Para se proteger da pandemia, a Coreia do Norte se fechou ainda mais, o que aumentou seu isolamento.
Diante dessa situação difícil, a população é convocada a demonstrar maior lealdade ao regime, segundo especialistas.
O país, cuja economia está em colapso devido às múltiplas sanções internacionais impostas em decorrência de seus programas militares, há algum tempo vive uma grave crise alimentar. Com a pandemia, a situação deve ter piorado.
Pyongyang foi um dos primeiros governos a impor restrições sanitárias rígidas, incluindo o fechamento de suas fronteiras para evitar a disseminação do coronavírus detectado na China.
O regime garante que a epidemia não atingiu o território, o que muitos especialistas questionam.
Mas esse isolamento teve um alto impacto econômico e até mesmo o líder norte-coreano Kim Jong Un reconheceu as dificuldades que a população tem que enfrentar, pedindo que se preparem para o pior.
O comércio com Pequim, o principal apoio econômico e diplomático do regime, foi drasticamente reduzido. Dados da agência alfandegária chinesa relataram que a Coreia do Norte importou US$ 29 milhões em mercadorias em abril, mais que o dobro do número em março, mas bem abaixo do nível pré-pandemia.
“Pyongyang estava em uma situação desesperadora antes da pandemia”, observa Soo Kim, um ex-funcionário da CIA que atualmente trabalha para a RAND Corporation.
“O coronavírus agravou as dificuldades sistêmicas, institucionais e econômicas existentes”. Todos os estrangeiros que trabalham para a ONU e agências de ajuda deixaram o país por causa das restrições.
Várias organizações confirmaram à AFP que este ano não será publicado o relatório “Necessidades e Prioridades” que normalmente apresenta o balanço da situação humanitária no país e no qual se baseia a ONU para pedidos de fundos.
A decisão se deve à "ausência de avaliações e observações de campo em decorrência das restrições impostas ao combate ao coronavírus", disse Edwin Salvador, representante em Pyongyang da Organização Mundial da Saúde (OMS).
É "muito provável" que a pandemia tenha "agravado" a situação humanitária na Coreia do Norte, onde 10,6 milhões de pessoas estão necessitadas, disse um porta-voz do Escritório da ONU para a Coordenação de Assuntos Humanitários (OCHA).
"Marcha Árdua"
Kim reconheceu em abril a difícil situação que o país tem que enfrentar e pediu "que façam uma nova 'Marcha Árdua', ainda mais dura, para ajudar a população diante das dificuldades, mesmo que seja um pouco".
A "Marcha Árdua" é a expressão usada na Coreia do Norte para se referir à fome dos anos 1990 que causou centenas de milhares de mortes, devido à redução da ajuda de Moscou após a queda soviética.
Esta referência busca motivar a população a “enfrentar as adversidades” e a trabalhar pela “sobrevivência da nação”, estima Gianluca Spezza, do Instituto de Políticas de Segurança e Desenvolvimento de Estocolmo.
"Se a história da Coreia do Norte nos ensinou alguma coisa, é esse caráter especial do nacionalismo norte-coreano que faz a RPDC prosperar nos tempos mais difíceis", disse ele, citando as iniciais de República Popular Democrática da Coreia (RPDC).
Nos últimos meses, o líder norte-coreano enviou inúmeras cartas às organizações do regime, como a Liga da Juventude e a Federação dos Sindicatos, para homenageá-los por carregar alto "a bandeira da lealdade e do patriotismo", segundo a agência oficial KCNA.
Os meios de comunicação oficiais multiplicam as reportagens em que são observados centenas de jovens, alguns órfãos, que são “voluntários” para trabalhos braçais a serviço do Estado.
"As imagens de jovens fazendo fila para trabalhar voluntariamente nas minas são uma forma de Pyongyang reafirmar sua identidade para o mundo exterior, mesmo que só se veja nelas casos graves de violações dos direitos humanos", disse Michael Madden, do Stimson Center.
Segundo o especialista, o regime iniciou uma operação para doutrinar os jovens, para quem a “Marcha Árdua” é apenas uma memória.
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