Eleições

Independentes surpreendem tradicionais para eleição de Constituinte do Chile

A lista unificada da direita, Vamos por Chile, recebeu 20,80%, um resultado abaixo do esperado, pois o grupo acreditava que teria ao menos um terço dos representantes na Convenção

Os candidatos independentes surpreenderam os partidos tradicionais e conquistaram quase 40% dos votos nas eleições do fim de semana do Chile, o que significa que representam o bloco dominante da Convenção Constituinte que vai redigir a nova Carta Magna do Chile.

O resultado provoca um desconcerto na política tradicional do país, incapaz de canalizar as demandas sociais que a população reivindicou nas ruas a partir de 18 de outubro de 2019 e que encontraram eco em vários candidatos independentes, incluindo ativistas sociais, professores, escritores, jornalistas ou advogados.

"Nestas eleições, os cidadãos enviaram uma mensagem clara e forte ao governo e também a todas as forças políticas tradicionais: não estamos sintonizando adequadamente com as demandas e os desejos dos cidadãos e estamos sendo desafiados por novas expressões e por novas lideranças ", afirmou o presidente do Chile, o conservador Sebastián Piñera, durante a reta final da contagem dos votos.

Baixa participação 


Com quase 90% das urnas apuradas, dos 155 cidadãos eleitos como constituintes, pela primeira vez de forma paritária e com a inclusão de 17 cadeiras reservadas para representantes dos povos originários, as duas listas que aglutinam candidatos que vão da centro-esquerda ao Partido Comunista, 'Lista Apruebo' e 'Apruebo Dignidad', registram 33,22% dos votos.

A lista unificada da direita, Vamos por Chile, recebeu 20,80%, um resultado abaixo do esperado, pois o grupo acreditava que teria ao menos um terço dos representantes na Convenção.

A taxa de participação ficou próxima de 37% dos 14,9 milhões de eleitores, segundo uma projeção preliminar.

Para a aprovação dos artigos da nova Constituição serão necessários os votos de dois terços da Convenção.

A decisão foi estabelecida em novembro de 2019, quando quase toda a classe política do Chile aprovou um plebiscito para mudar a Constituição herdada da ditadura de Augusto Pinochet (1973-1990) como saída democrática após semanas de protestos, incluindo alguns muito violento.

A Constituição que nasceu do descontentamento


Para Claudia Heiss, diretora do departamento de Ciência Política do Instituto de Assuntos Públicos da Universidade do Chile, o êxito das candidaturas independentes "dá um caráter muito mais cidadão e com muito mais legitimidade" à nova Carta Magna.

"Esta é a voz cidadã fazendo as normas. A classe política fala de ler a cidadania. Nada de saber ler! Esta é a cidadania presente na convenção, não vai ser passada pelos dirigentes políticos tradicionais e isso é algo que os dirigentes políticos não viram que aconteceria, nem a direita nem a centro-esquerda", afirmou Heiss.

Para a analista, o resultado é a forma como se transfere "a explosão social ao nível institucional" para atender os pedidos da população, como educação de qualidade ou o pagamento de pensões dignas.

"Isto sim é mais parecido com o que a mobilização social estava esperando. Parece muito mais com o que aspirava o movimento social do que com o que o sistema político jamais pensou", completou Heiss.

Toque de atenção à política tradicional 


O menor apoio aos partidos tradicionais, de direita ou esquerda, se traduz em uma ruptura da classe política com os cidadãos, algo que ficou patente nas ruas, mas que agora foi demonstrado em votos dirigidos a figuras externas ao mundo político.

"É novamente uma rejeição à classe política", afirmou Heiss.

Para Marcelo Mella, da Universidade de Santiago de Chile, o resultado não significa que os partidos políticos não terão um papel importante na redação da nova Constituição.

"O sistema de partidos tem terremotos que passam. Se Pinochet não o exterminou, acho que não vai acontecer agora", disse Mella à AFP.

Os analistas também apontam a dispersão de forças que devem interagir na redação na nova Carta Magna. "Não se deve ignorar os problemas de ação coletiva ou de coordenação que serão gerados por esta grande fragmentação”, disse Heiss.

A direita também sofreu uma dura derrota nas eleições para prefeitos e governadores, que aconteceram de maneira paralela. Em Santiago, a candidata do Partido Comunista, Iraci Hassler, estava à frente do atual prefeito, o direitista Felipe Alessandri.

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