A Casa Branca saiu em defesa do seu principal conselheiro sobre a pandemia de covid-19, o médico Anthony Fauci, após mensagens de email do especialista virem à público e gerarem controvérsia.
Fauci tem sido o rosto da resposta dos Estados Unidos ao novo coronavírus, atraindo elogios e críticas. "Confio muito no dr. Fauci", disse o presidente Joe Biden na sexta-feira (4/6).
Mas emails de Fauci levantaram dúvidas sobre se ele concordava com a rejeição por Pequim da teoria de que a pandemia teria começado com um acidente em um laboratório em Wuhan.
Uma série de mensagens de Fauci sobre o início do surto foi divulgada esta semana para a mídia sob um pedido de acesso a informação.
Em um email enviado em abril passado, um executivo de uma instituição de caridade de saúde agradeceu a Fauci por declarar publicamente que as evidências científicas não apoiam a teoria do vazamento em laboratório.
Em uma entrevista à emissora CNN, Fauci disse que o email foi retirado do contexto pelos seus críticos e que ele tinha uma "mente aberta" sobre a origem do vírus.
Em sua defesa, a secretária de imprensa da Casa Branca, Jen Psaki, disse que as contribuições de Fauci no combate à pandemia tiveram um valor "inegável".
Em sua coletiva de imprensa diária, na quinta-feira (3/6), ela disse: "O presidente e o governo acreditam que o dr. Fauci desempenhou um papel incrível em manter a pandemia sob controle, sendo uma voz para o público durante ao longo desta pandemia."
Biden reiterou seu apoio depois de fazer comentários na sexta-feira, quando um repórter perguntou se ele ainda tinha confiança no especialista em doenças infecciosas.
Não há provas de que a covid-19 tenha saído de um laboratório, mas Biden ordenou uma revisão do assunto que irritou a China.
As autoridades chinesas vincularam os primeiros casos de covid-19 a um mercado de frutos do mar em Wuhan, levando os cientistas a teorizarem que o vírus foi transmitido aos humanos pelos animais.
Mas relatos recentes da mídia dos EUA têm sugerido evidências crescentes de que o vírus poderia, em vez disso, ter surgido de um laboratório em Wuhan, talvez por um vazamento acidental.
O que Fauci disse à CNN?
Fauci afirmou que não havia nada de inconveniente ou inapropriado na troca de emails entre ele e um executivo de uma organização médica sem fins lucrativos que ajudou a financiar pesquisas em um instituto de doenças em Wuhan, a cidade chinesa onde a covid-19 foi relatada pela primeira vez.
O NIH, que é uma agência de saúde pública dos Estados Unidos, doou US$ 600 mil ao Instituto de Virologia de Wuhan entre 2014 e 2019 por meio de uma doação à organização sem fins lucrativos EcoHealth Alliance, com sede em Nova York, com o objetivo de pesquisar coronavírus de morcegos.
Peter Daszak, presidente da EcoHealth Alliance, enviou um email a Fauci em abril de 2020, elogiando-o por ter sido "corajoso" ao refutar a teoria do vazamento de laboratório. "Muito obrigado por sua gentil mensagem", respondeu Fauci.
Fauci disse à CNN ser "um absurdo" tentar inferir do email qualquer relação entre ele e as figuras por trás da pesquisa do laboratório de Wuhan.
"Você pode interpretar errado da maneira que quiser", disse ele, "esse email era de uma pessoa me agradecendo e dizendo 'obrigado' por algo que ela pensou que eu disse, e eu disse que acho que a origem mais provável é um salto entre espécies. Eu ainda acho que é, ao mesmo tempo que estou mantendo a mente aberta de que pode ter sido um vazamento de laboratório."
Ele acrescentou: "Acho que a ideia é bastante rebuscada de que os chineses tenham planejado algo deliberadamente para que pudessem se matar assim como outras pessoas. Acho que isso é um pouco exagerado".
Aliados do especialista dizem que as mensagens de Fauci mostram nada mais do que um servidor público dedicado tentando navegar os primeiros dias de uma pandemia que ocorre uma vez por século.
Mas seus críticos estão sugerindo que Fauci pode ter se envolvido no acobertamento de um suposto vazamento, e até afirmam que ele cometeu um perjúrio ao depor ao Congresso.
Como a teoria do vazamento de laboratório ganhou força?
De acordo com uma investigação na revista Vanity Fair publicada na quinta-feira, funcionários do Departamento de Estado discutiram as origens do coronavírus em uma reunião em 9 de dezembro de 2020.
Eles foram instruídos a não abordar insinuações sobre experimentos de "ganho de função" com vírus no laboratório de Wuhan para evitar atrair atenção indesejada para o financiamento do governo dos Estados Unidos para tais pesquisas, relatou a Vanity Fair.
Os estudos de ganho de função envolvem a alteração de patógenos para torná-los mais transmissíveis, a fim de aprender mais sobre como eles podem sofrer mutação.
O Wall Street Journal relatou no mês passado que três funcionários do instituto em Wuhan adoeceram e foram hospitalizados em novembro de 2019, pouco antes dos primeiros casos de covid-19 serem relatados.
Dias depois, o presidente Biden instruiu as agências de espionagem dos Estados Unidos a conduzirem uma análise de 90 dias para verificar se o vírus poderia ter surgido de um laboratório chinês.
Seu governo havia anteriormente encaminhado para a Organização Mundial da Saúde respostas sobre como a pandemia começou.
"Gostaria de ver os registros médicos das três pessoas que supostamente ficaram doentes em 2019", disse Fauci ao Financial Times na quinta-feira. "Elas realmente ficaram doentes e, em caso afirmativo, por que adoeceram?"
Ele pediu à China que também divulgue os registros médicos de seis mineiros que adoeceram depois de entrar em uma caverna de morcegos em 2012 na província chinesa de Yunnan. Três mineiros morreram, e pesquisadores chineses posteriormente visitaram a caverna para colher amostras dos morcegos.
"É totalmente possível pensar que as origens do Sars-CoV-2 tenham sido naquela caverna e tenham começado a se espalhar naturalmente ou tenham passado pelo laboratório", disse ele.
Robert Redfield, que liderou os Centros de Controle e Prevenção de Doenças, uma agência americana dedicada a esse tema, durante o governo Trump, disse à Vanity Fair que recebeu ameaças de morte de outros cientistas quando apoiou a teoria do vazamento de laboratório de Wuhan.
"Fui ameaçado e condenado ao ostracismo porque propus outra hipótese", disse Redfield. "Eu esperava isso dos políticos. Não esperava da ciência."
O que Fauci disse anteriormente?
Durante seu depoimento ao Congresso em 12 de maio, Fauci negou enfaticamente que os Estados Unidos alguma vez tenham financiado a polêmica pesquisa de ganho de função no laboratório de Wuhan.
Durante uma audiência subsequente no Senado em 26 de maio, o senador republicano John Kennedy perguntou como Fauci poderia ter certeza de que os cientistas de Wuhan não teriam usado o dinheiro para pesquisas de ganho de função.
"Não há como saber", reconheceu Fauci, acrescentando que acreditava que os pesquisadores chineses eram "confiáveis".
Como foi a reação política?
O ex-presidente Donald Trump, que foi amplamente criticado no ano passado quando levantou a possibilidade de que a covid-19 viesse do laboratório de Wuhan, disse na quinta-feira que Fauci tinha muitas perguntas a responder.
"O que o dr. Fauci sabia sobre a pesquisa de 'ganho de função' e quando ele soube disso?", disse Trump em um comunicado. "A China deveria pagar US$ 10 trilhões de dólares (R$ 50,7 trilhões) aos Estados Unidos e ao mundo pela morte e destruição que causaram!"
No mesmo dia, o vice-líder republicano da Câmara dos Representantes, Steve Scalise, exigiu em uma carta que Fauci testemunhe perante o Congresso sobre o "papel do governo dos Estados Unidos no financiamento de pesquisas que podem ter contribuído para o desenvolvimento do novo coronavírus".
O Ministério das Relações Exteriores da China disse na semana passada que a hipótese do vazamento do laboratório de Wuhan é "extremamente impossível".
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