Eleições

Júri eleitoral peruano retoma trabalhos em circunstâncias turbulentas

Em segundo turno, disputado em 6 de junho, Pedro Castillo obteve 44 mil votos de vantagem. Keiko Fujmori, porém, questiona o resultado

Lima, Peru - O júri eleitoral do Peru retomou no sábado (26/6) os trabalhos para determinar o ganhador das eleições presidenciais, embora em um ambiente turbulento após a descoberta de manobras, da prisão, de Vladimiro Montesinos para comprar magistrados e fazer a balança pender a favor de Keiko Fujimori, filha do seu ex-chefe.

O magistrado Víctor Raúl Rodríguez se incorporou ao júri no sábado, acabando com a paralisação provocada pela saída de outro membro há três dias, o que impedia o avanço no lento processo para avaliar as impugnações de votos e proclamar o novo presidente.

Rodríguez tomou posse diante de um crucifixo e uma Bíblia, enquanto o Peru continua sem saber qual será seu novo presidente após o disputado segundo turno em 6 de junho, cuja apuração final deu vantagem de 44 mil votos ao esquerdista Pedro Castillo sobre sua adversária da direita.

"A justiça eleitoral não pode ficar paralisada, nem bloqueada", disse após empossar Rodríguez o titular do Júri Nacional de Eleições (JNE), Jorge Luis Salas, que sofreu o assédio do fujimorismo, inclusive com manifestações do lado de fora de sua casa.

O JNE recuperou o quórum para poder prosseguir com as sessões, mas não tem prazo determinado para avaliar as impugnações e proclamar o novo presidente, enquanto Piero Corvetto, chefe do órgão eleitoral (ONPE), que organizou a votação e fez a apuração, denunciou ter sofrido uma "agressão física" neste sábado dentro do Iate Clube de Lima.

"Custa três paus"

O JNE está no olho do furacão após a divulgação de áudios de Montesinos, ex-chefe de Inteligência de Alberto Fujimori, dando instruções por telefone da prisão da Base Naval de Callao para comprar três magistrados do Júri.

O Ministério Público abriu uma investigação, assim como a Marinha, pois Montesinos, que cumpre pena de 25 anos, fez os telefonemas a um militar reformado fujimorista de um telefono fixo na prisão da base, embora só tivesse permissão para ligar para a sua companheira.

Quatro oficiais do serviço penal da Marinha, incluindo seu comandante, foram substituídos no sábado "enquanto as investigações acontecem de acordo com a lei", informou o ministério da Defesa em um comunicado.

Além disso, o ministério solicitará à empresa de telefonia a "lista completa de ligações feitas a partir do telefone fixo.

No primeiro dos 17 telefonemas, Montesinos pede ao comandante reformado Pedro Rejas que fale com o advogado Guillermo Sendón para que ele faça contato com três dos quatro membros do JNE para suborná-los e impedir que eventualmente proclamem Castillo como o vencedor.

"Este negócio custa três paus [três milhões de dólares]. Um pau para cada um" dos magistrados, diz Sendón a Rejas. O titular do JNE não seria contactado, segundo os áudios.

Os primeiros telefonemas foram feitos em 10 de junho, mas no dia 23 Montesinos voltou a ligar para Rejas para que insistisse nas gestões.

"É o único jeito, não tem mais outro", diz Rejas a Montesinos nos áudios, divulgados no mesmo dia em que se completaram 20 anos de sua detenção na Venezuela.

"Não tem outro, não tem mais outro porque passou tempo demais [...], mas você faça entender o papai ou a garota [Alberto ou Keiko], não sei com quem você fala, que [...] estamos tentando ajudar em um objetivo comum", diz-lhe Montesinos, de 76 anos.

"O que eu ganho com isto? Nada. Não me interessa e também nunca vou pedir-lhes nada. Simplesmente estou tentando ajudar porque se não, se ferram: a garota vai acabar presa".

Se perder a Presidência, Keiko Fujimori deverá ir a julgamento por lavagem de dinheiro pelo escândalo de aportes ilegais da gigante brasileira da construção Odebrecht, que salpicou também quatro ex-presidentes peruanos. A candidata, que nega as acusações, poderá ser condenada a 30 anos e não fez comentários sobre os áudios.

A candidata tentou minimizar no sábado o impacto das gravações. "Ouvimos com indignação os áudios [...] escutando a voz de um homem (Montesinos) que traiu todos os peruanos. Eu rejeito este tipo de insinuações, onde se nota ainda que isto está armado de uma forma grosseira", disse em um comício para milhares de apoiadores.

No mesmo horário, milhares de seguidores de Castillo organizaram uma passeata em Lima para exibir que o JNE proclame o mais rápido possível a vitória de seu candidato.

"Vladivídeos"

Em sua chegada ao poder em 1990, Alberto Fujimori pôs Montesinos à frente dos serviços de Inteligência, do qual se tornou a eminência parda de um governo então em combate aberto às guerrilhas do Sendero Luminoso e Tupac Amaru.

Uma década depois, em setembro de 2000, e com o governo nas cordas, Montesinos caiu em desgraça com a divulgação de vídeos que o mostraram subornando legisladores opositore para que apoiassem Alberto Fujimori, que acabara de se reeleger para um terceiro mandato. Foi desatada uma crise que levou o presidente a partir para o Japão e enviar sua renúncia por fax.

Nas semanas seguintes, foram divulgados outros "vladivídeos" e Montesinos fugiu para a Venezuela, onde foi detido em 24 de junho de 2001 e mandado de volta para o Peru.

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