisa que os Estados Unidos tenham feito”, disse.

Para o chefe da diplomacia americana, os cubanos estão “profundamente cansadas da repressão que dura muito tempo” e respondem com protestos à “má gestão” do governo.

Alerta

O apoio a Díaz-Canel veio Moscou, um dos principais defensores das autoridades cubanas desde os tempos soviéticos, com um alerta contra qualquer “interferência” nesse momento de crise. “Consideramos inaceitável qualquer ingerência externa nos assuntos internos de um Estado soberano e qualquer ação destrutiva que favoreça a desestabilização da situação na ilha”, disse Maria Zakharova, porta-voz do ministério russo das Relações Exteriores.

Também o presidente do México, Andrés Manuel López Obrador, rejeitou a política “intervencionista” da situação em Cuba e se ofereceu para enviar ajuda humanitária. “Podemos ajudar com remédios, vacinas (contra a covid-19), com o que for necessário e com alimentação, porque saúde e alimentação são direitos humanos fundamentais”, disse López Obrador, em sua conferência matinal.

Apesar de reconhecer a insatisfação de parte da população, Díaz-Canel lançou aos revolucionários, ainda no domingo, “a ordem de combate”: “Tomem as ruas onde quer que ocorram essas provocações.”
Para evitar mobilizações e divulgação das marchas, a internet móvel, que chegou a Cuba no fim de 2018 e permitiu a transmissão ao vivo de cerca de 40 protestos no domingo, continuava cortada ontem. O regime deve intensificar esforços de inteligência digital para conter a insurgência.

“Se as pessoas ouvirem esses youtubers, estarão apoiando uma mudança de regime que trará um sistema que não terá essa preocupação com o bem-estar da população, como nós”, disse Díaz-Canel.
Biden pediu as autoridades cubanas para que não usem violência contra “manifestantes pacíficos”. No Twitter, a subsecretária do Departamento de Estado dos EUA, Julie Chung, também fez um apelo para que se tenha calma. “Estamos profundamente preocupados com os ‘chamados ao combate’ em Cuba. Defendemos o direito de reunião pacífica do povo cubano”, escreveu.

“Os Estados Unidos apoiam a liberdade de expressão e de reunião em Cuba e condenariam fortemente qualquer uso da violência contra manifestantes pacíficos que estejam exercendo seus direitos universais”, tuitou, por sua vez, o conselheiro de Segurança Nacional do governo americano, Jake Sullivan.

A postagem de Sullivan foi repudiada pelo governo cubano. “O assessor de Segurança Nacional da Casa Branca carece de autoridade política e moral para falar sobre #Cuba”, reagiu o chanceler cubano Bruno Rodríguez, também no Twitter. “Seu governo destinou centenas de milhões de dólares para a subversão em nosso país e impõe um bloqueio genocida, principal responsável pelas deficiências econômicas”, acrescentou.

Após uma breve reconciliação entre 2014 e 2016, as relações diplomáticas entre Havana e Washington estão em seu nível mais baixo desde que Donald Trump reforçou o embargo em vigor desde 1962.
Escassez

O colapso econômico castiga os cubanos. As restrições mundiais provocadas pelo novo coronavírus afastaram os turistas e, somadas às sanções internacionais, provocaram maior escassez de alimentos e remédios. Além disso, os habitantes da ilha enfrentam corte diário de energia por várias horas por conta do agravamento da crise.

Tudo isso em um contexto de forte aumento de casos de coronavírus na ilha. No total, Cuba registrou oficialmente 238.491 casos, incluindo 1.537 mortes, para 11,2 milhões de habitantes. Situação que tem levado muitos cubanos a usar a palavra-chave #SOSCuba nas redes sociais, para solicitar que a ajuda humanitária externa seja autorizada pelo governo.

A insatisfação social é crescente. Fato incomum no país, as manifestações de domingo surgiram de forma espontânea, ainda de manhã. Em algumas horas se estenderam por dezenas de cidades do país, mobilizando milhares de cubanos. Ontem, houve atos no Chile e nos Estados Unidos — sobretudo em Washington e em Miami — em defesa dos manifestantes cubanos. No México e na Venezuela, os protestos foram em defesa do regime.

» Críticas a repressão

O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) voltou apoiar as manifestações em Cuba e a pedir o fim do que ele classifica de “ditadura crul” no país caribenho. Depois de uma postagem em rede social, ainda no domingo ele falou sobre o assunto, ontem, em conversa com apoiadores, no Palácio do Alvorada.
O presidente brasileiro criticou a resposta das autoridades de Cuba com “borrachada, pancada e prisão” aos protestos. Sem citar nomes, Bolsonaro lembrou que seus adversários políticos já se reuniram com mandatários de países socialistas como Cuba e Venezuela. “Estão querendo viver como os cubanos e os venezuelanos”, disse o presidente.

No domingo, Bolsonaro tuitou: “Todo apoio e solidariedade ao povo cubano, que hoje corajosamente pede o fim de uma ditadura cruel que por décadas massacra a sua liberdade enquanto vende pro mundo a ilusão do paraíso socialista. Que a democracia floresça em Cuba e traga dias melhores ao seu povo.!”

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