Investigação

Ex-CEO da Renault-Nissan presta depoimento a magistrados franceses no Líbano

O ex-executivo do setor automobilístico, de 67 anos, presta depoimento "como testemunha, não tem portanto a possibilidade de impugnar a legalidade do procedimento", segundo os advogados

Uma delegação de magistrados franceses que viajou a Beirute começou nesta segunda-feira (31/5) a ouvir o depoimento do ex-CEO da Renault-Nissan Carlos Ghosn, em uma audiência como parte da investigação iniciada na França.

Durante cinco dias, Ghosn prestará depoimento sobre duas festas nos Palácio de Versalhes, fluxos financeiros com um distribuidor comercial em Omã, assim como por serviços de consultoria quando era presidente executivo do grupo Renault-Nissan.

A audiência acontece em uma sala do Tribunal de Cassação de Beirute. Ghosn chegou ao local acompanhado por seus advogados, pouco depois dos magistrados franceses, que viajaram ao Líbano especialmente para o interrogatório, e de um promotor libanês.

O executivo franco-libanês-brasileiro, objeto de uma ordem de detenção da Interpol, vive no Líbano desde que fugiu do Japão em dezembro de 2019.

Ghosn será interrogado todos os dias até sexta-feira, das 10H00 às 18H00, com uma pausa, segundo uma fonte judicial libanesa.

"A defesa já identificou nos autos franceses várias irregularidades processuais que considera graves", denunciaram os três advogados de Ghosn, Carlos Abou-Jaoude, Jean-Yves Le Borgne e Jean Tamalet.

"Estas anomalias, que enfraquecem o processo judicial, procedem dos métodos singulares da investigação japonesa, que continua sendo a principal fonte dos documentos franceses", completaram.

O ex-executivo do setor automobilístico, de 67 anos, presta depoimento "como testemunha, não tem portanto a possibilidade de impugnar a legalidade do procedimento", explicam os advogados.

Os três advogados pedem que ele passe de testemunha a réu para ter a oportunidade de "denunciar os vícios jurídicos que afetam o caso e participar em audiências".

Deste modo, ele teria acesso ao processo para conhecer as acusações, mas sobretudo para solicitar perícias de comprovação, audiências de testemunhas ou acareações.

Enquanto Ghosn não estiver em território francês, ele não poderá ser acusado formalmente.

Ele foi detido em novembro de 2018 no aeroporto de Tóquio e ficou em liberdade sob fiança depois de passar vários meses na prisão. Ghosn tinha a obrigação de permanecer no Japão até seu julgamento por suspeitas de fraude financeira na Nissan.

Mas ele escapou da vigilância das autoridades japonesas e fugiu em um avião privado, ao que tudo indica escondido em uma caixa de equipamento de áudio. Ghosn nega uma "fuga da justiça" e afirma que tentou "escapar da injustiça", do que considera um "complô" das autoridades japonesas contra ele.

A situação não facilitou o trabalho dos investigadores franceses para o interrogatório sobre apropriação indébita de bens sociais.

Em 2020 um juiz tentou interrogá-lo, mas Ghosn alegou que não poderia sair do Líbano. Então os magistrados decidiram viajar para ouvir seu depoimento em janeiro, mas o deslocamento foi adiado pelas restrições sanitárias da pandemia de coronavírus.

 Várias demandas 


A sessão em Beirute é conduzida por juízes de instrução de Nanterre e Paris na presença de investigadores do Escritório Anticorrupção (OCLCIFF) e magistrados libaneses, como parte da assistência judicial internacional na área penal.

A justiça suspeita que Carlos Ghosn se beneficiou pessoalmente de um acordo mecenato entre a Renault e a instituição que administra o Palácio de Versalhes, ao organizar dois eventos. Os investigadores também se interessam por milhões de euros de pagamentos considerados suspeitos entre a RNBV, filial da Renault e Nissan na Holanda, e o distribuidor da montadora francesa em Omã, Suhail Bahwan Automobiles (SBA).

Além disso, em 18 de maio uma acionista da Renault apresentou uma ação na qual acusa Ghosn de ter feito a montadora pagar "quantias consideráveis" a RNBV "sem o conhecimento dos acionistas".

Com base em outra ação da mesma acionista, os juízes de instrução investigam desde 2019 os serviços de consultoria entre a RNBV e a ex-ministra francesa da Justiça Rachida Dati e o criminologista Alain Bauer.

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