Os planos norte-americanos de suspender os direitos de propriedade intelectual das vacinas contra a covid-19 sofreram um golpe, com as críticas do presidente francês, Emmanuel Macron. Um dia depois de Paris avalizar as negociações sobre o tema, no âmbito da Organização Mundial do Comércio (OMC), Macron expressou reservas à proposta da Índia e da África do Sul, abraçada por Joe Biden. O líder da França criticou Washington por impedir a exportação de imunizantes. A União Europeia demonstrou cautela e enalteceu seu papel como bloco exportador de doses. Por sua vez, o Brasil demonstrou simpatia pelos planos da Casa Branca, mas defendeu uma “terceira via”, em alusão à diversificação e ampliação da cadeia produtiva de vacinas.
“Qual é o problema atual.? Não se trata realmente de propriedade intelectual. Você pode dar propriedade intelectual a laboratórios sobre os quais não sabe como produzem e se produzirão amanhã?”, questionou Macron, no âmbito de uma cúpula da União Europeia (UE), em Porto (Portugal). O debate, segundo ele, “não deve ser sobre a propriedade intelectual, mas sobre transferência de tecnologia e mobilização das capacidades produtivas”.
“A principal questão da solidariedade é a distribuição das doses (das vacinas). Hoje, os anglo-saxões bloqueiam muitos desses ingredientes e dessas vacinas. Hoje, 100% das vacinas fabricadas nos EUA são voltadas para o mercado norte-americano”, lamentou Macron. O francês também disse, ontem, que é preciso considerar toda a complexa cadeia produtiva de vacinas contra a covid-19. A oposição da França se soma à resistência da Alemanha, que, na véspera, salientou que “a propriedade intectual é fonte de inovação e assim deve permanecer”.
Na última quinta-feira, Ursula von der Leyen — chefe da Comissão Europeia (órgão executivo da UE) — admitiu que o bloco está “pronto para debater” o levantamento das patentes, a fim de determinar se seria uma “solução eficaz e pragmática”.
Brasil
Em nota conjunta dos ministérios das Relações Exteriores; da Economia; da Saúde; e da Ciência, Tecnologia e Inovações, o governo brasileiro afirma que recebeu “com satisfação” a disposição dos EUA para negociar uma solução multilateral que contribua para o combate à covid-19, “bem como para intensificar seus esforços (…) para aumentar a produção e distribuição de insumos e vacinas em âmbito global. “O Brasil compartilha o objetivo expresso pela Representante Comercial do governo dos EUA, embaixadora Katherine Tai, de prover vacinas seguras e eficientes ao maior número de pessoas possível no menor intervalo de tempo possível”, afirma o comunicado.
“A flexibilização de posições dos EUA e de demais parceiros na OMC poderá contribuir para os esforços internacionais de resposta à covid. (…) Poderá, em particular, facilitar a implementação das propostas da ‘terceira via’, que visam aumentar e diversificar a produção e disseminação de vacinas, principalmente em países em desenvolvimento, com melhor utilização de capacidade ociosa”, acrescenta. O governo brasileiro sustenta que serão fundamentais o engajamento, a cooperação e a parceria dos detentores de tecnologia para a produção de imunizantes, de modo a viabilizar a fabricação no Brasil.
"Você pode dar propriedade intelectual a laboratórios sobre os quais não sabe como produzem e se produzirão amanhã?”
Emmanuel Macron, presidente da França