Os principais países europeus condenaram sem paliativos nesta sexta-feira(4) a "perturbadora" entrevista televisiva a que foi submetido o jornalista e ativista bielorrusso Roman Protasévich, transmitida por um canal oficial.
Nesta entrevista, transmitida na noite de quinta-feira pela emissora pública bielorrussa ONT, o dissidente de 26 anos confessa com uma cara inquieta diante das câmeras que no ano passado convocou protestos e também elogia o presidente bielorrusso, Alexander Lukashenko.
Ao final da hora e meia de gravação, Protasevich desata a chorar e cobre o rosto com as mãos. Existem marcas vermelhas em seus pulsos, talvez devido à pressão das algemas.
O jornalista e ativista foi preso no dia 23 de maio com sua companheira, Sofia Sapega, quando o voo em que viajavam, operado pela Ryanair e que cobria a rota Atenas-Vilnius, foi interceptado por um avião militar bielorrusso, causando grande indignação em outros países.
O cofundador e ex-editor-chefe do canal Nexta do Telegram, próximo à oposição, desempenhou um papel importante nas manifestações antigovernamentais que se seguiram à reeleição de Lukashenko em agosto.
"Vergonha"
O porta-voz do governo alemão Steffen Seibert disse que a transmissão foi uma "desgraça" e que isso é uma indicação do "total desrespeito da liderança bielorrussa pela democracia" e pelos "seres humanos".
Por sua vez, o ministro das Relações Exteriores britânico, Dominic Raab, descreveu a entrevista como "perturbadora" e "claramente coagida".
"A perseguição daqueles que defendem os direitos humanos e a liberdade de imprensa em Belarus deve parar", disse Raab em um tuíte, acrescentando que todos "envolvidos nas filmagens, coerção e condução da entrevista devem ser responsabilizados".
Pela manhã, a líder da oposição bielorrussa, Svetlana Tijanóvskaya, pediu que as palavras de Roman Protasevich não fossem levadas em consideração, "porque foram pronunciadas sob tortura".
"A tarefa dos prisioneiros políticos é sobreviver", disse ele a repórteres em Varsóvia.
"Com a violência, você pode fazer qualquer um dizer o que você quiser", enfatizou Tijanóvskaya, que concorreu na eleição do ano passado contra Lukashenko.
O pai do jovem, Dmitry Protasevich, disse à AFP na quinta-feira que o vídeo foi resultado de "abusos, tortura e ameaças". "Conheço meu filho muito bem e acho que ele nunca diria essas coisas", acrescentou.
As autoridades bielorrussas acusam o jornalista de ter organizado distúrbios em massa, pelos quais pode ser condenado a 15 anos de prisão.
Companhias aéreas em desacordo
A prisão do casal levou a União Europeia (UE) a vetar as companhias aéreas bielorrussas de seu espaço aéreo, medida que entrará em vigor no sábado e atinge principalmente a companhia aérea nacional Belavia.
Além disso, a Agência Europeia para a Segurança da Aviação (EASA) proibiu na quarta-feira a entrada de aviões de bandeira europeia no espaço aéreo bielorrusso, medida criticada nesta sexta-pela International Air Transport Association (IATA), que agrupa 290 companhias aéreas, responsáveis por 82% do tráfico mundial, afirmando que "politiza a segurança aérea".
Em um comunicado, a associação instou a EASA a "permitir que as companhias aéreas gerenciem a segurança como normalmente fazem, avaliando os riscos de suas operações".
O presidente bielorrusso enfrentou protestos sem precedentes após sua reeleição em agosto de 2020, quando, segundo ele, obteve 80% dos votos.
Durante a repressão brutal dessas manifestações, várias pessoas morreram, milhares foram presas e vários líderes da oposição foram forçados ao exílio.